Título: Contribuição da União para superávit diminui
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2007, Brasil, p. A4

A contribuição relativa da União para o superávit primário do setor público está em queda neste ano, ao mesmo tempo em que cresce a importância da dos Estados. De janeiro a agosto de 2007, a União respondeu por 59,8% da economia para pagar os juros da dívida, abaixo dos 64,7% registrados no mesmo período do ano passado. A contribuição dos governos estaduais, por sua vez, aumentou de 16% para 24,8%. Segundo analistas, o forte aumento das despesas do governo federal ajuda a explicar o menor esforço fiscal da União. No caso dos Estados, os especialistas em contas públicas apontam a troca de guarda em vários governos como uma das explicações para o aumento da economia, num cenário em que vários deles tomaram medidas severas de aperto fiscal.

De janeiro a agosto, o superávit primário do setor público (que inclui União, Estados, municípios e estatais) foi equivalente a 5,31% do Produto Interno Bruto (PIB), dos quais 3,18% do PIB foram de responsabilidade da União e 1,32% do PIB dos Estados. Nos oito primeiros meses de 2006, a economia para pagar os juros atingiu 5,05% do PIB, com a contribuição de 3,28% do PIB da União e de 0,81% do PIB dos Estados.

O economista Cristiano Souza, do ABN AMRO, aponta a expansão dos gastos do governo como a principal explicação para a ligeira redução do superávit primário da União neste ano. De janeiro a agosto, todas as despesas cresceram bem acima da variação do PIB - os gastos com pessoal, aumentaram 13,52%, enquanto a conta com aposentadorias cresceu 11,75%. A alta foi ainda maior, de 15,48%, na rubrica custeio e capital, que inclui despesas com a manutenção da máquina pública e com investimentos. "O crescimento dos gastos neste ano é generalizado", diz Souza. Como a arrecadação continua a aumentar a um ritmo significativo, o superávit primário - que mede a diferença entre receitas e despesas, sem contar gastos com juros - se mantém num nível confortável.

O analista Denis Blum, da Tendências Consultoria Integrada, também atribui à forte expansão de gastos a leve queda do superávit primário da União neste ano. Ele nota que o saldo acumulado em 12 meses também está em baixa. Em agosto, ficou em 2,22% do PIB, abaixo dos 2,56% do PIB de janeiro, por exemplo.

O cenário é bem diferente no caso dos Estados, que mostram superávit fiscal bastante expressivo nos oito primeiros meses do ano. Para Souza, o aumento da economia para pagar juros reflete em parte as trocas de governador que ocorreram em várias das unidades da federação. No começo da administração, é comum os novos governantes renegociarem contratos com fornecedores e prestadores de serviços, mesmo se não encontraram o cenário fiscal em situação de penúria.

É o que fez o governador José Serra (PSDB) em São Paulo, por exemplo. Além disso, Estados importantes adotam um programa rigoroso de ajuste fiscal, como o Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, nota Blum. Segundo o economista, quando há mudança de comando, em geral há uma reavaliação de prioridades, o que se traduz em gastos um pouco menores.

Outro ponto importante é que a arrecadação estadual também aumenta com força, devido ao crescimento expressivo da atividade econômica. De janeiro a agosto, a receita tributária de São Paulo cresceu 12,4% acima da inflação. Com a explosão de receitas e alguma contenção de despesas, não é difícil entender o salto do superávit primário dos Estados registrado neste ano.

A economista Beatriz Meirelles nota ainda que os Estados e município estão sujeitos a controles dos níveis de endividamento. Eles têm de respeitar limites definidos na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para a relação entre a dívida e a receita e entre a folha de pagamento e a receita. Os limites de endividamento da União nunca foram regulamentados, nota ela.

As estatais, por sua vez, mostram queda no superávit neste ano, quando comparado com o resultado de 2006. A piora se deve ao menor esforço fiscal feito pelas empresas controladas pelos Estados. De janeiro a agosto de 2007, o saldo primário das estatais estaduais ficou em 0,08% do PIB, abaixo dos 0,34% do PIB registrados no mesmo período de 2006. Segundo Souza, o resultado de 2006 foi inflado por uma emissão de ações da Cesp realizada em agosto passado, que engordou o caixa da empresa. No caso das estatais federais, influenciadas fortemente pelo desempenho da Petrobras e da Eletrobrás, houve aumento da economia para pagar juros de 0,49% para 0,858% do PIB.

Nos 12 meses até agosto, o superávit primário acumulado é de 4,14% do PIB, bem acima da meta prevista para este ano, de 3,8% do PIB. A Tendências estima que a economia para pagar juros deve ficar em 3,9% do PIB neste ano. O governo aumentou os gastos totais com investimentos neste ano, mas as despesas com as obras do Projeto Piloto de Investimento (PPI), que poderiam ser abatidas do cálculo do superávit primário, andam devagar. De janeiro a agosto, as despesas com os projetos do PPI atingiram R$ 2,2 bilhões, 19,4% dos R$ 11,3 bilhões previstos para 2007. No total, o governo gastou R$ 11,184 bilhões com investimentos nos oito primeiros meses do ano. É 35% a mais do que o registrado no mesmo período de 2006, mas equivalente a apenas 4% das despesas não-financeiras da União.