Título: Atrás de commodities, países reivindicam áreas da Antártida
Autor: Uchoa, Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2007, Internacional, p. A14

A sede por petróleo e minérios vêm levando os países a tentar garantir acesso privilegiado aos dois extremos do planeta, mesmo que atualmente convenções internacionais protejam os pólos.

Em agosto, uma expedição russa cercada de muita publicidade fincou uma bandeira do país de titânio inoxidável a 4.261 metros de profundidade, sob o Pólo Norte, e virtualmente tornou pública uma corrida por soberania que já vinha latente pela região, envolvendo Canadá e Noruega, entre outros.

Agora o foco se volta para o sul: o Reino Unido está preparando uma série de reivindicações territoriais sobre a Antártida, que devem ser apresentadas até maio de 2009, data-limite imposta pela ONU para pleitos sobre a área. Os britânicos devem reclamar cerca de 1 milhão de quilômetros quadrados de leito oceânico, numa região em que há alta probabilidade de existência de petróleo.

A Argentina disse que pretende reivindicar a plataforma submarina em torno das ilhas Malvinas (Falklands, para os britânicos), enquanto o Chile anunciou que também fará novas reivindicações. "Ainda temos tempo, mas estamos trabalhando com as instituições que têm de estar envolvidas nessas questões territoriais, como as Forças Armadas, cientistas, especialistas, assessores jurídicos etc. Estamos dentro do prazo", disse ontem o chanceler chileno, Alejandro Foxley.

É uma situação delicada, pois as reivindicações desses três países têm extensas áreas comuns. O modo como cada um defende suas aspirações é que cria a controvérsia, pois, para delimitar a área que considera sua, o país traça uma linha do ponto mais ocidental e outra do ponto mais oriental de seu território projetando-a até o Pólo Sul. O problema é que a Argentina, por exemplo, diz que seu ponto mais oriental fica em ilhas que hoje são administradas pelos britânicos - e esses, por sua vez, as contam para a sua pretensão territorial.

Sete países (Argentina, Austrália, Chile, França, Noruega, Nova Zelândia e Reino Unido) têm reivindicações sobre áreas da Antártida. Essas reivindicações não são reconhecidas, e o continente é na prática administrado pelos 45 países signatários do Tratado da Antártida, entre eles o Brasil.

Hoje, uma convenção internacional proíbe qualquer exploração de petróleo, gás ou minério na Antártida. Os países, entretanto, tomam iniciativas como forma de salvaguardar direitos para o caso de a convenção ser revista.

Organizações não-governamentais alertam que essa nova corrida pretende levar a um fato consumado: os territórios seriam reconhecidos e, depois, ficaria mas fácil revisar os acordos. "É absurdo [o Reino Unido] lançar essa nova corrida por petróleo do outro lado do mundo, quando deveria estar liderando o movimento mundial pela diminuição dos gases-estufa", disse Charles Kronick, do Greenpeace. A organização qualificou a pretensão britânica de "colossalmente irresponsável" e diz temer a piora da situação ambiental.

Segundo um trabalho do glaciólogo Jorge Arigony-Neto, pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), de 2001 a 2005 um grupo de 30 geleiras da península Antártida chegou a perder 4 mil metros quadrados de área por ano.

O governo brasileiro também se diz preocupado.

O oceanógrafo brasileiro Renato Capelini afirma que a cobiça dos países vem sendo alimentada pela comprovação de jazidas riquíssimas na região e na plataforma marítima que a circunda. Urânio, manganês, carvão e ferro já foram identificados. A existência de petróleo, por enquanto, ainda é só provável - mas de alta probabilidade, segundo ele.

(Com agências internacionais)