Título: Anatel aprova compra da Telecom Italia
Autor: Rittner, Daniel; Magalhães, Heloisa,
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2007, Empresas, p. B4

A Anatel aprovou ontem, com 28 restrições, a aquisição do controle da Telecom Italia por um consórcio liderado pela Telefónica. Em seis meses, as multinacionais deverão apresentar ao órgão um novo acordo de acionistas que garanta "total desvinculação", com preservação da concorrência, entre as operadoras móveis Vivo e TIM.

Elas terão de manter gestões independentes, com diretoria e conselho de administração próprios. Também ficam expressamente proibidas ações como a contratação em conjunto de bens e serviços e o uso comum de recursos "materiais, tecnológicos ou humanos".

"Fizemos o melhor possível dentro da interpretação da legislação brasileira de telecomunicações", afirmou o conselheiro Antônio Bedran, relator do processo, ao explicar as razões da agência para conceder anuência prévia ao negócio. Em 15 dias, o conselho diretor da Anatel deverá analisar um parecer sobre a concentração na telefonia móvel. Por meio desse instrumento, a agência subsidiará a avaliação definitiva do Cade.

Os conselheiros entenderam que o negócio entre Telecom Itália e Telefônica não fere a resolução 101 da Anatel, que define o que é controle numa empresa de telefonia. A análise aponta que o grupo espanhol ficou, após a operação, com 8,33% das ações ordinárias da Telecom Italia no Brasil. Bedran lembrou que, de acordo com a resolução 101, é a transferência de pelo menos 20% do controle acionário que caracteriza uma coligação entre operadoras. "Não estamos permitindo fusão, coligação ou acordo operacional entre as duas empresas", destacou.

Não há necessidade de venda de ativos, disse Bedran, garantindo que a anuência prévia preserva o ambiente concorrencial. Mas advertiu que a agência ficará de olho nas operadoras e estará pronta a agir contra medidas que possam prejudicar a competição.

Além da impossibilidade de indicação de membros para o conselho de administração e o diretoria executiva da TIM Brasil pela Telefónica, as empresas também ficam proibidas de dividir prestações de garantia de qualquer espécie e "operações significativas, passivas ou ativas, de financiamento, sob qualquer forma". A agência veta ainda a transferência de conhecimentos tecnológicos "estratégicos", a prestação de serviços de telecomunicações "em condições favorecidas ou privilegiadas" e a adoção de marca ou estratégia publicitária comum.

Nos próximos seis meses, a Telecom Italia e a Telefônica deverão acatar as 28 restrições impostas pela Anatel e determinações eventualmente feitas pelo Cade. Em seguida, deverão submeter à agência as mudanças na proposta atual.

O presidente da Telefónica no Brasil, António Carlos Valente, afirmou que a maioria das exigências feitas pela agência está prevista nas regras do setor e outras já haviam sido previamente apresentadas pelo grupo, como a de não participar de decisões relativas à TIM.

O executivo observou que o órgão regulador poderia ter concedido um prazo maior à Telefónica, como fez em situações anteriores (a Telecom Italia, por exemplo, teve 18 meses para desfazer o cruzamento de participações na Brasil Telecom e na TIM). "Mas se isso gera conforto para o governo brasileiro, não temos problemas em cumprir", disse Valente.

O julgamento da Anatel era o que faltava para a conclusão do negócio, anunciado em abril. O consórcio integrado pela Telefónica e bancos italianos ofereceu 4,1 bilhões mais dívidas para comprar da Pirelli o controle da tele.

Já está marcada para amanhã uma reunião de acionistas da Telecom Italia que selará a entrada do consórcio e definirá o novo conselho de administração. A expectativa, segundo fonte próxima aos italianos, é de que sejam formados dois conselhos. Um deles deverá ficar voltado para o grupo como um todo e o outro cuidará da telefonia móvel, sem a presença de representantes da Telefónica.

A data de 24 de outubro como limite para o fechamento da operação foi anunciada em abril, junto com o acordo. A Anatel adiou várias vezes a decisão, mas acabou se encaixando no prazo fixado.

O contrato previa que o grupo espanhol poderia desistir do negócio se a Anatel fosse contra a presença na TIM e na Vivo, joint venture com a Portugal Telecom.

Segundo fonte próxima à Telecom Italia, a Telefónica conseguiu dar dois passos estratégicos. Um deles foi reduzir o poder de fogo dos mexicanos da Telmex/América Móvil no mercado sul-americano. A América Móvil, dona da Claro, era candidata à compra da TIM. Outro aspecto é que a companhia lançou as bases para criar uma grande operadora européia. Os espanhóis se fortaleceram na jogo de consolidações no setor abrindo maior espaço para concorrer com gigantes como Vodafone.

Para essa fonte e outros analistas ouvidos pelo Valor, mesmo com a agressividade espanhola tudo indica que, ao menos no curto prazo, a Portugal Telecom não deve deixar a Vivo.

Há expectativa de que mudanças imediatas no comando da Telecom Italia. Estão cotados para posições de destaque Paolo Dal Pinto, que foi presidente da Telecom Italia no Brasil e hoje comanda a Wind. Outro é Luca Majocchi, principal executivo da Seat, editora italiana de listas telefônicas e, ainda, Francesco Caio, ex-executivo-chefe da Cable & Wireless. Mas, segundo o "Financial Times", o presidente-executivo Riccardo Ruggiero ainda poderá se manter no cargo por um tempo.

O anúncio da decisão da Anatel foi marcado por um desencontro entre o ministro das Comunicações, Hélio Costa, e conselheiros do órgão regulador.

Costa conversava com jornalistas brasileiros no hall da União Internacional de Telecomunicações quando recebeu um telefonema. Logo depois voltou entusiasmado: "Tenho um furo para vocês''. A notícia era que a Anatel havia aprovado "com restrição" o acordo.

"Está no texto como sugestão para o Cade, no relatório que é emitido pela Anatel, que haja desinvestimento no setor por parte da Telefônica para que ela possa atender a um equilíbrio", contou. Porém, na entrevista que concederam em Brasília, os conselheiros da Anatel não mencionaram a venda de ativos entre as restrições impostas. O Valor procurou novamente Costa, que confirmou o que havia dito. "Nas entrelinhas dá para entender isso", ressaltou.