Título: Yeda queixa-se de discriminação política
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 22/11/2007, Política, p. A8

Yeda critica demora do governo federal em atender suas reivindicações: "O que eu ouvi muito, e é muito triste, é uma frase que vários repetiram e que ouvem de outros: aquela mulher não pode ter sucesso"

A governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), decidiu elevar o tom das críticas à demora do governo federal em apresentar medidas concretas para ajudar o Estado a enfrentar a crise das finanças públicas. Para ela, o tratamento dispensado pelo Ministério da Fazenda ao Palácio Piratini esconde o desejo de pelo menos alguns integrantes do PT de comprometer o desempenho de sua gestão e enfraquecê-la em uma eventual candidatura à reeleição em 2010.

"O que eu ouvi muito, e é muito triste, é uma frase que vários repetiram e que ouvem de outros: aquela mulher não pode ter sucesso", relatou a governadora. Ela disse ainda que na reunião que terá hoje às 11 horas, em Brasília, com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pedirá um "compromisso de respeito" do ministério - "que não é só o ministro" - com o Rio Grande do Sul. "Que não sejamos vistos como adversários para a eleição de 2010, embora até possamos ser".

O Ministério da Fazenda confirmou o encontro de hoje entre Mantega e a governadora, sem adiantar sobre como o governo federal poderá ajudar o estado a sair da profunda crise financeira que se encontra. Mantega assegurou que tem procurado ajudar o Rio Grande do Sul com mecanismos dentro da lei. O Tesouro Nacional, cujo titular, Arno Augustin é gaúcho e serviu a governos petistas no Estado, também optou por não abordar o assunto antecipadamente, evitando comentar quais propostas da governadora poderão ser aceitas. A governadora estará acompanhada dos senadores do Estado, Paulo Paim (PT), Sérgio Zambiasi (PTB) e Pedro Simon (PMDB), além do vice-líder do governo na Câmara, e também gaúcho, Henrique Fontana (PT). Entre as lideranças políticas, a expectativa é de que a governadora saia da Fazenda com alguma de suas reivindicações atendidas.

Depois que uma proposta de aumento de ICMS sobre vários produtos e serviços destinada a reduzir o déficit orçamentário de R$ 1,3 bilhão previsto para 2008 e encaminhar o reequilíbrio das finanças estaduais foi rejeitada na semana passada pela Assembléia Legislativa, inclusive com votos de deputados da própria base aliada, Brasília transformou-se na principal esperança de socorro ao Estado no curto prazo.

Os pedidos do Rio Grande do Sul incluem ressarcimentos por obras feitas pelo Estado em rodovias federais nos anos 80 e 90 e o aumento das compensações pela desoneração das exportações estabelecida ainda pela Lei Kandir. As negociações vêm desde o governo de Germano Rigotto (PMDB), antecessor de Yeda, mas até agora quase nada aconteceu.

O máximo que o Estado conseguiu neste ano foi um aval preliminar do Ministério da Fazenda para encaminhar uma carta-consulta ao Banco Mundial (Bird) destinada à negociação de um empréstimo de até US$ 1 bilhão para alongar o pagamento de parte da dívida pública consolidada, hoje superior a R$ 34,3 bilhões. "Espero que (o governo) não volte atrás nesta questão", afirmou a governadora. Todos esses temas estarão novamente na pauta do encontro de hoje entre Yeda e Mantega.

Só as obras em rodovias, segundo o governo gaúcho, significam cerca de R$ 1,8 bilhão ao Estado e a liberação de parte deste dinheiro permitiria o pagamento do 13º salário dos servidores sem necessidade de novo empréstimo do Banrisul. Desde o início do ano o secretário da fazenda, Aod Cunha de Moraes Júnior, vem pleiteando o crédito, mas em setembro o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, disse que não havia previsão de repasse dos recursos.

A governadora também tem insistido que o Rio Grande do Sul, devido ao perfil exportador da economia local, é o mais prejudicado pelos critérios de compensação das desonerações das vendas externas. Ela calcula que o Estado receberá no máximo R$ 600 milhões do governo federal neste ano e que o valor deveria pelo menos dobrar em 2008, embora as perdas anuais, em relação ao que arrecadaria com a tributação sobre as exportações, já alcançariam hoje R$ 2 bilhões.

Um dos argumentos usados por Brasília para negar o aumento da compensação pela desoneração e também o ressarcimento pelas obras em rodovias federais, segundo Yeda, é o fato de que outros Estados exigiriam tratamento semelhante da União. "Mas não cometa uma injustiça contra mim porque a negociação com os outros Estados é difícil", afirmou.

A falta de retribuição do Planalto à defesa que a governadora tem feito da prorrogação da CPMF, mesmo que sob a condição de que haja a distribuição de alguma parcela para os Estados, e da aprovação da reforma tributária nos moldes que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende encaminhar ao Congresso, também é lembrada. "Infelizmente Brasília nos isola", disse. "Ou somos poder lá ou não vem retribuição".

A governadora disse que tem conversado com os três senadores gaúchos sobre a CPMF e que dois deles, Paulo Paim (PT) e Sérgio Zambiasi (PTB), votarão a favor da prorrogação da contribuição, ainda que com algumas mudanças. Já o peemedebista Pedro Simon, que a pedido dela poderia seguir o mesmo caminho, mudou de idéia devido à falta de apoio do governo federal ao Estado, disse.

No fim da tarde de ontem, ela também conversou com o governador de São Paulo, José Serra, no Palácio dos Bandeirantes, para "afinar" o discurso dos governadores do PSDB a respeito da CPMF. "Não podemos ter divergências para fins de orientação dos senadores do partido", comentou. De acordo com ela, a contribuição deve ser utilizada de forma "transparente e não para financiar qualquer projeto político".

Quanto à reforma tributária, Yeda declarou-se "defensora de primeira hora" da criação de dois IVAs, um estadual, em substituição ao ICMS, e outro federal, unificando PIS/Pasep, Cide e Cofins, como deve propor o governo federal. A medida, no entendimento dela, é o caminho para eliminar a guerra fiscal no país mas a única ressalva é a manutenção de alguma tributação na origem nas transações interestaduais, em nome da "autonomia" e da infra-estrutura que os Estados detêm e precisam administrar dentro dos seus territórios.

Embora evite se posicionar entre Serra e o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, como o melhor nome do PSDB para concorrer em 2010, Yeda defendeu o acordo interno como a melhor saída. Para ela, a realização de prévias pode "machucar" mais o partido, que precisa chegar unido à próxima eleição presidencial.

"Precisamos trabalhar no acordo desde agora", propôs a governadora. Mesmo assim, ela acredita que seria um erro definir o candidato neste momento porque a escolha será resultado do "processo" político dos próximos anos. "Vamos ter que nos confrontar com situações como a proposta de um terceiro mandato (para o presidente Lula) e teremos que manter o partido unido para não se deixar contaminar pela agenda alheia". (Colaborou Claudia Safatle, de Brasília)