Título: Retomada mais lenta da renda fixa
Autor: Bautzer , Tatiana
Fonte: Valor Econômico, 05/12/2007, Finanças, p. C1

O mercado de títulos de renda fixa brasileiro está sendo mais afetado que o de ações pela crise de crédito nos Estados Unidos. As empresas não ficam sem recursos para financiar seus projetos, mas em vários casos trocam instrumentos de mercado de capitais por linhas bancárias, que hoje estão com custos mais conservadores. Os investidores em debêntures estão mais seletivos, aumentando prazos e elevando custos.

O prazo médio, que chegou a superar seis anos antes da crise, voltou a recuar. Dificilmente investidores aceitam papéis de mais de cinco anos, a não ser que haja amortizações a partir do quarto. Ainda que mais seletivo, o mercado de renda variável teve casos de sucesso como o da Bovespa Holding. Na renda fixa, a retomada está mais lenta. "O mercado de debêntures neste ano será de 60% do total do ano passado", diz o diretor de um grande banco estrangeiro.

Excluindo as emissões de debêntures de leasing (compradas pelas tesourarias), o volume de debêntures emitidas está em queda. No ano passado as companhias venderam R$ 24 bilhões, segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Neste ano, até o início de novembro, os registros são de R$ 13,7 bilhões, incluindo emissões ainda em análise.

"Os bancos continuam abertos e com recursos disponíveis, mas o investidor de mercado na renda fixa está mais seletivo", diz um executivo de um banco nacional.

Segundo fontes de mercado, emissões de pequeno porte de empresas pouco conhecidas estão tendo dificuldades para venda. A emissão da indústria de alimentos J. Macêdo, que está pagando CDI mais 1,5%, por exemplo, deve ter algum exercício de garantia firme. O Itaú BBA, que coordena a emissão, diz que a distribuição só ficará clara no anúncio de encerramento. O exercício de garantia firme já ocorreu na emissão da Santher (Fábrica de Papel Santa Therezinha), numa emissão de quatro anos pagando CDI mais 0,9%. Do total de R$ 100 milhões, R$ 73 milhões ficaram com o coordenador, Unibanco, e R$ 27 milhões com seis fundos de investimento.

A Tecnisa está rediscutindo condições de uma emissão de R$ 150 milhões em debêntures em análise na CVM. As emissões menores afastam investidores de grande porte, que preferem não mobilizar analistas para comprar um volume pequeno de títulos. Os custos fixos nas emissões menores de debêntures também pesam mais para as empresas.

"Há uma queda de braço entre o investidor e as empresas. O investidor está mais cauteloso e pedindo até meio ponto percentual a mais sobre o CDI em relação ao que demandava antes da crise", afirma o diretor de um grande banco nacional. "Estamos numa fase de adaptação e renegociação entre empresas e investidores", diz executivo de outro banco nacional. Como poucos emissores estiveram em mercado antes e depois da crise, é difícil estimar o aumento de custo para todas as classificações de risco.

Mas um dos executivos cita exemplos usando dados de mercado. A Ampla Energia tem debêntures vencendo este ano com taxa de 106,8% CDI. Na emissão com vencimento em 2012, a taxa é de 107,3% do CDI. A AmBev tem papéis vencendo no ano que vem pagando 101,8% do CDI, e para 2012, 102,45% do CDI.

No mercado externo, a Sadia, com classificação Ba2 pela Moody's, emitiu neste ano US$ 200 milhões em bônus de 10 anos pagando 6,375% ao ano. A Gerdau, com rating Ba1, vendeu depois da crise US$ 1 bilhão para financiar a aquisição da Chaparral pagando pouco mais de 7%.

Os bancos não necessariamente vêem como ruim exercer parte da garantia firme numa emissão de debêntures. As instituições estão "sedentas" na concessão de crédito, como demonstrou o financiamento superior a R$ 12 bilhões garantido para financiar a oferta de compra de ações da Telemar, que acabou não sendo fechada.

A exemplo da renda variável, os investidores estão procurando riscos menores e emissões de grande porte. A International Finance Corporation (IFC), braço financeiro do Banco Mundial, vendeu R$ 200 milhões em títulos com prazo de 40 meses (vencimento em 2011), pagando 11,96% ao ano - 9 pontos-base acima do Tesouro brasileiro. A emissão foi vendida para 18 investidores institucionais.

A Klabin Segall captou R$ 202,5 milhões pagando 1,15% acima do CDI e 9% ao ano mais IPCA. A emissão, coordenada por três bancos, foi vendida para 22 investidores - 14 fundos de investimento e 1 de pensão. A Eletropaulo vendeu R$ 600 milhões por seis anos (amortização no quarto ano) pagando CDI mais 0,9% para 55 fundos de investimento e dois bancos. A coordenação foi do Unibanco, Itaú BBA e UBS Pactual. Agora, venderá outros R$ 200 milhões, mas com prazo de 11 anos e coordenação do Bradesco.

Alguns bancos também estão emitindo debêntures para concretizar operações de crédito por questões fiscais (alíquota de IOF). A Ultrapar Participações vendeu R$ 214 milhões por um ano para o Bradesco, pagando 102,5% do CDI.