Título: Presidente do IBGE diz que idéia de portaria partiu do próprio instituto
Autor: Vera Saavedra Durão
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2005, Brasil, p. A2

Uma nota divulgada ontem pelo ministro interino do Planejamento, Nelson Machado, e pelo presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Eduardo Pereira Nunes, nega a existência de qualquer tipo de censura ao IBGE ou a seus servidores, em razão da portaria número 15, de 27 de janeiro, baixada no "Diário Oficial da União". A portaria determina a apresentação ao ministério, 48 horas antes da divulgação, das pesquisas estruturais do instituto, como, por exemplo, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Nunes disse que a portaria visa simplesmente a estender às pesquisas estruturais um procedimento que o IBGE já adota nas conjunturais. As pesquisas conjunturais, como as de inflação, emprego, vendas do comércio e produção da indústria, têm, por determinação de portaria, seus resultados apresentados 24 horas antes ao Ministério do Planejamento e duas horas antes da divulgação aos outros ministérios. No caso das estruturais, não havia uma norma e às vezes, disse ele, a imprensa tomava conhecimento da pesquisa antes do governo. "Sugerimos normatizar essa divulgação e assim foi feito por portaria que nós mesmos sugerimos ao governo", explicou. "O IBGE não está passando por nenhum tipo de constrangimento, mas fico satisfeito de ver manifestações de solidariedade contra eventual ameaça de mordaça ao instituto", disse. Ele garantiu que a portaria não foi redigida com essa intenção, reconhecendo que houve uma "coincidência" por ela ter sido baixada depois que o presidente Lula contestou publicamente os resultados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) que considerava a obesidade um problema maior no país que a desnutrição. Luiz Roberto Cunha, economista da PUC-RJ, usuário intensivo das pesquisas do IBGE, acredita que no caso da POF sobre nutrição, o erro foi que o presidente "confundiu IBGE com Ibope, ou seja, pesquisa de opinião com coisa científica". No seu entender, a portaria não vai resolver esse tipo de confusão, mas o IBGE agora vai liberar as pesquisas para o governo ao mesmo tempo em que para os jornalistas. "O que me pareceu estranho é que a imprensa tivesse tempo de fazer análise e o governo não", disse. "Instituições internacionais, como o Banco Mundial, por exemplo, liberam com cláusula de sigilo suas pesquisas mais complexas para algumas autoridades para fazer análises e no dia da divulgação tecer comentários", afirmou. Cunha afasta a hipótese de possibilidade de manipulação dessas pesquisas pelo governo. "Essas pesquisas levam um ano para ser feitas. Não dá para distorcê-las ou manipulá-las em 48 horas. O que pode acontecer é censurar, não divulgar, mas esse não é o caso". O economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castello Branco, nâo vê necessidade de haver essa burocracia para divulgar as pesquisas estruturais do IBGE. "Estão criando normas e regras onde não precisa". Castelo Branco também não acredita que pesquisas desse tipo possam vir a ser alterada. Para ele, o problema é "mais de natureza política do que técnica". Francisco Eduardo Pires de Souza, do Instituto de Economia da UFRJ, achou a medida "esquisita", sobretudo depois da pesquisa da POF. "O IBGE tem uma história longa de autonomia."