Título: Biotecnologia ainda engatinha no país
Autor: Rosa, João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2007, Empresa, p. B3

A maioria das companhias brasileiras de biotecnologia é extremamente jovem, tem a estrutura típica de uma pequena ou microempresa - o que significa poucos funcionários e faturamento restrito, abaixo de R$ 1 milhão - e está concentrada na região Sudeste. Uma boa parte delas, o equivalente a 35,21% do total, está sob o guarda-chuva de uma incubadora de negócios.

É este, em resumo, o cenário traçado por um amplo estudo que será divulgado hoje, em Belo Horizonte, pela Fundação Biominas, uma entidade privada sem fins lucrativos. O trabalho preenche uma lacuna no setor de tecnologia: até agora, pouco ou quase nada se sabia sobre essas empresas no país, incluindo o número de negócios existente.

De acordo com o levantamento, há 71 companhias de biotecnologia no Brasil. A maioria delas (22,5%) está voltada para aplicações na agricultura, uma área que é seguida de perto pela criação de insumos (21,1%), como enzimas e reagentes usadas na produção de outras substâncias.

O número de companhias está dentro das expectativas, diz Eduardo Emrich Soares, diretor presidente da Fundação Biominas. "Em geral, atribuiu-se um total de 1,8 mil a 1,9 mil empresas de biotecnologia na Europa e de igual número nos Estados Unidos. No Brasil, em comparação com esse quadro, o resultado não surpreende", afirma o executivo.

Um estudo publicado pela revista Nature Biotechnology no ano passado, com base em dados de 2004, mostrava que havia 51 empresas na Bélgica e 34 na Noruega - ambos os números inferiores ao brasileiro. Os especialistas da Fundação evitam, porém, fazer uma comparação direta entre os resultados. "De 2004 para cá muita coisa pode ter mudado nesses países", justifica Fernando Pereira, que coordenou a pesquisa na instituição.

Ao todo, 51% das empresas identificadas foram fundadas a partir de 2002. O desempenho delas reflete essa juventude: três quartos da mostra tem faturamento anual máximo de R$ 1 milhão - sendo que 17,9% ainda não tem receita própria - e pouco mais da metade (52%) empregam no máximo nove funcionários.

A pesquisa também mostra que o número de patentes é baixo - quase 85% das companhias ainda não registrou sequer uma patente no país -, mas o resultado não significa, necessariamente, que elas não estejam produzindo inovação, ressalta Pereira.

Para começar, em geral os ciclos de desenvolvimento são mais longos na biotecnologia do que em outras áreas, como a tecnologia da informação. Isso significaria que parte das descobertas ainda está longe de uma conclusão, considerando que as empresas são muito recentes. Além disso, como em geral as companhias são fundadas por pesquisadores acadêmicos, é possível que parte das invenções tenha sido registrada no nome do profissional ou licenciadas por empresas maiores, diz Pereira.

Entre os principais problemas, as companhias de biotecnologia apontam a aquisição de máquinas e equipamentos e o acesso à mão-de-obra especializada. Parte das dificuldades, segundo Pereira, está relacionada ao fato de que essas empresas dependem principalmente de financiamento público, que não pode ser empregado na compra de equipamentos importados. O problema é que a maioria dos aparelhos usados na área não tem similar nacional.

Aos poucos, porém, o cenário está mudando, afirma Soares. "Ao mesmo tempo que o setor de biotecnologia começa a evoluir, os fundos de capital semente começam a se estruturar ao redor da área." A maior parte dos investidores ainda é formada por pessoas físicas, mas a tendência é de que os fundos de participação comecem a atuar no setor, à semelhança do que já ocorre nos Estados Unidos. "O BNDESPar (braço de participações do BNDES) já investiu em dois negócios, a Nanocor e a Genoa", diz o presidente da Biominas.

Atrair os investidores é uma das metas da Biolatina, o congresso latino-americano de negócios em biotecnologia que será realizado em setembro do ano que vem, em São Paulo. Com o evento, que será organizado pela Fundação Biominas, a meta é reunir 1,5 mil participantes e criar uma vitrine de oportunidades, afirma Soares.