Título: Secretário-geral do Itamaraty quer país forte militarmente
Autor: Romero , Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 07/11/2007, Brasil, p. A4

Samuel Pinheiro Guimarães: "Hoje em dia, tanto a defesa quanto a política externa são extremamente ligadas" O secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, defendeu ontem o desenvolvimento do poderio bélico do Brasil, "essencial", segundo ele, "para a execução da política externa". "À medida em que os interesses brasileiros no exterior são expandidos, a possibilidade de divergência se torna maior", disse, ao participar do 7º Encontro Nacional de Estudos Estratégicos, promovido pelo Gabinete de Segurança Institucional do Palácio do Planalto.

"Hoje em dia, tanto a defesa quanto a política externa são extremamente ligadas", afirmou o secretário-geral, um defensor ferrenho do reaparelhamento das Forças Armadas. Ele lembrou que o Brasil tem hoje 55 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza, o equivalente à população da França, e previu que, quando esse contingente entrar para o mercado de consumo, o Brasil será um país mais forte, com "interesses externos". Nesse momento da palestra, o embaixador fez uma ironia clara aos Estados Unidos: "A Índia tem US$ 1 bilhão no Irã. Se tivéssemos US$ 1 bilhão no Irã, talvez víssemos um pouquinho diferente a questão do Irã (país que vem sendo pressionado pelo governo americano a não desenvolver um programa nuclear)."

Samuel sustentou que os orçamentos de defesa são, em alguns países, instrumentos de desenvolvimento tecnológico. "O orçamento dos EUA nessa área é equivalente à metade do PIB brasileiro." Questionados pela platéia sobre os pesados investimentos da Venezuela em armas, o embaixador e o ministro da Defesa, Nelson Jobim, presente ao seminário, não se mostraram preocupados. "Esse é um problema interno da Venezuela", disse Jobim. "Não temos pretensão de dizer a um país como ele deve se organizar. Não queremos que ninguém faça isso conosco. Não vamos intervir em nenhum país. Ponto", declarou Samuel.

Em sua palestra, o secretário-geral disse que a concentração de poder, em meio a uma "era de globalização e violência", é uma característica do sistema internacional. Um número pequeno de nações concentra a produção, o registro de patentes, a fabricação de armamentos. Os gastos militares dos EUA, citou Samuel, são superiores ao dos dez países seguintes somados - "com exceção da China", registrou. De um PIB mundial de US$ 35 trilhões, apenas os EUA respondem por US$ 13 trilhões.

Na opinião do embaixador, há ainda, por parte dos países ricos, o poder ideológico, que, segundo ele, é "o poder de difundir as próprias visões e de gerar visões do mundo e de difundi-las através da mídia, do cinema, das agências de notícias". Isso serve tanto para a política externa quanto para a defesa. A concentração de poder aumentará. A tendência desses países, com exceção dos EUA, por ser uma nação de imigrantes, é sofrer redução de população ao longo do tempo. Na periferia do sistema, "onde nos encontramos", assinalou, se dá o inverso: aumento da população com menor poder.

Nesse cenário, disse Samuel, os países ricos trabalham para manter seu poder e seus "privilégios". Na área de meio-ambiente, por exemplo, são os maiores poluidores do planeta, mas querem continuar poluindo e impor limites ao desenvolvimento industrial dos países em desenvolvimento. Nas negociações agrícolas, prosseguiu Samuel, desejam preservar os subsídios, enquanto os outros, como o Brasil, não têm essa possibilidade.

Na área de defesa, a toada seria a mesma. "Eles querem a possibilidade de os países altamente armados continuarem a se armar e os países desarmados, a se desarmarem. Em resumo, é assim quando tiramos a cobertura ideológica que cerca esse tema", disse, referindo-se novamente de maneira tácita à política externa americana.

Ele reafirmou as três prioridades da política externa do governo Lula - por ordem de importância, obter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, criar e liderar um bloco sul-americano, e negociar regras internacionais que não restrinjam o desenvolvimento do país. "Senhores, o Brasil jamais será um país pequeno, mesmo que muitos o desejem pequeno", profetizou. "Se fizerem uma lista dos dez maiores países do mundo em população, território e PIB, somente três estão nas três listas: China, EUA e Brasil."