Título: Mudança climática entra nas discussões comerciais
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 27/11/2007, Internacional, p. A10

O combate às mudanças climáticas está saindo do foro estritamente ambiental e entrando na agenda do comércio internacional, o que pode ajudar a campanha do Brasil pela eliminação de tarifas sobre o etanol.

O governo da Indonésia está organizando encontro de mais de 20 ministros de comércio nos dias 8 e 9 de dezembro em Bali, em evento paralelo à reunião da Convenção sobre Mudança Climática das Nações Unidas, que discutirá a segunda fase do Protocolo de Kyoto.

Em meio a problemas ambientais e futuro da combalida negociação global conhecida como Rodada Doha, os ministros vão discutir como as políticas comerciais têm impacto na mudança climática e como o combate a esse fenômeno é usado para impor barreiras às trocas internacionais.

É dada com certa a presença do diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, Pascal Lamy, da principal negociadora comercial americana, Susan Schwab, dos ministros brasileiro, Celso Amorim, e indiano, Kamal Nath, além de China, África do Sul e outros países importantes na discussão. O comissário europeu de comércio, Peter Mandelson enviará seu vice, Peter O'Sullivan.

A reunião ocorrerá no rastro de crescente pressão dos EUA para que os 150 países-membros da OMC aceitam uma lista de bens ambientais que teriam tarifas de importação eliminadas ou fortemente reduzidas. Para os EUA, isso seria uma forte sinal "ambiental" a uma parte da sociedade americana preocupada com o impacto do comércio sobre o ambiente.

Só que nessa lista há países querendo incluir de barco a bicicletas, mas que rejeitam o etanol. Os EUA, a UE e a Austrália criticam a insistência do Brasil pelo etanol. A contradição desses países é significativa, porque, se recusam ao etanol o selo de produto ambiental na OMC, têm posição diferente na Convenção da ONU sobre as Mudanças Climáticas, onde todos notificaram programas de estímulo à produção de biocombustível.

A OCDE, que reúne países ricos, também destacou em recente estudo que o etanol produzido com cana-de-açúcar no Brasil pode reduzir as emissões em até 90% comparado com gasolina e diesel, e sem subsídios governamentais como nos EUA e na UE. A Austrália, que critica o Brasil, também produz etanol a partir de cana-de-açúcar, mas não recebe o mesmo tratamento por parte da OCDE.

Luigi Gambardella, presidente de EuBrasil, associação para o desenvolvimento das relações entre Europa e Brasil, nota que "diferentemente da maior parte de outros programas aplicados nos países desenvolvidos, o programa brasileiro tem um claro valor social e não produz um impacto ambiental negativo. Na perspectiva da OCDE, salva-se praticamente a política bioenergética do Brasil".

A reunião de Bali ocorrerá quando a ONU estará discutindo o que fazer com uma proposta do relator para alimentação, o suíço Jean Ziegler, que quer uma moratória de cinco anos na produção de etanol. Ele disse que a Bolívia quer transformar sua proposta em resolução na ONU. Mas o governo de Evo Morales parece mais preocupado com a tensão interna no país.

O vínculo entre comércio e meio-ambiente será, porém, abordado de maneira mais ampla. Será outra ocasião para o Brasil alvejar de novo a UE por ter denunciado a proibição brasileira a entrada de pneus usados europeus no mercado brasileiro, quando Bruxelas propaga por todos os lados suas intenções ambientais.