Título: Walfrido sai e José Múcio assume coordenação
Autor: Romero , Cristiano ; Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 23/11/2007, Política, p. A8

O deputado José Múcio Monteiro (PTB-PE), até ontem líder do governo na Câmara, é o novo ministro da coordenação política. Walfrido dos Mares Guia entregou o cargo ontem, por volta das 17h, após ser denunciado pelo procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, por suposto envolvimento no mensalão mineiro. Walfrido avisara ao presidente na noite de quarta-feira que, se denunciado, deixaria o posto. O deputado Henrique Fontana (PT-RS), deve ser o novo líder do governo na Câmara, nomeação há muito reivindicada pelo PT que ficou de fora de todos os cargos governistas no Congresso Nacional.

Exercendo seu quinto mandato consecutivo de deputado federal, José Múcio entrou na política pelas mãos do deputado Roberto Magalhães (PTB-PE). Engenheiro Civil, foi secretário de Transportes e presidente da Companhia de Eletricidade de Pernambuco (Celpe) na gestão de Magalhães à frente do governo pernambucano (1983-1986).

Filho de uma tradicional família de empresários - é primo em primeiro grau do presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE) -, Múcio passou por vários partidos antes de se filiar ao PTB - Arena, que chegou a presidir interinamente, PDS e PFL. Em seu Estado, integra a base de apoio ao governador Eduardo Campos (PSB), neto de Miguel Arraes, contra quem disputou e perdeu a eleição para o governo de Pernambuco em 1986, e é adversário do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) e do futuro presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra.

José Múcio é visto, entre seus pares, como um negociador hábil e de perfil conciliador. Seu estilo é comparado ao do antecessor - assim como Walfrido, Múcio atua como um operador no Congresso, encurtando a distância que separa os parlamentares do Executivo e ajudando-os na liberação de verbas de emendas orçamentárias. Conquistou a confiança do presidente Lula depois de exercer, por 11 meses, a função de líder do governo na Câmara. Nesse período, diz uma fonte, sobreviveu ao teste de liderar a base aliada mesmo não sendo do PT, o partido de Lula.

Duas razões centrais permearam a decisão de Walfrido para sair do governo: a dificuldade em compatibilizar o trabalho de articulador e a própria defesa; e a preocupação de evitar que uma crise, "que considera tucana", seja transferida para o Planalto.

Na carta entregue ao presidente, Walfrido mostrou indignação em relação à denúncia: "Ela é injusta e improcedente. Essa convicção me permite afirmar que nunca participei de qualquer reunião sobre o assunto que ora move o procurador-geral da República em sua acusação ou dele tive ciência ao longo da campanha eleitoral de 1998, período no qual dediquei-me intensamente à minha eleição para a Câmara dos Deputados". Em 2006, já ministro do Turismo, não concorreu às eleições parlamentares.

Na última declaração como ministro, Walfrido reiterou que, na única vez em que foi ouvido pelo Ministério Público sobre as supostas irregularidades na eleição de 1998 (a tentativa de reeleição para o governo estadual do hoje senador Eduardo Azeredo), "jamais foi questionado sobre os elementos que ora me acusam". A denúncia feita pelo procurador refere-se aos recursos desviados do "Enduro da Independência", que teriam abastecido o valerioduto mineiro. Essa acusação, segundo Walfrido, não constava do relatório da Polícia Federal encaminhada ao MP Federal.

Em nota oficial, lida pelo porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, o presidente Lula demonstrou confiar na defesa feita pelo seu ex-colaborador. "Mantenho integral confiança na pessoa do ministro que, estou seguro, será inocentado das acusações". Lula reconheceu as "razões pessoais e políticas" que levaram Walfrido a tomar a decisão e que, por isso, aceitou o pedido. Mas em reunião na tarde de ontem, deixou no ar que o adeus pode transformar-se em um até breve. "Depois de superar esse processo, quem sabe você não pode voltar a ser colaborador do governo", teria dito .

Além de entender as razões do ministro, o presidente sabe que o momento não é fácil para o governo diante das negociações para aprovação da CPMF. Manter Walfrido no cargo, mesmo após a denúncia, significaria mais um obstáculo para a prorrogação do imposto do cheque.

Há pouco mais de uma semana, quando tornava-se iminente que a denúncia seria feita, Walfrido concretizou a idéia de que, se isso acontecesse, deixaria o posto. Mas Lula resistia à mudança. Ambos se conheceram em 2002, mas tornaram-se amigos após o convite, ainda durante a transição, para que Walfrido assumisse o Ministério do Turismo. Walfrido também deixou Múcio de sobreaviso, caso o procurador de fato apresentasse a denúncia. Durante a despedida, o petebista mineiro disse que uma de suas grandes felicidades era o fato de o presidente ter aceito a indicação de José Múcio para o cargo de coordenador político.

Para Eduardo Campos, não haverá solução de continuidade: "Os dois trabalham muito afinados. Do ponto de vista político as coisas não se alteram".

José Múcio tem sua primeira reunião com o presidente hoje. "Não há tempo a perder", afirmou , dizendo que "não queria assumir o ministério nessas circunstâncias". e que transição no meio das negociações para a prorrogação da CPMF, é um complicador. "Se me perguntassem qual seria a pior hora para isso acontecer, eu certamente diria que é agora", resumiu , para logo em seguida pedir, ao senador João Ribeiro (PR-TO), que o cumprimentava, "que reze por ele diante da nova missão".