Título: Governo investiga esquema de fraude na importação de equipamentos
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2007, Brasil, p. A2

O governo anunciou ontem a desmontagem de um bilionário esquema de sonegação em importações que envolve várias empresas. Entre as companhias investigadas pela Receita Federal está a Cisco do Brasil, controlada pela gigante americana Cisco Systems, que atua no mercado de redes de telecomunicação corporativa. As autoridades estimaram que, nos últimos cinco anos, houve sonegação de aproximadamente R$ 1,5 bilhão na entrada fraudulenta de produtos estrangeiros calculados em US$ 500 milhões.

Como os mandados de prisão e apreensão foram expedidos pela Justiça em processos sigilosos, o nome da multinacional e das outras empresas não foi divulgado oficialmente. Fontes do Ministério da Fazenda, contudo, confirmaram que a Cisco está entre as companhias investigadas. Na divulgação dos resultados do quarto trimestre fiscal, encerrado em 28 de julho, o lucro líquido da Cisco Systems foi de US$ 1,93 bilhão, contra US$ 1,54 bilhão do mesmo período do ano fiscal passado.

Por meio da assessoria de imprensa, a direção da Cisco do Brasil limitou-se a informar que " está colaborando com as investigações " , mas não confirmou que o presidente da empresa no país, Pedro Ripper, estaria entre os 40 presos na Operação Persona.

O balanço da Operação Persona, divulgado ontem por representantes da Receita Federal, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, informou que 40 pessoas foram presas em Campinas, Ilhéus, Rio, Salvador, São Paulo e Santos. Nesse grupo estão diretores e o presidente da Cisco do Brasil e seis auditores fiscais, segundo o governo. Ainda de acordo com esse balanço, um escritório de advocacia especializado em direito internacional e financeiro, com sede no Panamá, criava e administrava empresas de fachada localizadas nos paraísos fiscais das Bahamas, Ilhas Virgens Britânicas e Panamá. Os dirigentes dessas empresas eram " laranjas " , pessoas que emprestam seus nomes e não têm patrimônio.

Além das prisões, as diligências apreenderam dinheiro (US$ 290 mil e R$ 240 mil), mercadorias avaliadas em US$ 10 milhões, um jato executivo e 18 veículos.

O coordenador-geral de Pesquisa e Investigação da Receita, Gerson Schaan, explicou que o esquema usava uma rede de empresas fictícias para ocultar os reais beneficiados na importação do produtos da empresa que liderava o esquema. Com a sonegação, os bens eram vendidos pelo mesmo preço cobrado no exterior. Dessa maneira, os softwares eram superfaturados e os equipamentos das redes de telecomunicação corporativa eram subfaturados em até 70%. O plano era esse porque não há incidência de imposto de importação sobre softwares e a alíquota média sobre esse tipo de equipamento é de 10%. Além disso, as notas fiscais indicavam a passagem das mercadorias pelo pólo de informática de Ilhéus, mas elas eram despachadas dos EUA para São Paulo.

As investigações basearam-se em quebras de sigilo telefônico e bancário e foram iniciadas há dois anos a partir de informações de uma pessoa que trabalhou em uma das empresas envolvidas. Além de tributos federais (imposto de importação e IPI), também houve sonegação de ICMS. As autoridades americanas foram informadas sobre o interesse na prisão de cinco brasileiros que moram naquele país. Segundo a delegada da Polícia Federal, Erika Tatiana Nogueira, grandes empresas instaladas no Brasil compraram esses bens fabricados sob encomenda nos Estados Unidos, mas ainda não ficou provado que elas sabiam das fraudes nas importações.

Schaan ainda comentou que parte das empresas flagradas na Operação Persona em Ilhéus foram investigadas na Operação Dilúvio que, em agosto de 2006, desvendou outro grande esquema de sonegação no comércio exterior.

O ministro da Justiça em exercício, Luiz Paulo Barreto, afirmou que reduzir a concorrência desleal é mais importante que prender pessoas. " Desmantelamos um esquema poderoso de importação irregular " , disse. Apesar de 40 terem sido presos na madrugada de ontem, a Justiça determinou a prisão temporária de 44 acusados.