Título: FMI cobra transparência dos bancos
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2007, Finanças, p. C12

O Fundo Monetário Internacional (FMI) cobrou ontem mais transparência dos bancos e advertiu que o risco de novos tremores nos mercados financeiros continuará ameaçando a economia global enquanto não houver mais clareza sobre os arriscados investimentos feitos pelas instituições financeiras nos últimos anos e prejuízos que eles provocaram.

"Se houver mais informação, isso ajudará muito a aliviar a incerteza nos mercados", afirmou o diretor do departamento do Fundo que monitora os mercados de capitais, Jaime Caruana. "Mesmo se houver prejuízos, quando você os declara abertamente, as más notícias são bem melhores do que a incerteza."

Caruana considerou positiva a iniciativa patrocinada pelo Citigroup, que nesta semana anunciou com o JP Morgan Chase e o Bank of America a criação de um superfundo para injetar liquidez nos mercados mais contaminados pela crise no setor imobiliário americano. Mas indicou que o FMI ainda tem muitas dúvidas sobre as possibilidades de sucesso do novo fundo.

O plano foi desenhado pelos bancos após discussões com o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. O novo fundo compraria títulos que estão apodrecendo nas carteiras de fundos conhecidos como veículos de investimentos estruturados (SIVs, na sigla em inglês), patrocinados por grandes bancos nos últimos anos para fazer apostas arriscadas sem comprometer diretamente os ativos dos bancos.

Os SIVs emitiram títulos de curto prazo para se financiar e usaram o dinheiro para comprar papéis lastreados em hipotecas e outros investimentos que ofereciam altos rendimentos. A inadimplência no mercado imobiliário dos EUA e a contração de crédito iniciada em agosto atingiram em cheio esses fundos, que não conseguem mais se financiar e acumulam prejuízos.

Um dos objetivos do superfundo lançado nesta semana é evitar que bancos sejam forçados a absorver essas perdas em seus balanços, o que poderia reduzir ainda mais a oferta de crédito na praça e afetar outros investidores. Quem mais problemas tem nessa área é o Citigroup, com US$ 80 bilhões empatados em fundos desse tipo.

Há dúvidas sobre o interesse que o novo superfundo despertará nos investidores e sua capacidade de eliminar as desconfianças do mercado. "Toda iniciativa do setor privado para diminuir a tensão dos mercados é bem vinda, mas ainda precisamos conhecer os detalhes para avaliar direito", disse Caruana.

Nas últimas semanas, o Citigroup e outros gigantes financeiros como o banco de investimentos Merrill Lynch e o suíço UBS tiveram que reconhecer publicamente bilhões de dólares em prejuízos causados pela farra das hipotecas no mercado americano e outros investimentos descuidados, o que reduziu de forma significativa os lucros esperados pelos seus acionistas.

De forma geral, a divulgação das perdas tem sido bem recebida pelos investidores. As dúvidas sobre o grau de exposição das principais instituições financeiras a problemas de crédito que vieram à tona nos últimos meses contribuíram bastante para a instabilidade dos mercados. Mas os bancos temem os efeitos que a maior transparência teria em suas reputações. A idéia de que ainda há problemas ocultos no sistema deixa investidores bem incomodados.

"Há entre os bancos um maior entendimento da necessidade de transparência", afirmou Peter Dattels, chefe da divisão do FMI que tem promovido discussões sobre a crise com bancos e investidores. Segundo ele, a questão para as instituições é encontrar a melhor maneira e a hora mais adequada para dar as más notícias a acionistas e investidores.

Em seu relatório semestral sobre a estabilidade do sistema financeiro internacional, publicado há três semanas, o FMI diz que as inovações introduzidas por bancos e fundos de investimento nos últimos anos ajudaram a diluir riscos e ampliar a oferta de crédito, mas ao mesmo tempo estimularam excessos como os que geraram danos no setor imobiliário.

Na avaliação do Fundo, os modelos usados pelos bancos para avaliar os vários tipos de risco com os quais as instituições financeiras convivem se revelaram defeituosos e um fator importante por trás da turbulência que atingiu os mercados em agosto. Para o FMI, esses modelos incentivam apostas arriscadas quando tudo vai bem e provocam pânico quando as condições do mercado mudam.