Título: Emergentes cobram uma agenda dos EUA e advertem contra manobras
Autor: Genebra , Assis Moreira, de
Fonte: Valor Econômico, 16/11/2007, Brasil, p. A2

Uma aliança de 70 países em desenvolvimento, coordenada pelo Brasil, cobrou ontem dos Estados Unidos um "cronograma" urgente para mostrar se o país quer mesmo concluir a Rodada Doha na Organização Mundial do Comércio (OMC). Depois de presidir reunião dos grupos em desenvolvimento, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, destacou que os países enviaram aos EUA e a União Européia "a mensagem de que percebemos a manobra para tentar nos dividir" com uma suposta nova proposta na negociação industrial que beneficiaria alguns emergentes.

Os dirigentes dos grupos de países em desenvolvimento sublinharam a "união e solidariedade" em torno da agricultura como centro da Rodada Doha, e o engajamento por um acordo "leal" o mais rápido possível.

Amorim e Kamal Nath, ministro de comércio da Índia, advertiram que as incertezas sobre a extensão do TPA (a autorização do Congresso para a administração Bush negociar acordos comerciais sem emendá-los) aumentam os riscos sobre o futuro da negociação global e freia concessões por parte dos países.

A preocupação cresce, segundo Amorim, porque se começa a falar de julho próximo como novo prazo para acordo na OMC, depois de inúmeros prazos já superados. Ele estimou que o sentido de urgência está desaparecendo e julho pode ser muito tarde para o atual Congresso aprovar um pacote negociado pelos EUA e os outros 150 países.

Amorim reclamou que ao chegar em Genebra ouviu tanto rumor logo no aeroporto que teve vontade de pegar imediatamente o avião de volta ao Brasil. Ele aproveitou um "rumor" para alvejar americanos e europeus, sempre insistindo que não queria jogar a culpa em ninguém pelo impasse na negociação global.

Segundo o ministro, o "rumor" é de que Washington e Bruxelas estariam preparando um documento para a negociação industrial. E ele considerou essa atitude uma forma de esconder a falta de concessões na área agrícola e colocar toda ênfase na industrial. "Isso seria exclusivamente para colocar pressão sobre nós. O conluio é para desviar a atenção da negociação agrícola, porque eles (EUA e UE) encontraram uma zona de conforto mútuo sobre corte de subsídios e de tarifas. Mas essa manobra para dividir, para oferecer alguma coisa a certos países, é fútil, porque os países em desenvolvimento tem cada vez mais uma aliança estratégica", afirmou Amorim.

O Valor telefonou para o porta-voz de Peter Mandelson, o comissário europeu de comércio, para questioná-lo sobre a existência do documento, e ele repetiu a questão a seu chefe. Depois telefonou para dizer que não havia documento dos EUA e da UE, mas considerou que diferentes países ricos apresentavam sua "visão" diretamente ao mediador da negociação. Outra fonte em Genebra acrescentou que os países ricos estariam sugerindo idéias para "contrabalançar" a proposta feita pelo Mercosul de flexibilidade adicional para suas indústrias.

Amorim admitiu "nuances" entre alguns emergentes, e disse que falou aos ministros do México e do Chile que os dois países cometeram um "erro tático" ao se posicionarem com uma posição próxima a dos ricos na área industrial porque "isso aliviou a pressão sobre (os ricos) na agricultura".

Em Genebra, o ministro manifestou também frustração com a demora na reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas. E reiterou que o Brasil "tem muita influência nas relações internacionais", mas desmentiu que o país tenha candidato para dirigir a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), que perderá em breve seu diretor Kamil Idris, que irritou ao mesmo tempo americanos e europeus.