Título: Investimentos em usinas de etanol são adiados nos
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 13/11/2007, Agronegócios, p. B14

Numa manhã gelada de dezembro de 2006, um grupo de investidores e políticos locais se reuniu para uma rápida cerimônia numa fazenda nos arredores de Dexter, uma pequena cidade do Meio-Oeste americano. Munidos de pás novinhas em folha e decoradas com placas especiais para lembrar a ocasião, eles mexeram um pouco na terra, tiraram fotos e foram para casa.

O objetivo da cerimônia era marcar o lançamento de um projeto que prometia mudar a vida da cidade: a construção de uma usina de etanol com capacidade para produzir mais de 400 milhões de litros de combustível por ano. Mas pouca coisa aconteceu depois daquele dia. Quase um ano depois, tudo que restou na fazenda é uma placa indicando que uma usina poderá ser construída ali algum dia.

"Faz tempo que não tenho notícias desse pessoal", disse ao Valor o prefeito de Dexter, Jerry Stiles, que guarda em casa uma das pás usadas na cerimônia de 2006. "A última coisa que eu soube é que eles não estavam conseguindo dinheiro para fazer a usina", afirmou. Dexter tem pouco mais de 700 habitantes e quatro páginas na lista telefônica do Estado de Iowa. A usina de etanol será a primeira indústria da cidade se o projeto sair do papel.

Histórias como essa tornaram-se comuns nos Estados Unidos nos últimos meses, e confirmam que a indústria americana de etanol atravessa uma fase crítica. Há dezenas de novas usinas em planejamento, mas a demanda pelo combustível ainda é insuficiente para tornar viáveis economicamente todos os projetos em andamento. Muitos têm sido adiados ou abandonados, sem obter financiamento.

A falta de demanda e o aumento da produção das usinas que já ficaram prontas fizeram os preços do etanol despencar no país, reduzindo a lucratividade da indústria e desanimando os investidores. "Entramos no jogo numa hora ruim", disse Christopher Miller, presidente da Alpha Holdings, empresa responsável pelo projeto de Dexter e que tem outro em desenvolvimento numa cidade próxima.

Ele diz ter cerca de 60% dos recursos necessários para iniciar a construção das duas usinas e acredita que conseguirá o resto do dinheiro em três meses. Há vários fazendeiros da região entre os acionistas da empresa, mas muitos não se interessaram quando Miller começou a passar o chapéu, porque já tinham investido em outras usinas. O aperto de crédito dos últimos meses tornou as coisas piores.

Segundo a Associação dos Combustíveis Renováveis (RFA, na sigla em inglês), principal porta-voz da indústria nos EUA, há 72 usinas em construção no país. Junto com uma dezena de projetos de expansão de usinas que estão prontas, os novos empreendimentos poderão aumentar a capacidade de produção americana de 26,5 bilhões de litros de álcool por ano para 51 bilhões dentro de dois anos.

Desde julho, pelo menos quatro usinas tiveram as obras suspensas, e até empresas grandes como a VeraSun estão com dificuldades. "É melhor suspender o investimento até que o mercado ofereça um retorno aceitável", afirmou em outubro o diretor financeiro da VeraSun, Danny Herron, ao anunciar a suspensão de um dos cinco projetos que a companhia está desenvolvendo.

O problema da indústria é que ela está muito perto de atender toda a demanda que existe atualmente no mercado, mas há tanta incerteza sobre o futuro que os donos das novas usinas não sabem se terão para quem vender combustível. Investimentos na infra-estrutura necessária para distribuir o etanol produzido no Meio-Oeste para as regiões mais ricas do país também têm sido adiados.

Alguns Estados importantes, como a Flórida e a Califórnia, devem começar a exigir em breve que a gasolina vendida dentro de suas fronteiras tenha 10% de álcool. Mas na maioria dos Estados americanos não existe obrigação semelhante e vários projetos apresentados no Congresso para ampliar o consumo de etanol no país empacaram.

Analistas do banco de investimentos Bear Stearns calculam que o preço médio do litro de etanol nos EUA atingiu US$ 0,46 em outubro, metade do valor que a mercadoria chegou a alcançar no primeiro semestre do ano passado, quando começaram a ser construídas muitas das usinas que estão em operação.

Como os preços do milho, principal matéria-prima usada na produção de álcool nos EUA, continuaram subindo, a lucratividade das usinas diminuiu. O banco estima que a margem de lucro das usinas tenha caído pela metade nos últimos dois meses e esteja atualmente ao redor de 11%. Empresas com ações negociadas em bolsa viram o valor dos papéis despencar neste ano.

Em geral, os observadores da indústria acreditam que os problemas são passageiros. Os grupos com maior poder de fogo financeiro têm mantido grande parte dos seus investimentos. Se as leis em discussão nos Estados e no Congresso forem aprovadas nos próximos meses, elas ampliarão de maneira significativa a demanda por etanol no país, atraindo novos investimentos.

Com o barril de petróleo se aproximando de US$ 100, o otimismo está voltando. "A cura para os preços baixos que temos hoje no mercado de etanol são os preços baixos mesmo", disse Rick Schwarck, presidente da Absolute Energy, que está construindo sua primeira usina no Estado de Iowa. "Eles são um incentivo para as refinarias misturarem mais álcool à gasolina". A usina da Absolute deverá ficar pronta em janeiro de 2008.