Título: Petrobras extrai apenas 0,5% do petróleo de Angola
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 07/11/2007, Especial, p. A20

A Petrobras chegou a Angola há quase 30 anos, em 1979, para participar como sócia-investidora (sem o comando das operações) da exploração do bloco nº 2 da plataforma continental angolana. O sucesso exploratório, conduzido pela americana Chevron, continua sendo responsável até hoje pela única base produtiva da estatal brasileira em território angolano. Seus 27,5% de participação correspondem à produção de 9 mil barris de óleo por dia, menos de 0,5% dos 2 milhões de barris/dia que Angola deverá atingir no fim do ano.

Para muitos brasileiros que trabalham em Luanda, ligados ou não ao setor do petróleo (57% da economia angolana), a Petrobras "comeu mosca", ficando no meio do caminho enquanto as grandes empresas internacionais investiam e achavam cada vez mais petróleo na região. A Petrobras dedicava-se a atividades periféricas, incluindo o treinamento de mão-de-obra para o governo angolano.

Em 2001, após longo período fora das disputas por concessões, a estatal brasileira voltou à carga, dividindo a concessão do bloco 34 (águas profundas) com a estatal angolana Sonangol e com a norueguesa Norsk Hidro. Mas foi no ano passado que a Petrobras resolveu virar o jogo, gastando US$ 520 milhões em bônus de concessões para entrar em quatro novos blocos exploratórios, todos em águas profundas - em três deles como operadora, sendo que no bloco 26/06 ela detém 80% da concessão.

A empresa vai gastar mais entre US$ 400 e US$ 500 milhões a partir do último trimestre de 2008 para desenvolver programa de perfurações nos blocos arrematados no ano passado, enquanto prepara-se para entrar na disputa da nova rodada de concessões que está sendo aberta pelo governo angolano, com resultados previstos para março de 2008.

"Eu diria que a Petrobras deve ficar aqui por mais algumas décadas. Achamos que é um país com bom potencial e que tem estabilidade negocial, os contratos não mudam ao longo do tempo", afirma o geólogo Hercules Tadeu da Silva, presidente da Petrobras Angola. Ele discorda dos que acham que a estatal brasileira perdeu o bonde do tempo no país africano.

"O tempo não foi perdido. A estratégia da empresa era outra, investir no mercado interno, e me parece que foi uma estratégia correta. Se, pontualmente, as pessoas têm essa visão (de que a Petrobras 'comeu mosca'), é porque não têm uma noção do todo", rebate. Para Silva, a flexibilização do monopólio estatal do petróleo no Brasil, efetivada em 1997, foi o sinal verde para que a Petrobras pudesse partir para o mercado internacional com mais apetite, após criar as bases para o país alcançar a auto-suficiência em hidrocarbonetos.

Há mais de dois anos em Angola, Silva diz estar disposto a ficar muito mais. "Gosto do desafio de virar o jogo da Petrobras em Angola". Ele chegou ao país com a família, o que não é muito comum, embora os dois filhos tenham saído para continuar os estudos. Ele vive em Luanda Sul, espécie de Barra da Tijuca (ou Alphaville) da capital angolana, em casa alugada a US$ 20 mil por mês, preço comum na área nova e mais urbanizada da cidade, onde um apartamento de dois quartos em prédio deteriorado não sai por menos de US$ 5 mil por mês. Ele resume a nova fase da Petrobras Angola, hoje com 40 empregados - 26 angolanos, 13 brasileiros e um venezuelano: "A Petrobras vai crescer aqui. Mais do que crescer em Angola, queremos crescer com Angola".

Gigante mesmo, por enquanto, é a Chevron, dona da antiga Texaco, responsável por cerca de um terço da produção angolana de petróleo, algo em torno de 600 mil barris por dia. Tem mais de 3 mil empregados, especialmente na província de Cabinda, espécie de Alasca angolano, separada do resto do país pela faixa litorânea da República do Congo (Brazzaville).

Além disso, a empresa está conduzindo, em parceria com a Sonangol, um projeto de US$ 5 bilhões para construir uma planta gigante de gás natural liquefeito (GNL) em Soyo, província de Zaire, no norte de Angola, que permitirá ao país exportar também as reservas de gás natural, cuja produção é hoje toda queimada ou reinjetada nos poços. O prazo oficial para a conclusão da planta é 2010.

Em Angola, a Sonangol é, ao mesmo tempo, concessionária e poder concedente. Ela está presente em quase todos os blocos de exploração e produção. O Banco Mundial (Bird) considera que a redefinição do papel da Sonangol é um ponto essencial para modernizar o setor petróleo angolano. Por conta da complexidade do modelo, a Chevron mantém no país uma equipe de dez advogados, sendo sete angolanos, dirigida pelo brasileiro Sílvio Rodrigues, atualmente na sua segunda passagem por Angola. Ele conta que em 1995, quando esteve no país ainda pela Texaco, a vida era mais difícil. "Havia toque de recolher e não existia atividade social. Não havia restaurantes e nem farmácias. A empresa fornecia tudo. Eu passava 28 dias aqui e 28 no Brasil, como se trabalhasse em uma plataforma", conta.