Título: Rato acha modelo brasileiro arriscado
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 18/10/2007, Finanças, p. C12

A crescente integração dos mercados financeiros tornou mais arriscadas estratégias como a que o Brasil escolheu para aliviar pressões geradas pelos gigantescos fluxos de capital externo que vem recebendo, disse ao Valor o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Rodrigo de Rato.

"Os métodos tradicionais usados para lidar com fluxos de capital estão se tornando cada vez mais desafiadores com o crescimento e a sofisticação dos mercados financeiros", afirmou, numa entrevista em seu amplo gabinete na sede da organização. "Não há mais fórmulas mágicas para administrar isso."

O Brasil tem acumulado reservas internacionais nos últimos anos, num esforço para reduzir a vulnerabilidade da economia a choques externos e evitar a valorização excessiva do real, mas a moeda nacional continua se fortalecendo. Isso tem prejudicado indústrias exportadoras ao torná-las menos competitivas.

Mas essa política implica riscos também. "A acumulação de reservas tem um limite de eficiência", observou Rato. "Reservas não são de graça e existe um custo que você precisa financiar." O Brasil tem hoje US$ 162 bilhões em reservas, suficientes para pagar a dívida externa do governo e grande parte dos compromissos do setor privado.

Apesar das queixas, a valorização do real também traz benefícios para a economia, como lembrou Rato. "Ela não é indesejável, porque permite acomodar melhor as pressões inflacionárias e torna o país mais atraente para os investidores estrangeiros", afirmou.

Outra maneira de lidar com a pressão sobre a moeda seria dar continuidade ao processo de redução das taxas de juros, disse Rato, que conversou com o Valor antes que o Banco Central anunciasse sua decisão de interromper esse processo. "A redução das taxas de juros poderia ajudar, mas isso exige uma diminuição das pressões inflacionárias", afirmou o diretor do FMI.

O Fundo deu grande atenção nas últimas semanas para o impacto dos crescentes fluxos de capital externo sobre os países emergentes, com a publicação de relatório que levanta dúvidas sobre a eficácia de estratégias como a seguida pelo Brasil.

O FMI calcula que o fluxo de capital externo para países emergentes alcançará neste ano quase US$ 500 bilhões. É mais que o dobro do volume verificado em 2006. O fluxo atual é mais intenso que o observado no início da década de 90, antes da crise asiática de 1997-98.

Na avaliação do FMI, a melhor maneira de lidar com as pressões geradas por esses fluxos é apertar mais os gastos do governo. O Brasil tem feito o contrário, e os funcionários do Fundo que monitoram a economia brasileira têm manifestado repetidamente preocupação com o aumento do gasto público.

"O Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer na área fiscal", disse o diretor-adjunto do departamento de pesquisa do FMI, Charles Collyns. Apesar da manutenção de superávits fiscais elevados e da redução do endividamento do setor público, o governo ainda gasta mais do que arrecada e tem orçamento rígido demais, disse.

Rato, que deixará o cargo no fim do mês e será substituído pelo francês Dominique Strauss-Khan, disse que o êxito obtido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na gestão da economia brasileira foi uma das surpresas positivas em sua gestão no Fundo. O Brasil pagou em 2005 sua dívida com a instituição.

"O país foi corajoso ao manter políticas econômicas prudentes num momento difícil e seu esforço foi recompensado agora, quando recebeu várias demonstrações de confiança dos investidores em meio à turbulência dos mercados", afirmou. "Um aumento nos investimentos públicos e privados e um aprofundamento das reformas na área fiscal criariam condições agora para ampliar o potencial de crescimento da economia brasileira e torná-la mais dinâmica."