Título: Sustentabilidade: a criação de valor e a sociedade
Autor: Soares , Por Rinaldo C.
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2007, Opiniao, p. A14

Se criássemos rankings das expressões mais ouvidas no mundo corporativo, "criação de valor" e "sustentabilidade" certamente estariam no topo de qualquer listagem. Criar valor é um dos critérios fundamentais de processos decisórios, em todos os estratos da estrutura organizacional - dos conselhos de administração às bases hierárquicas das companhias, tanto nas unidades de negócios, quanto nas áreas de serviços internos compartilhados. E sustentabilidade é a condição essencial que sanciona, interna e externamente, tanto as ações que criam valor quanto os seus resultados e as suas destinações. Pode-se mesmo dizer que, sendo sustentáveis as relações benefícios-custos e fins-meios envolvidas com a criação de valor, dificilmente se questiona a destinação dada aos resultados assim gerados.

As estreitas relações que se estabelecem entre a criação de valor, como propósito básico do mundo corporativo, e a sustentabilidade, como condição essencial para realizá-lo, colocam o destino dos resultados como questão menor, quando o valor gerado não implica danos de curto ou de longo prazo às dimensões que definem os processos sustentáveis.

Do ponto de vista do mundo corporativo, a criação de valor tem como indicador-síntese o valor de mercado das companhias. Este é função de um conjunto de resultados positivos, tanto econômico-financeiros, quanto de posicionamento no setor de negócio em que as companhias atuam, quanto ainda de boa gestão de ativos intangíveis, como imagem da marca e reputação. E é exatamente no campo dos ativos intangíveis que entram em cena os fatores e os critérios de sustentabilidade, especialmente os relacionados com os conteúdos e as práticas dos códigos de conduta, com os valores essenciais da governança corporativa (conformidade, transparência, prestação responsável de contas, senso de justiça e ética nos relacionamentos internos e externos) e com todo um conjunto de meios e fins que tem a ver com questões ambientais e sociais.

Questões desta ordem têm assumindo crescente importância, com mudanças radicais nitidamente observadas nos últimos 20 anos nas relações entre as companhias e a sociedade. Uma das razões é o crescimento econômico, que atinge escalas sem precedentes históricos, bastando dizer que quando o Produto Mundial Bruto (que já se aproxima de US$ 50 trilhões) cresce a uma taxa anual de 4% ao ano, a expansão global corresponde a duas economias do tamanho da Brasil a cada ano.

-------------------------------------------------------------------------------- Sustentabilidade é a condição que sanciona tanto as ações que criam valor quanto os seus resultados e destinações --------------------------------------------------------------------------------

Uma expansão desta ordem traz à tona um conjunto de questões vitais. Uma delas é o objetivo do desenvolvimento sustentável: "satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades". Outra é a distribuição mais dispersa dos benefícios do crescimento, do ponto de vista da inclusão sócio-econômica. Outra é a conciliação entre a competição acirrada, que implica estruturas organizacionais enxutas, e os imperativos de geração de novos postos de trabalho em ritmo superior ao crescimento da população ativa, para absorção também do contingente estrutural de desempregados. Outra é compatibilizar o retorno dos shareholders com as demandas legítimas de outros stakeholders.

Todas essas dimensões que põem frente a frente os conceitos de "criação de valor" e de "sustentabilidade" têm merecido a atenção do mercado de capitais, locus onde efetivamente as companhias são julgadas, avaliadas e precificadas, definindo-se então o que se convencionou chamar "valor de mercado". Em todos os continentes tem sido assim. Especialmente nos mais grandiosos, avançados e exigentes mercados, como o dos Estados Unidos. Esta a razão da existência, desde 1999, do Dow Jones Sustainability Index (DJSI), criado pelo SAM, instituto suíço responsável pela metodologia de listagem das empresas incluídas neste índice.

Os critérios da listagem são abrangentes. Fundamentam-se em três dimensões, econômica, ambiental e social, complementadas por indicadores gerais e específicos, definidos para cada um dos setores de atuação das companhias. Na primeira dimensão avaliam-se não apenas resultados econômico-financeiros convencionais, como ainda a presença das companhias em mercados emergentes, as relações com os stakeholders da cadeia de negócios, a gestão de ativos intangíveis, a governança, a gestão de riscos e a conformidade. Na ambiental, o foco é a subordinação dos fins e meios ao conceito de ecoeficácia. Na social, é o desenvolvimento do capital humano, a atração e a retenção de talentos e a prática efetiva de cidadania corporativa. Cada um desses focos é ponderado, estabelecendo-se pesos equivalentes para a tríade econômica, ambiental e social e para os indicadores setoriais específicos.

São atualmente 318 as companhias listadas no DJSI, das quais 16,7% dos Estados Unidos. As demais são de outros 22 países, com maior presença dos que tradicionalmente adotam modelos mais abrangentes de governança corporativa quanto aos seus objetivos sociais e ambientais, como são os casos do Reino Unido, da Alemanha e do Japão, cujas empresas, somadas, compõem quase metade das listadas, 49,8%.

O Brasil também está presente neste índice, com 2,2% de participação, equivalente a sete empresas - Aracruz, Bradesco, Itaú Holding Financeira, Itaúsa Investimentos, Cemig, Petrobras e Usiminas. Há condições de incrementarmos essa lista. Afinal, tem sido notável o empenho de muitas companhias nacionais em amadurecer políticas de governança como lastro para performances financeiras cada vez mais blindáveis à volatilidade do mercado, mais proeminentes na escala global e, sobretudo, que mereçam a chancela da sociedade.

Rinaldo Campos Soares é presidente do Sistema Usiminas.