Título: Lula chama países pobres para uma aliança com o G-20
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2007, Brasil, p. A4

Eduardo Knapp/Folha Imagem Lula em Brazzaville: ricos devem parar de tratar pobres como pedintes Na visita de apenas um dia à República do Congo, segunda parada da sua sétima viagem ao continente africano desde 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva conclamou os países mais pobres, como os da África subsariana, a se unirem ao G-20, grupo de países em desenvolvimento, no esforço para conseguir um desfecho favorável nas negociações multilaterais da Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). "Estamos propondo que os ricos parem de tratar os mais pobres como se eles fosse pedintes", afirmou Lula.

Lula fez a declaração ao responder a uma pergunta de um jornalista congolês sobre como enfrentar a "intransigência" dos países industrializados nas negociações da rodada. Doha será o principal tema da reunião de cúpula que Lula terá hoje em Pretória, capital da África do Sul, com líderes sul-africanos e da Índia. Os três países compõem o Ibas (iniciais de Índia, Brasil e África do Sul), um fórum de cooperação que surgiu como uma das primeiras iniciativas da política externa do governo Lula, que desembarcou ontem na África do Sul após a visita ao Congo.

Na entrevista conjunta com o presidente do Congo, Denis Sassou-Nguesso, Lula mostrou-se cético com a postura americana na Rodada Doha. "Os nossos amigos americanos nos últimos dois anos concederam subsídios (aos agricultores) de US$ 11 bilhões. Agora estão propondo de US$ 13 bilhões a US$ 16 bilhões com a perspectiva de ficarem nos US$ 16 bilhões", disse o presidente brasileiro tentando demonstrar a falta de boa vontade dos Estados Unidos.

Os americanos e os europeus pressionam para que o Brasil ajude a convencer a Índia, na reunião de hoje, a aceitar cortes nas tarifas de produtos industriais, de acordo com o texto que está na mesa de negociações na OMC. Isso significa aceitar cortes entre 55% e 60% e ter flexibilidade para cortar menos em 10% das alíquotas. Brasil, Índia e África do Sul dão sinais de irem no caminho contrário, com cortes menores de tarifas e aumento no número de setores indústriais sensíveis na Rodada de Doha.

Nesta viagem, Lula vem procurando angariar o apoio dos países pobres da África para a posição do G-20, tendo obtido sucesso, na segunda-feira, em Burkina Fasso, e ontem, no Congo. Criado em 2003, na preparação da 5ª conferência ministerial da OMC, em Cancún, no México, o G-20 reúne 23 países em desenvolvimento, sob a liderança do Brasil. O grupo concentra sua atuação em agricultura, principal tema para os países emergentes na atual rodada de negociações da OMC.

Segundo Lula, a flexibilidade na área industrial não pode atrapalhar o desenvolvimento dos países mais pobres: "Os países em desenvolvimento não podem abrir mão de ter política industrial", afirmou. Na busca de alianças com países africanos na OMC, Lula tem trunfos importantes. Um deles foi a ratificação da vitória brasileira no contencioso com os Estados Unidos sobre os subsídios ao algodão.

Mais até do que ao Brasil, esta vitória interessa a um grupo de países africanos integrados por Burkina Fasso, maior produtor de algodão do continente, Mali, Chade e Benin.

Lula cumpriu extensa agenda em Brazzaville onde ficou pouco mais de meio dia. Houve uma rodada de negócios entre empresários brasileiros e congoleses. Partiu depois para Johannesburgo, na África do Sul, levando na mala mais um apoio africano na cruzada por uma vaga permanente do Brasil no conselho de segurança da ONU. Em troca, prometeu ajudar o Congo nas negociações com a dívida do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Lula criticou o domínio europeu e norte-americano sobre as instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial.