Título: Ex-governadores fazem farra com dinheiro público
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Fonte: Correio Braziliense, 24/01/2011, Opinião, p. 14

Visão do Correio

"O Brasil não perde oportunidade de perder oportunidade", costumava repetir Roberto Campos. O embaixador talvez repensasse a frase se tomasse conhecimento da movimentação de ex-governadores em busca de aposentadoria indevida. A corrida vai de norte a sul do país.

Quem se sentou na cadeira do palácio estadual - seja por que tempo for - sente-se no direito de assegurar pensão vitalícia pelo exercício do cargo. As viúvas não foram esquecidas. Usufruem o privilégio. Ex-mulheres também abocanham o dinheiro público.

Há casos estarrecedores. Por estarem na linha sucessória, recebem vultosas somas mensais presidentes de assembleias legislativas que assumiram o Executivo interinamente na ausência, por dias, do governador e do vice. Pedro Pedrossian acumula duas aposentadorias. A razão: governou Mato Grosso antes da divisão do estado. Hoje figura na folha de pagamento de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Mais: Álvaro Dias solicitou salários retroativos por ter ocupado o Palácio Iguaçu entre 1987 e 1991.

A farra causa mais indignação quando se sabe que é inconstitucional. A Carta Magna de 1988 acabou com as aposentadorias vitalícias de ex-governadores. Em 2007, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a norma. Acabou com o privilégio usufruído pelo ex-governador de Mato Grosso do Sul Zeca do PT.

Mas a decisão não foi suficiente para inibir novos avanços no erário. Legislativos estaduais, com conivência de outros poderes, fecham os olhos para a Carta e aprovam as leis escandalosas. Mais de 60 ex-governadores Brasil afora recebem os benefícios auferidos com jeitinhos bem ao gosto de políticos nacionais.

Cabe ao Ministério Público ajuizar ações no Supremo Tribunal Federal para que a Constituição seja respeitada. Em outras palavras: ordenar a imediata suspensão das aposentadorias. Quanto às assembleias legislativas, a decisão do STF deve conter explícita responsabilidade das mesas diretoras caso venham a admitir o trânsito e eventual aprovação de benefícios da espécie.

O ideal seria que, além de providências para evitar novas incursões insidiosas, fossem cassados outros benefícios à margem da lei concedidos a funcionários públicos que agregam vantagens acima do teto estabelecido. Vale lembrar que uma das garantias fundamentais da Carta Magna se revela na resistência a qualquer tipo de favorecimento que atenta o princípio da moralidade pública.