Título: Trajetória semelhante
Autor: Freitas, Jorge
Fonte: Correio Braziliense, 22/01/2011, Economia, p. 16

A conjunção de chuvas e alta nas cotações internacionais de boa parte dos produtos agrícolas vai provocar um repique dos índices inflacionários, da mesma maneira como ocorreu no início de 2010

As chuvas que castigaram o país nos primeiros 20 dias do ano deram o ingrediente que faltava para a receita da inflação em 2011 repetir o desempenho visto no ano passado, quando chegou a quase 6%. Os primeiros efeitos notados na quinzena passada ¿ inicialmente atingindo produtos in natura ¿ devem se espalhar pela cadeia de produção agropecuária e desenhar uma trajetória semelhante à que ocorreu nos primeiros meses de 2010. Naquela ocasião, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) saltou de 0,37% para 0,75% em janeiro, também pressionado pelos problemas climáticos que encareceram os alimentos.

A tendência só se inverteu em maio, quando o indicador passou de 0,57% para 0,43%, antes de se estabilizar em junho. ¿Vamos ficar com aquela sensação de replay porque as chuvas deixam os produtos naturais caros. São os preços que sofrem mais e os que vão pesar sobre a inflação em janeiro e fevereiro, pelo menos. Depois, mesmo que eles diminuam, entram as commodities (minérios e itens agrícolas com cotação internacional)¿, avaliou Thiago Curado, analista da consultoria Tendências.

O movimento de valorização dos produtos agrícolas é puxado pela forte procura desses itens por parte dos países emergentes. ¿Os preços encarecem lá fora, ficam mais altos primeiro para o produtor e, em algum momento, serão sentidos no bolso do consumidor¿, considerou Curado. Para o analista, a aceleração das cotações e as chuvas formam uma combinação que vai fazer a inflação se comportar como em 2010. ¿Vai ser um ano ainda de pressões sobres os alimentos e a única forma de imaginarmos que a aceleração será menor é se não tivermos novos choques pontuais, ocasionados por quebras de safra. Mas isso não temos como prever. Só podemos torcer para que não ocorram¿, comentou.

Esperança Na visão de Orivaldo Brunini, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, ainda há alguma esperança de que o quadro seja mais favorável. ¿As chuvas afetam um pouco o manejo de determinadas culturas, o preparo do solo ou mesmo a fase de colheita de parte do milho. Mas isso pode ser revertido. Não é catastrófico¿, afirmou. Além das pressões em alimentos, os custos com tarifas administradas (eletricidade e transporte, por exemplo) e com serviços deverão engrossar o caldo inflacionário este ano.

¿Em 2010, ano de eleição, vários aumentos foram adiados. Só em janeiro, tivemos aumento de passagem de ônibus em quatro capitais, que depois vão ser repassados para os metrôs e ônibus intermunicipais¿, ressaltou Curado. Ele lembrou que outras tarifas, como aluguel, devem puxar a inflação para cima, já que serão reajustadas com base no Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), que teve alta de 11,32% em 2010. A procura por serviços fez os reajustes do segmento acumularem alta de 7,6% no ano passado. ¿Não há como importar cabeleireiros e outros profissionais, como é feito com produtos comercializáveis.¿