Título: Brasil e Argentina unem forças na pesca
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2007, Agronegócios, p. B14

O Brasil e a Argentina farão nova ofensiva na Organização Mundial do Comércio (OMC), na próxima semana, pelo direito de dar subsídios para montar frota nacional de barcos e desenvolver o setor pesqueiro. Numa ação política pouco habitual, Brasília e Buenos Aires reuniram suas respectivas propostas numa só, definindo os termos de "tratamento especial e diferenciado" num futuro acordo global estabelecendo regras para o setor.

Com isso, o Brasil procura preservar o Profrota, que prevê R$ 1,5 bilhão até 2009 para financiar aquisição, construção, compra de equipamentos e adaptação de embarcações. O país quer formar uma frota pesqueira oceânica, com embarcações para atuar na Zona Econômica Exclusiva (ZEE) e em águas internacionais, que compreende a faixa que se estende das doze às duzentas milhas marítimas. É onde são capturados atuns, caranguejo de profundidade e outras espécies de maior valor comercial.

Até agora, o Profrota financiou cinco embarcações, valendo R$ 18,5 milhões. Outros 38 projetos estão em andamento no valor de R$ 168 milhões. Com isso, os aluguéis de barcos estrangeiros vão diminuir.

Os espanhóis, que têm excesso de embarcações, tentam atrair governos do Nordeste com outro negócio. Prometem milhões de dólares de investimentos em troca de criação de portos internacionais, onde seus próprios barcos beneficiariam o peixe e exportariam, reduzindo os custos de levar o produto até os portos espanhóis. Só que a decisão para esse tipo de porto é federal, e o governo rejeita a demanda espanhola por estimar que desestimularia a indústria pesqueira nacional.

A negociação na OMC definirá as condições do setor de pesca no futuro. Atualmente, o Acordo de Subsídios e Medidas Compensatórias (ASMC) não cobre as ajudas ao setor. Até agora, as regras da entidade visaram regular bens produzidos em determinado país. Assim, para constatar a existência de um subsídio, a entidade avalia os benefícios dados a uma empresa que causam distorções de comércio com outro país.

O caso da pesca é diferente. Quando um país dá subsídios ao setor, não cria distorção de comércio em terceiro país por ter beneficiado um produto nacional. O problema aí é a distorção no acesso a um recurso que é compartilhado. O pescado é um recurso comum que somente passa a ser considerado originário de um país quando é capturado.

Na negociação na OMC, duas abordagens se afrontam. De um lado, estão países que dão amplos subsídios e têm frotas altamente intensivas na captura de pescado em alto mar, e que se utilizam de acordos de acesso as águas juridicionais de terceiros países. É o caso do Japão, China, Taiwan, apoiados pela União Européia.

Esse grupo em principio não queria nenhuma regra. Depois passou a defender listas de subsídios proibidos, outra de subsídios acionáveis (podem ser questionados pelos parceiros), a terceira das subvenções autorizadas, além de uma previsão especifica para subsídios de países em desenvolvimento.

Ocorre que outros países consideram muito difícil definir uma lista completa e fixa de subsídios proibidos no setor. Isso porque novas ajudas governamentais podem ser criadas, causando distorção na produção e contornando a regra.

O outro grupo inclui países como Nova Zelândia, EUA, Brasil e Argentina e defende abordagem que proíba todas as subvenções ao setor de pesca, com exceções pontuais (que seriam acionáveis), além de previsão especifica para ajuda dada por países em desenvolvimento.

O Brasil tem insistido que países ricos criaram enormes frotas nacionais graças a vultosos subsídios, e desenvolveram o setor ignorando critérios de distorção de produção.

Nesse cenário, o país defende que as nações em desenvolvimento possam criar frota nacional e desenvolver a pesca com a ajuda governamental, sem provocar distorção na produção. Procura garantir aos outros países que não há "cheque em branco" para as subvenções das nações em desenvolvimento. Para isso, sugere o critério de auto-determinação, de forma que o mesmo país que dá o subsídio também desenvolva sistemas de gerenciamento pesqueiro para determinar o estado de estoques de pescado que possam ser explorados comercialmente.

Assim, não se penaliza o país em desenvolvimento que queira entrar no setor pesqueiro, por causa de erros dos desenvolvidos, que hoje têm uma frota que é 250% superior a oferta dos oceanos em termos de pescado. Alguns países europeus, Japão, China e Coréia do Sul dão subsídios estimados em US$ 30 bilhões por ano.

A proposta do Brasil e Argentina defende que os subsídios cubram também fornecimento de gasolina e atividades relacionadas a subsistência dos pescadores.