Título: Disputa do Madeira chega aos bancos
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2007, Brasil, p. A4

Os concorrentes da Odebrecht no leilão da usina Santo Antônio elogiaram a liberação dos fornecedores de turbinas e geradores, mas cobraram o fim dos acordos de exclusividade que a construtora mantêm com agentes repassadores de recursos do BNDES.

A instituição deverá financiar a construção de até 75% das hidrelétricas do rio Madeira - metade do crédito é liberada diretamente e a outra metade ocorre por meio de agentes financeiros credenciados. Camargo Corrêa e Suez Energy reclamam que quase todos os bancos, à exceção da Caixa Econômica Federal, têm se recusado a conversar com os demais consórcios sobre financiamento. Segundo as empresas, os bancos ficaram amarrados por acordos de exclusividade semelhantes àqueles firmados entre a Odebrecht e os fornecedores de equipamentos.

A Secretaria de Direito Econômico (SDE) decidiu investigar o caso e enviou questionários aos consórcios que disputarão o leilão de Santo Antônio, previsto para 10 de dezembro. Em resposta à SDE, o presidente da Suez, Maurício Bähr, diz que a empresa "vem encontrando problemas" na contratação de bancos. Cita especificamente o Unibanco e o Santander, "dos quais a Suez é cliente há muitos anos e que repassaram recursos do BNDES para o projeto São Salvador" - hidrelétrica no Tocantins. Bähr, segundo documento ao qual o Valor teve acesso, afirma que essas instituições "não estão podendo nem conversar sobre qualquer operação para o projeto Santo Antônio em função do acordo de exclusividade com CNO/Furnas".

João Canellas, diretor da Amel, empresa criada pela Camargo Corrêa para participar do leilão, reforça a observação. "Já fizemos um circuito de cartas-convite, mas grande parte dos bancos nacionais já tinha se associado, de alguma forma, ao outro consórcio", disse Canellas. Mencionou Bradesco, Banco do Brasil, CEF, Itaú, Unibanco e Safra como potenciais repassadores de recursos do BNDES. Outros bancos, segundo ele, não são credenciados ou cobram taxas elevadas para fazer o repasse.

O tom das queixas está um degrau abaixo do adotado para as cláusulas de exclusividade com fornecedores de equipamentos, uma vez que as encomendas de turbinas e geradores devem chegar aos bilhões de reais. Mesmo assim, as reclamações constituem mais um embate contra a Odebrecht. "Entendemos não ser aceitável acordos de exclusividade com bancos, seguradoras que estejam oferecendo serviços que façam parte do portfólio dos mesmos e que estejam à disposição de qualquer cliente", protestou a Suez Energy, em ofício à SDE.

Apesar de espernearem, a tendência dos demais consórcios é driblar a restrição, garantindo o repasse do BNDES por meio da CEF ou de algum banco disposto a contestar as cláusulas de exclusividade. "Pode ser que a liberação dos fornecedores tenha algum efeito para trazer os bancos a uma nova realidade", comentou Canellas.

Um dia depois de abrir mão das cláusulas de exclusividade com os fornecedores de equipamentos, a Odebrecht recebeu a nova queixa dos concorrentes como uma "traquinagem". Irineu Meireles, diretor da Odebrecht Investimentos em Infra-Estrutura, lembrou que a construtora já havia liberado as subsidiárias do grupo Eletrobrás a associar-se aos demais consórcios.

"Espero que o próximo passo dos concorrentes não seja solicitar que façamos nossas propostas (no leilão) em três ou quatro vias e que também caucionemos por eles", ironizou o diretor da Odebrecht. De acordo com ele, é prática recorrente no mercado a exclusividade com "advisors" financeiros - os agentes repassadores de recursos. "Seguramente, nos registros de qualquer dos concorrentes do rio Madeira, existem exemplos iguais de acordos desse tipo. Todos os 'advisors' são exclusivos do cliente que os contrata", disse Meireles.

Segundo o executivo, a intenção da Odebrecht em renunciar aos acordos de exclusividade com fornecedores de equipamentos foi não atrasar o cronograma das obras de Santo Antônio, usina que começará a gerar energia em 2012. Ele lamentou as críticas dos concorrentes e disse que nada justifica, agora, um novo adiamento do leilão. "A própria opinião pública poderá julgar todos os esforços que a Odebrecht tem feito no sentido de dar mais concorrência e de manter o cronograma do leilão."

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou ontem, por unanimidade, o termo de compromisso proposto pela Odebrecht para liberar os fornecedores de turbinas e geradores. Os processos administrativos em curso foram arquivados e termina a querela judicial envolvendo a construtora, seus concorrentes e o governo.

O Cade estipulou multa diária de R$ 100 mil em caso de descumprimento do termo de compromisso, por meio do qual Alstom, Voith-Siemens e VA Tech poderão fornecer equipamentos a outros consórcios, após o leilão, caso a Odebrecht não vença a disputa. A GE fica liberada para associar-se aos demais consórcios, desde que não repasse informações obtidas nas negociações com a Odebrecht.