Título: Vale confirma mudança em projeto de usina no Ceará
Autor: Durão , Vera Saavedr ; Ribeiro , Ivo
Fonte: Valor Econômico, 16/11/2007, Empresas, p. B8

Depois de muita discussão com a Petrobras - que envolveu o governo e políticos do Estado do Ceará - e uma queda-de-braço com o Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), que recorreu à Justiça, o projeto de construção de uma usina de aço no Ceará começa a sair do papel. Em comunicado, a Vale do Rio Doce confirmou negociações com a sócia coreana Dongkuk Steel para tocar o empreendimento. Está prevista a assinatura de um memorando de entendimentos com a Dongkuk no próximo dia 20, em Brasília, por ocasião da visita do chairman da companhia sul-coreana, Saejoo Chang, ao Brasil.

A nova estrutura societária que está sendo desenhada para a siderúrgica, na qual a Vale será minoritária com participação entre 20% a 40%, não contempla mais a empresa italiana Danielli, que era a fornecedora do antigo projeto da Ceará Steel, cujo investimento era de US$ 800 milhões e produção de 1,7 milhão de toneladas de placas.

Como antecipou o Valor na edição de 30 de agosto, a siderúrgica a ser erguida no distrito industrial do porto de Pecém será integrada à base de minério de ferro e carvão mineral, que poderá ser importado da Colômbia ou Moçambique, apta a fazer 2,5 milhões de toneladas por ano de placas de aço. O investimento previsto, segundo a Vale, para esta primeira fase, é de US$ 2 bilhões. O projeto tem concepção modular e prevê expansão no futuro para até 5 milhões de toneladas.

O plano de construir uma usina usando o processo de redução direta, que leva gás, foi abandonado pelos sócios - Dongkuk, Danieli e Vale - depois de contar com a oposição do IBS e resistências internas na Petrobras por conta do preço do gás que seria fornecido à usina pela estatal em condições especiais. Na avaliação do IBS, haveria um subsídio ao insumo, criando um precedente para o setor siderúrgico do país.

O IBS chegou a mover duas ações na Justiça: uma ordinária na 21ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro para obter uma tutela securatória contra a Ceará Steel e a Petrobras devido a concorrência danosa e outra de agravo de instrumento suspensivo na 5ª Turma de Desembargadores do Tribunal Regional Federal do Rio, solicitando tutela securatória (uma espécie de liminar).

A entidade siderúrgica entrou ainda com representação na Secretaria de Defesa Econômica (SDE), a qual encontra-se em análise. O Ministério Público Federal, por ter sido arrolado no processo da 21ª Vara no Rio, ao lado do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), constituiu um processo de ação criminal usando seu braço investigativo, que é a Polícia Federal.

O vice-presidente do IBS, Marco Pólo Mello Lopes, disse ao Valor que a entidade, tão logo seja informada oficialmente do novo projeto da Ceará Steel, estaria disposto a abrir mão destas ações. "A idéia é que cessado o fato gerador de todas estas ações - o fornecimento subsidiado de gás para a Ceará Steel -, não há porque continuarmos tocando estes processos na Justiça". Ele acredita que, como parte interessada no projeto, provavelmente o IBS será comunicado da nova rota tecnológica da siderúrgica pelo governo federal ou pelo governador cearense, Cid Gomes, com quem Mello Lopes esteve em agosto.

O executivo disse ter ficado satisfeito com a confirmação da mudança nos planos de construção da Ceará Steel. Segundo ele, o IBS não tem nada contra o projeto de uma siderúrgica no Ceará ou em qualquer outro estado. "O que nos preocupava era o subsídio ao gás, pois o fornecimento do insumo subsidiado criava uma assimetria em relação a todo o setor, na medida em que a siderúrgica venderia aço a preços subsidiados no mercado. O mais grave é que a exportação de uma única tonelada desse produto traria problemas a toda a indústria do aço no país, como a instauração de processo de direitos compensatórios na Organização Mundial de Comércio (OMC) por conta do subsídio".

Mello Lopes considerou que se chegou a uma boa solução, depois de um longo percurso envolvendo interesses políticos. Segundo relatou, a própria Petrobras já teria se posicionado contrária ao fornecimento do gás nessa condição.

O comunicado da Vale, divulgado na quarta-feira, destaca que a usina de aço do Ceará será integrada à base de minério de ferro e carvão. E que esse projeto será o terceiro de grande porte do setor no país atraído pela Vale nos últimos três anos. Antes foram CSA/ThyssenKrupp, no Rio, e CSV/Baosteel, no Espírito Santo. Os três empreendimentos, depois de prontos, vão adicionar 12,5 milhões de toneladas à produção nacional de aço. Os investimentos são acima de US$ 10 bilhões, informa a Vale.