Título: Informação qualificada
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2007, Política, p. A12

Ao empossar o delegado Paulo Lacerda na direção da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o general Jorge Felix, do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, revelou à época que o governo tinha um projeto claro para a instituição: o de ampliar os poderes da Agência. Desde que substituiu o Serviço Nacional da Informação (SNI), a Abin vem aparecendo pouco e mal, muitas vezes protagonista de acontecimentos tão nebulosos quanto o serviço que a antecedeu. O melhor exemplo é ainda aquele de ter sido a Agência de Inteligência que encontrou, sob um viaduto, em Brasília, as fitas de gravação de conversas entre o BNDES, empresários e governo sobre a formação de consórcios para a privatização das teles.

Exatamente por este tipo de histórico, houve reações à informação do general Felix a respeito da ampliação de poderes da Abin. Inclusive entre autoridades do governo que, naquele momento, pretendiam marcar posição no controle da Polícia Federal, de onde havia saído Lacerda. Por mais que os dois lados queiram demonstrar, hoje, o contrário, não foi civilizado o comportamento do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, sob Tarso Genro e Luiz Fernando Corrêa, com relação ao elogiado trabalho de Lacerda à frente da Polícia Federal. Ficou claro que tudo o que não gostariam de ver era o delegado, cujos métodos supostamente espetaculosos de conduzir investigações e prender corruptos condenavam, com mais instrumentos de ação.

No Congresso, houve também reação, inclusive na bancada governista. O general, na verdade, economizou informações sobre a natureza desta ampliação de poderes. Aqui e ali foram aparecendo, nestas últimas semanas, pequenas indicações sobre os rumos dos estudos de redefinição do papel da Abin. Falou-se, por exemplo, que a agência passaria, no futuro, segundo a nova identidade em formulação, a ter poder de fazer escutas telefônicas com autorização judicial em casos de terrorismo e espionagem e sabotagem em áreas estratégicas.

Mas ainda assim foi pouca luz para quem temia, e ainda teme, a transformação da Abin, agora dirigida com a marca da competência do delegado Lacerda, em uma polícia política.

Paulo Lacerda tem tentando tranqüilizar os críticos. Alega que a vigilância e o acompanhamento do Congresso evitarão desvios da Agência. O que pode distensionar de fato as relações dos dirigentes deste serviço com o mundo político, porém, é um esclarecimento cabal sobre o que fará a Abin.

O projeto está sendo preparado por Lacerda e tem participação do ex-ministro da Justiça, seu amigo Márcio Thomaz Bastos. A essência da mudança de função seria dar à Abin competência e responsabilidade para fazer um trabalho de inteligência que permita suprir o governo, e principalmente o presidente da República, de informação qualificada e orientação precisa para a tomada de decisões em qualquer campo.

-------------------------------------------------------------------------------- Abin não será a polícia política tão temida --------------------------------------------------------------------------------

Autoridades com acesso ao presidente Lula informam que ele já está sentindo a diferença na qualidade da informação que vem recebendo. Um exemplo simples tem sido citado: Lula, que sempre disse nada saber sobre o mensalão, sobre o dossiê contra tucanos elaborado por um grupo de próximos assessores e amigos, sobre a calamitosa situação do tráfego aéreo, agora já não poderia alegar desconhecimento desses fatos, é informado sobre tudo.

A Agência terá como missão principal informar, informar, informar. Outro exemplo considerado simples mas que não ocorria antes: já na sexta-feira o presidente saberá tudo o que será publicado nas revistas semanais de informação, e terá um quadro completo de denúncias sobre irregularidades no governo que serão publicadas no fim de semana e as crises que podem vir delas. Segundo informações do setor, a Abin tem um pessoal muito qualificado em análise da informação que estava totalmente mal aproveitado.

Nos estudos em andamento para definição do funcionamento da Abin, há também um projeto, de autoria de Lacerda e Thomaz Bastos, de unir as tarefas de inteligência executadas pela Abin com as da divisão de inteligência da Polícia Federal. Juntar os dois é uma idéia muito cara a Paulo Lacerda, que levou junto com ele, para a Presidência da República, o chefe da divisão de inteligência que trabalhou na sua gestão da Polícia Federal, o Renato Porciúncula. Isto poderá facilitar uma aproximação.

"É mais fácil trabalhar com informação qualificada, conseguida uma vez só, e depois analisá-la de dois ou mais lados", observa um especialista em informação.

Em nome da esquerda

Valter Pomar, candidato da esquerda partidária à presidência do PT, contesta avaliações aqui publicadas sobre os projetos dos que com ele disputam o cargo, e desautoriza os adversários de outras correntes a definirem a ética como assunto principal da campanha. Os principais argumentos de Pomar:

"Gostaria de fazer alguns comentários sobre tua coluna, publicada no Valor de 10 de outubro. Concordo contigo que o tema da ética terá importância, embora seja necessário lembrar que não há consenso, nem no Partido, nem na sociedade, sobre o conteúdo do termo "ética". Até por isto, não considero correto dizer que "o que marca a diferença entre os contendores é, exatamente, a ética". Na minha opinião, o que marca a diferença entre os contendores é a política, o que inclui a ética. Simplificando e exemplificando: dos quatro candidatos mais fortes à presidência do partido, três (Berzoini, Jilmar e José Eduardo) fizeram parte e/ou apoiaram a política do "Campo majoritário", em algum momento do período 1995/2005.

Neste sentido, exaltar o tema da "ética" ou da "democracia partidária" pode ser apenas um expediente para ocultar a identidade política e as responsabilidades comuns com os erros cometidos pelo então "Campo Majoritário". Identidades que explicam por qual motivo José Eduardo Cardozo, Ricardo Berzoini e Jilmar Tatto apóiam de fato o mesmo candidato a presidente do PT de São Paulo: o prefeito de Araraquara, Edinho".

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras