Título: Inflação e dólar permitem mais uma redução de 0,25 ponto da Selic
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2007, Finanças, p. C2

Os sete membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central sentam-se à mesa de reuniões amanhã sob o impacto de duas variáveis capazes de forçar o prolongamento, pelo menos por mais 45 dias, do ciclo de redução da taxa Selic iniciado em setembro de 2005. Foram elas o IPCA de 0,18% registrado no mês passado, bem abaixo da expectativa mediana de 0,24% - e que fez a expectativa de inflação acumulada no ano recuar de 4% para 3,9% -, e o mergulho do dólar para o piso psicológico de R$ 1,80. Dos 19 analistas consultores pelo Valor na quinta-feira 13 acreditam que o Copom irá, nesta penúltima reunião do ano, cujo resultado será revelado na noite de quarta-feira, reduzir a Selic em 0,25 ponto, de 11,25% para 11%. Será o 19º corte em sequência. Ao contrário da reunião passada, não se espera, porém, uma unanimidade. O placar em favor do corte será algo como 5 a 2 ou 4 a 3. "Não será uma decisão fácil, tanto que a minha probabilidade é de 60% para o corte", diz Carlos Cintra, do Banco Prosper.

O economista-chefe da Gradual Corretora, Pedro Paulo B. da Silveira, acredita que o Copom não tem outra opção a não ser continuar reduzindo a Selic e testando patamares cada vez mais baixos de juros reais. Na sua visão, diante do cenário de liquidez mundial elevada, o juro básico terá de encerrar 2008 perto de 8% para que a taxa real se situe no nível internacional e dissuada operações de arbitragem. "Com a chegada do grau de investimento, se o BC não cortar a taxa irá gerar uma arbitragem gigantesca capaz de derrubar ainda mais o dólar. E o combate à inflação não precisa de uma taxa de câmbio mais apreciada ainda", diz Silveira. A moeda americana fechou quinta-feira cotada a R$ 1,8070. Desde o último Copom, em 5 de setembro, já caiu 8,18%.

Como a tendência é de o Federal Reserve (Fed) reduzir o juro americano de 4,75% para 4,50% no dia 31 de outubro, se o Copom não cortar agora a Selic, o diferencial de taxa irá se alargar ainda mais, atraindo carga adicional de capitais externos. O diretor da NGO Câmbio, Sidnei Moura Nehme, já detecta o reaquecimento do iene carry -trade, operação responsável até a deflagração da crise pela maior parte da apreciação cambial. "Não precisamos ter de volta toda aquela especulação do passado. Só o fluxo já é suficiente para desvalorizar o dólar", diz Nehme.

O IPCA de setembro desmontou a argumentação, escorada na percepção de que já se está sob a maligna influência de uma perigosa inflação de demanda, da ala de mercado que bradava pela suspensão imediata do afrouxamento monetário. Adriano Fontes Alves dos Santos, gestor da Mercatto Investimentos, lembra que o IPCA de agosto (alta de 0,47%) assustou o BC e o mercado. O de setembro mostrou que foi um repique fora da curva: houve forte queda no índice de difusão, de 63,50% para 56,80%; forte queda dos núcleos em suas diversas medidas; e o núcleo de serviços acumulou em 12 meses alta de 4,79%, o mais baixo desde dezembro de 2004. "Como pode estar acontecendo inflação de demanda, como muitos analistas vêm defendendo, se o acumulado de 12 meses da inflação de serviços, que foi o motivo de preocupação do BC no Relatório de Inflação, atingiu o seu valor mínimo?", pergunta o economista.

Passado o repique pontual gerado pela alta dos alimentos, já se observa um processo de recuo nos índices de preço, ocasionado pela queda deste item, observa o economista-chefe da Lopes Filho, Julio Hegedus Netto. A inflação, sobretudo depois da nova rodada recente de apreciação cambial, não inquieta. E o nível da capacidade instalada da indústria, embora num patamar alto, vem se mantendo estável em função do incremento dos investimentos. Se o Copom for interromper a queda no juro, o fará somente no fim do ano, uma vez que a diferença de velocidade de resposta da demanda em expansão e dos investimentos para ampliar a capacidade produtiva pode desencadear o risco de inflação de demanda.

Para Paulo Gurgel Valente, diretor da Profit Consultoria, se o BC estabilizar a taxa agora poderá sancionar a "expectativa de aumento da inflação, que por si já tem um efeito de auto-alimentação que deveria ser evitado". No seu entender, não há sinais de superaquecimento da economia. "Há dados contraditórios o sobre o aquecimento da economia, não havendo consenso sobre qualquer exagero. Dados recentes de supermercados e indústria automobilística confirmariam o momento moderado", diz Valente.

Mais do que a ata do último Copom, o Relatório de Inflação referente ao terceiro trimestre do ano se esmerou em preparar o mercado para a interrupção do ciclo de quedas. Mas, na visão do diretor da Modal Asset, Alexandre Póvoa, talvez o BC seja obrigado a adiar os seus planos. A queda do dólar e a perda de gás da inflação corrente ampliam enormemente a chance de mais um corte de 0,25 ponto. Mas depois o Copom pára, de qualquer jeito, uma vez que prevalece o cenário de forte demanda mundial por alimentos e fim da exportação de deflação pela China.

Para Marcelo Ribeiro, economista-chefe da Pentágono Asset, a normalização dos mercados externos, mesmo que temporária, abriu uma janela de oportunidade para mais cortes da Selic. Apesar da demanda interna aquecida, o dólar, pressionado para baixo pela volta da liquidez global, rechaçará tentativas de elevação de preços.

Roberto Padovani, estrategista de investimentos sênior para a América Latina do Banco WestLB, traça um cenário positivo para a inflação. A taxa anual mudou de patamar, do choque positivo de 3% no ano passado para 4% este ano, ainda um patamar muito confortável. Mas como o BC vem dando crescentes sinais de desconforto com as incertezas associadas aos cenários, tanto por ser difícil mensurar se os fluxos de investimentos serão suficientes para fazer frente ao ritmo de expansão do consumo doméstico quanto por não querer antecipar um cenário no qual o setor externo continue contribuindo favoravelmente para o balanço de riscos de inflação, o mais provável é que faça um pausa no declínio da Selic. Até porque, para o BC, isso não vai custar quase nada. "Há poucos custos econômicos em uma eventual manutenção da Selic neste momento: o crescimento não irá perder fôlego e, ao mesmo tempo, a autoridade monetária poderá ter mais informações para, futuramente, continuar o processo de redução do juro", diz.