Título: Lei do Reporto restringe recebimento de precatório
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 01/02/2005, Brasil, p. A3

Um artigo da lei sobre os incentivos à modernização dos portos trouxe uma importante restrição no levantamento dos precatórios. O credor só terá o dinheiro disponível caso apresente à Justiça certidões que mostrem que está em dia com União, Estados e municípios, inclusive com o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Só estão livres da nova regra os precatórios com valores de até 60 salários mínimos, o que corresponde a R$ 15,6 mil, e os chamados de natureza alimentar, derivados de salários, aposentadorias e pensões. A nova restrição foi estabelecida pela Lei nº 11.033/2004. "O problema é que, pelo texto da lei, quem tem precatório do Estado precisará estar em dia também com tributos do município e da União. Ou seja, não importa de qual esfera administrativa é o precatório. O credor deverá estar em dia com todos os tributos", diz o advogado Zanon de Paula Barros, sócio do escritório Leite, Tosto e Barros. "É um dispositivo que veio para justificar a falta de pagamento de precatórios", analisa. "Como veio escondida numa lei sobre outros assuntos, a nova previsão passou despercebida, embora tenha um grande impacto para os credores de precatório", diz Sérgio Presta, do escritório Veirano Advogados. Plínio Marafon, sócio do Braga & Marafon, acredita que a intenção da medida é impedir que alguém com pendências com o Fisco receba precatórios. Mesmo que as pendências não sejam da mesma esfera de administração pública. "O que pode atrapalhar é que muitas empresas estão ainda com dificuldade para conseguir a certidão negativa. Isso pode retardar a autorização para o recebimento do precatório." O advogado Marco Antonio Innocenti, do Innocenti e Advogados Associados, diz que a interpretação da lei deve ser o mais restrita possível. "Não há sentido em negar o pagamento de um precatório estadual em razão de uma pendência de Imposto de Renda, que é um tributo federal. Se isso acontecer, deverá haver questionamento", defende. "Há pelo menos dois aspectos questionáveis sobre essa restrição", diz Barros. A primeira é que o dispositivo sobre precatórios foi colocado em meio a uma lei sobre assunto totalmente diverso. Segundo o advogado, isso violaria a Lei Complementar nº 95/1998. "Além disso, a lei pode ser questionada por representar abuso de poder do legislativo, já que há uma violação ao princípio da razoabilidade", argumenta. "Além de misturar assuntos de esferas administrativas diversas, a lei ainda exige regularidade junto ao FGTS, obrigação que não possui natureza tributária, embora seja um encargo trabalhista", alega o advogado. Para Barros, a nova restrição poderá dificultar ainda a cessão de créditos pela qual uma empresa compra precatórios de outra para garantir processos de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Algumas empresas conseguiam dar os precatórios em garantia com base em decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ). "A nova norma cria um risco a mais no contrato entre quem compra e quem vende", acredita o tributarista.