Título: Autoridades divergem sobre leilão do Madeira
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2007, Brasil, p. A6

Ruy Baron/ Valor DF Jerson Kelman, presidente da Aneel, em seminário promovido pelo Valor e pela Abrace: novos custos ambientais podem ser repassados às tarifas Polidamente, duas das principais autoridades do setor elétrico - o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Jerson Kelman, e o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim - expuseram ontem suas divergências, em seminário promovido pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia (Abrace) e pelo Valor. Kelman disse que a agência defendeu o adiamento para 2008 do leilão da usina Santo Antônio, primeira das duas hidrelétricas do rio Madeira.

Segundo ele, o adiamento aumentaria a competição sem comprometer o abastecimento de energia em 2012, já que o último leilão A-5 conseguiu atender 110% da demanda para aquele ano. Mesmo discordando da licitação nas próximas semanas, a Aneel "acatou diligentemente" as orientações do governo e marcou a disputa para o dia 10 de dezembro.

Tolmasquim afastou qualquer possibilidade de déficit no abastecimento de energia em 2012, mas lembrou que o leilão agora permite que as primeiras turbinas de Santo Antônio sejam ligadas no fim daquele ano, e "esse pouco a mais sempre gera mais segurança". Para ele, transferir a licitação da usina para o ano que vem é desnecessário e bateria de frente com a expectativa do mercado.

Após o seminário, Tolmasquim atribuiu aos trabalhos da EPE a redução, dos mais de R$ 13 bilhões previstos inicialmente pela Odebrecht para cerca de R$ 9 bilhões, do investimento previsto para construir a hidrelétrica Santo Antônio. Se não tivesse sido feita essa revisão, segundo ele, a tarifa máxima para o leilão chegaria a R$ 170 por megawatt-hora (MWh).

"Geralmente, os estudos apresentados pelas empresas têm muita gordura para queimar. Só é preciso localizá-la", afirmou Tolmasquim para jornalistas. Para o executivo, faltava um arcabouço institucional adequado para fazer esse tipo de revisão, antes da criação da EPE, em 2005. Segundo ele, a Aneel, então responsável pelos trabalhos, não conseguia cumprir essa missão a contento e isso acabava gerando tarifas mais elevadas.

Publicamente, Kelman e Tolmasquim não se importaram em discordar sobre quem deve ficar com o risco ambiental durante a construção de uma usina hidrelétrica. A questão remete às obras da usina de Barra Grande, na divisa do Rio Grande do Sul com Santa Catarina, que foram interrompidas no passado. Os empreendedores encontraram espécies de flora que não haviam sido detectadas na elaboração do estudo de impacto ambiental. Aumentaram os custos com as obras e surgiu uma dúvida: o risco é dos próprios investidores ou eles podem repassar o acréscimo de custos às tarifas cobradas dos consumidores?

No fim de 2005, a diretoria da Aneel decidiu que a tarifa poderia ser renegociada em função dos novos custos ambientais surgidos ao longo da construção. O Ministério de Minas e Energia divergiu e orientou a agência reguladora a rever sua decisão, menos de uma semana depois. Kelman disse que a questão está fechada, mas voltou a argumentar a favor do repasse desses custos às tarifas.

Para o presidente da EPE, a avaliação de Kelman é equivocada. "Em vez de pressionar os órgãos ambientais, os investidores passariam a pressionar os técnicos da Aneel por uma revisão das tarifas", afirmou Tolmasquim, para quem o risco deve ficar sempre com o empreendedor.

No seminário também foi apresentado um estudo da FGV Projetos que mostra que o PIB potencial do país pode ser prejudicado, nos próximos anos, pela alta dos custos de energia elétrica.