Título: Anúncio de R$ 5,5 bilhões
Autor: Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 21/01/2011, Brasil, p. 9

Ministra do PAC garante que vai separar o valor para obras de contenção de encostas, promete cobrar das prefeituras projetos que ajudem a liberar rapidamente os recursos e assegura que não haverá contingenciamento nessa área

Especial para o Correio Em mais uma tentativa de mostrar que catástrofes climáticas como a da região serrana do Rio de Janeiro não podem mais ocorrer, o governo federal anunciou ontem que vai liberar R$ 5,5 bilhões para a realização de obras de contenção de encostas e drenagem ainda este ano. O montante está previsto na segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), que prevê mais R$ 1 bilhão para projetos de contenção de encostas.

Ontem, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, agora responsável pelo fórum de infraestrutura determinado pela presidente Dilma Rousseff, afirmou que o monitoramento das obras do programa será aperfeiçoado e dará mais condições para que União, estados e municípios, além do setor privado, realizem novas obras. Belchior participou da primeira reunião do grupo com outros 16 ministros, no Palácio do Planalto.

¿Do R$ 1 bilhão previsto no PAC 2 para contenção de encostas, R$ 500 milhões já foram selecionados, sendo que R$ 100 milhões irão para o Rio de Janeiro. Os outros R$ 500 milhões serão selecionados neste ano e de preferência irão para os 99 municípios brasileiros que pediram recursos por terem sofrido em decorrência das chuvas¿, disse a ministra.

Miriam afirmou que vai pedir celeridade às prefeituras na elaboração de projetos para que as obras sejam concluídas antes do próximo verão. ¿Vamos atender primeiro onde o problema é mais grave. A gente espera que os municípios acelerem os projetos para que as obras se iniciem no período da seca e estejam prontas no próximo período de chuvas¿, afirmou.

Segundo ela, o trabalho não será prejudicado pelo contingenciamento de recursos que será feito pela equipe econômica nos próximos dias, pois avalia que o investimento é fundamental para o crescimento do país. ¿A última coisa que será cortada é o orçamento do PAC. Além disso, ainda não há o tamanho do corte que será realizado¿, argumentou.

Alerta O ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, apresentou ontem, em reunião na Casa Civil, uma proposta detalhada do que será o sistema nacional de alerta e prevenção de desastres naturais, anunciado pelo governo nesta semana. Ainda não há custos estimados e o prazo de implementação será de quatro anos.

A promessa é de que, em um ano, será possível integrar sistemas de radares já existentes, como os da Aeronáutica, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e de previsão meteorológica dos estados. A ideia é criar um sistema de informações climáticas e ambientais em tempo real, pelo qual seja possível prever e prevenir deslizamentos, enchentes, inundações e alagamentos em áreas urbanas.

Mercadante reconheceu que os governos anteriores não implantaram um mecanismo nacional de alerta e prevenção de desastres, embora estivesse previsto em decreto publicado em 2005, no primeiro mandato do presidente Lula. Em entrevista ao programa Bom Dia, Ministro, ele afirmou que ¿nós não fizemos isso em 510 anos e vamos fazer o mais rápido possível. Os prefeitos não fizeram, os governadores não fizeram, os governos anteriores não fizeram¿, afirmou.

PREJUÍZO SEM FIM » Casas destruídas à margem do Rio Preto, encostas da serra destruídas e seis pontes arrastadas pela água. Nesse cenário, que se estende pelos 27 quilômetros da estrada Silveira da Motta, a principal via de São José do Vale do Rio Preto, pequenos comerciantes tentam reerguer seus estabelecimentos. ¿Às vezes, quando caio na realidade, dá vontade de parar com tudo. Mas penso que Deus deve ter um plano pra gente¿, diz Silas Gonçalves de Almeida, dono de um comércio na região. A reconstrução das ruas e o atendimento aos desabrigados em São José do Vale do Rio Peto devem durar de seis meses a um ano, segundo a prefeitura do município. Estimativas preliminares da administração municipal apontam que serão necessários mais de R$ 40 milhões para recuperação. O comerciante Zacarias Mendes viu a água chegar ao teto de sua loja de confecções. Ele calcula em cerca de R$ 650 mil o prejuízo com as mercadorias perdidas e os reparos no prédio. ¿Tenho fornecedores para pagar. Tenho compromissos em cheques pré-datados. Tenho que voltar a trabalhar.¿ Dono de um posto de gasolina, José Carlos Rocha ainda não conseguiu religar os equipamentos e vive situação semelhante. Ele disse que precisa de R$ 500 mil para comprar novas bombas e reconstruir o que foi danificado pela chuva.

Convênio garante aluguel

As prefeituras dos municípios da região serrana do Rio de Janeiro começam hoje o cadastramento das vítimas das chuvas que receberão o aluguel social. O governador do estado, Sérgio Cabral, assinou ontem, em Teresópolis, um convênio que destinará R$ 40,8 milhões para custear o benefício. Cerca de 7 mil famílias que tiveram suas casas destruídas ou moram em locais de risco e precisam ser removidas receberão entre R$ 400 e R$ 500 mensais durante um ano.

O aluguel será destinado a moradores de Nova Friburgo, Teresópolis, Petrópolis, Sumidouro, São José do Vale do Rio Preto, Bom Jardim e Areal. A Caixa Econômica Federal, responsável pelo pagamento por meio dos cartões do programa Bolsa Família ou de contas-correntes, pretende levar aos municípios atingidos caminhões que passarão a funcionar como agências móveis. Vítimas que perderam documentos com as enxurradas podem preencher um formulário nas prefeituras para pedir o benefício.

Segundo o secretário de Assistência Social e Direitos Humanos do estado, Rodrigo Neves, todos os inscritos entrarão, também, em programas habitacionais que devem se iniciar em fevereiro. ¿O cadastramento será feito pelos municípios e processado pela Secretaria de Assistência Social, que criará um banco de dados para acompanhamento. Haverá o apoio do governo federal na construção de moradias¿, afirmou Neves.

Nos municípios atingidos, pelo menos 6 mil pessoas perderam suas casas e outras 7,7 mil tiveram que sair temporariamente de onde moravam e se abrigam em locais improvisados. A cidade de São José do Vale do Rio Preto, que tem cerca de 2 mil moradores nessa situação, recebeu 50 barracas semelhantes às usadas no ano passado para abrigar vítimas do terremoto que devastou o Haiti e das enchentes em Alagoas e Pernambuco. As tendas, doadas pela ONG Shelterbox e pelo Rotary Club da cidade, têm capacidade para abrigar até 10 pessoas e devem ser enviadas também às outras localidades devastadas.

Acidente O trabalho de socorro às vítimas continua e, ontem, ventos fortes na zona rural de Nova Friburgo derrubaram um helicóptero do Exército que participava de resgates na região. A queda, no entanto, ocorreu a poucos metros do solo e não deixou feridos graves. Estavam na aeronave três militares do Exército, o ouvidor da prefeitura da Teresópolis, Ricardo Raposo, e o presidente da Cruz Vermelha do município, Herculano Abraão.

Segundo o Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MPE-RJ), ainda há 333 pessoas desaparecidas desde o temporal do dia 12. A Defesa Civil fluminense aponta que o desastre já provocou 754 mortes. A corporação chegou a divulgar o número de 765 mortos durante a tarde, mas retificou a informação horas depois.

Estragos em São Paulo e Minas

A Grande São Paulo ficou em estado de atenção durante uma hora na tarde de ontem. Segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE), uma forte chuva atingiu boa parte da Zona Norte e toda a Região Central da capital. Pelo menos seis pontos de alagamento foram registrados na cidade.

O interior do estado também sofre com as fortes precipitações. A prefeitura de Mauá, na Região do ABC, declarou situação de emergência após contabilizar seis mortes e 509 casas interditadas. Em Sorocaba, um temporal derrubou 48 árvores, além de postes e muros. A prefeitura, o Corpo de Bombeiros e a concessionária de energia elétrica da cidade tiveram que montar uma força-tarefa para desobstruir ruas e reparar as redes de transmissão de energia.

Em Minas Gerais, foi confirmada, ontem, a 17ª morte causada pelas chuvas registradas desde novembro. Jesus Barsanulfo da Silva, 44 anos, fazia parte de um grupo de turistas do Distrito Federal e de Goiás que visitava uma cachoeira na Serra do Cipó. Eles foram surpreendidos por um súbito aumento do nível da água. Segundo a Defesa Civil, há 135 cidades afetadas pelos vendavais e deslizamentos, e 84 prefeituras decretaram situação de emergência. O tempo ruim no estado danificou mais de 6 mil casas e destruiu 113 pontes.

Comissão para tratar do clima

A Comissão Permanente do Congresso Nacional reuniu-se ontem para debater propostas com o objetivo de evitar novas catástrofes, como as que ocorreram na região serrana do Rio de Janeiro. Os deputados e senadores aprovaram um voto de solidariedade aos familiares das vítimas das chuvas na região serrana, além da recomendação ao Executivo que elabore um plano nacional de prevenção e enfrentamento das catástrofes ambientais.

Também foi aprovada a recomendação para que a nova legislatura ¿ que assume em fevereiro ¿ crie uma comissão mista para tratar dos problemas climáticos. A pedido da senadora Marina Silva (PV-AC), que deixa o mandato em 31 de janeiro, o presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), incluiu na pauta de convocação da comissão o debate com técnicos para analisar a intensificação dos efeitos climáticos no país e o que pode ser feito para minimizá-los.

Logo na abertura da sessão, o secretário de Políticas e Programas em Ciência e Tecnologia, Luiz Antonio Barreto de Castro, criticou os investimentos em prevenções a acidentes climáticos no país: ¿Fizemos um sistema-piloto de radares que ficou fora do PAC 1 e do PAC 2. O então ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que não entraria mais nada no PAC 2¿.

Já o professor de geotecnia da Universidade de Brasilia (UnB) e representante da Associação Brasileira de Mecânica de Solos e Engenharia Geotécnica, André Pacheco Assis, destacou que desmoronamentos como os verificados na região serrana ocorrem todos os anos e nenhuma medida de prevenção é tomada. ¿Esse problema, com o agravamento das mudanças climáticas, vai acontecer com mais e mais frequência a partir de agora¿, disse o professor.