Título: Índia sugere corte menor para bem industrial
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 16/10/2007, Brasil, p. A3

Brasil, Índia, África do Sul e outros emergentes articulam proposta mais dura na área industrial, para definir um corte menor de tarifas e excluir mais setores sensíveis, no confronto com países ricos na Rodada Doha. A India tomou a dianteira e submeteu discretamente a seus principais parceiros um "esboço de proposta", pela qual os emergentes cortariam as tarifas industriais entre 40% e 50% na média, bem abaixo do que exigem os ricos. Para aceitar corte acima disso, o Brasil e e outros emergentes precisariam obter então flexibilidade 50% maior para proteger suas indústrias - de 10% para 15% das linhas tarifárias

A pressão dos Estados Unidos, União Européia (UE) e outros ricos é grande para que os presidentes do Brasil, Índia e África do Sul se comprometam com o texto industrial que está na mesa de negociação na OMC, no encontro de cúpula dos três amanhã em Pretória. Isso significa aceitar cortes entre 55% e 60% e flexibilidade para cortar menos em 10% das alíquotas.

O documento da Índia está na linha da mensagem a ser dada pelos líderes dos três países: continuam empenhados no sucesso da Rodada Doha, mas recusam fechar um acordo a qualquer custo na OMC.

O texto indiano começou a ser articulado depois que o grupo de "economias pequenas e vulneráveis" ofereceu cortar em até 40% suas tarifas industriais mais elevadas, na quinta-feira passada. Para a Índia, os compromissos de cortes industriais devem seguir uma hierarquia. Assim, se os mais vulneráveis cortam 40% em média, os ricos devem reduzir suas alíquotas em 50% no mínimo - o dobro da redução prevista atualmente para os Estados Unidos e União Européia, que já têm alíquotas industriais baixas.

O governo de Nova Déli sugere também que os emergentes negociem coeficientes entre 28,5 e 30 na fórmula para reduzir tarifas industriais, desde que os ricos aceitem coeficiente 5. Quanto maior o coeficiente, menor o corte. E ele determina também a tarifa máxima: o coeficiente 28 representa alíquota industrial máxima de 28%.

Como os países ricos têm tarifa média de 5,9%, a redução cobrada dos ricos só pode ser alcançada com coeficiente bem abaixo de 8 ou 9, que Washington diz já ter dificuldade em aceitar. Os emergentes têm alíquota consolidada média de 28,5%, e a Índia sugere que façam um corte tarifário adaptado às flexibilidades. Assim, uma redução tarifária de 50% ou menor (coeficiente 33) não seria acompanhada por uma flexibilidade para excluir setores. Mas se os ricos querem corte por volta de 55% no Brasil (coeficiente 24), o país teria direito a cortar menos do que o concordado em 15% das alíquotas -- comparado aos 10% previstos no texto atual da OMC.

Essas cifras de flexibilidade adicional serão essenciais para um eventual acordo em Doha. Mas o Brasil, ontem, mostrava uma certa reticência sobre o texto indiano. É que Brasília tenta convencer, também nesta quarta-feira, o Uruguai e Paraguai a aceitarem uma proposta do Mercosul por mais espaço para proteger setores de uniões aduaneiras. Além disso, os brasileiros não queriam colocar um percentual de flexibilidade, pois ele pode limitar a barganha.

O Brasil tem insistido que suas dificuldades aumentam quando o coeficiente passa de 24 para 23. Essa é a fronteira, na qual o número de linhas tarifárias a serem cortadas pula de 3.403 (39% do total) para 4.920 (56%), atinge um grande número de alíquotas no setor de bens de capital e também começa a cortar a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul.

O comissário de Comércio da União Européia (UE), Peter Mandelson, reclamou que o Brasil "não está ajudando no êxito de Doha, com suas acusações de que as demandas dos EUA e da UE na área industrial são irracionais e não razoáveis".