Título: Ministério quer reduzir déficit comercial do setor em 40% até 2011
Autor: Agostine, Cristiane ; Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 23/10/2007, Brasil, p. A4

Sergio Zacchi/Valor José Gomes Temporão: governo quer estimular a produção nacional do setor e reduzir a dependência externa O Brasil acumula, hoje, um déficit comercial de US$ 5 bilhões na balança do setor de saúde, que inclui medicamentos, princípios ativos e equipamentos. A "política industrial" para o setor, em gestação entre o Ministério da Saúde e o BNDES, estima que é possível reduzir essa conta em 40% no prazo de quatro anos. A base do programa é o poder de compra do governo, que, apenas no caso da União, se aproxima de US$ 3 bilhões por ano.

A intenção do governo é estimular a produção nacional do setor e reduzir a dependência externa, que, no caso de hemoderivados, chega a 100% - todos os medicamentos são comprados de três empresas localizadas fora do país. Para alcançar a redução do déficit comercial, o programa vai atingir dois extremos, explicou o ministro da Saúde, José Gomes Temporão: doenças negligenciadas por laboratórios comerciais ou com alta disseminação entre a população (como esquistossomose, no primeiro caso, e hipertensão e diabetes no segundo) e apoio à pesquisa e inovação, incluindo o desenvolvimento de novas vacinas.

A política em discussão no governo, na verdade, é a extensão e reformulação do Profarma, programa criado no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, cuja vigência foi estendida até julho de 2012 - antes, ele terminaria em dezembro deste ano. E ele foi rebatizado para Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde. Junto com a mudança de nome, ganhou uma nova dimensão. A visão associada a ele é que a política de saúde é a única política social que tem acoplada a ela um segmento industrial muito importante, responsável pela produção de insumos, medicamentos, farmoquímicos, kits diagnósticos, vacinas e equipamentos de saúde.

O BNDES está costurando um termo de cooperação com o Ministério da Saúde para estabelecer as regras básicas de como se dará, na prática, a parceria entre as partes para incentivar laboratórios públicos e privados a desenvolverem e produzirem localmente princípios ativos e medicamentos estratégicos para a política de saúde no Brasil, amparados pelo poder de compra da pasta. No ano passado, foram gastos US$ 2,9 bilhões com a importação de produtos como insulina, o interferon e fatores coagulantes para hemofílicos, mais remédios para doenças negligenciadas, como malária, leishmaniose, tuberculose e dengue, entre outras. O Brasil compra lá fora vacinas e 100% da insulina que consome.

Em 2006, o déficit comercial do setor farmacêutico alcançou US$ 5 bilhões, se for incluído na conta a compra de vacinas, equipamentos médicos e materiais cirúrgicos e odontológicos. Este ano, o valor pode ser maior por conta da apreciação do real, que estimula a importação desses produtos, muitos deles reféns de monopólios internacionais, prevê Pedro Palmeira, chefe do Departamento de produtos farmacêuticos, do BNDES.

Palmeira disse ao Valor que o objetivo do novo Profarma não é "quebrar patentes", mas reduzir a dependência do Ministério da Saúde das compras internacionais, apoiando com seu poder de aquisição os laboratórios locais, públicos e privados. No caso dos laboratórios públicos, o programa criou dois novos braços para atuar no segmento. O primeiro é um subprograma denominado Profarma Produtores Públicos, que visa apoiar produtores públicos de medicamentos imunobiológicos, como vacinas. O Brasil tem 18 laboratórios oficiais associados à Alfob e mais produtores de vacinas, como Biomanguinhos, Butantã e Tecpar. "Será preciso otimizar esses laboratórios para funcionarem como uma rede", disse Palmeira.

Para isso, o BNDES tem prazo de um ano para fazer um diagnóstico e traçar um plano de ação com apoio da Alfob e de uma consultoria externa para orientar seus técnicos. Elaborado o diagnóstico e traçado o plano de ação, o banco vai trabalhar com o Ministério da Saúde para melhorar a gestão desses laboratórios e seus sistemas de garantia de qualidade com desembolso de recursos não-reembolsáveis.

Outra ponta que terá o apoio do banco é o desenvolvimento de uma estrutura produtiva com pesquisa avançada nesses laboratórios públicos com recursos do Funtec, também não-reembolsáveis. Neste caso, vão ser estimuladas a prática de pesquisa e o desenvolvimento de produtos para doenças neglicenciadas como dengue, tuberculose, doença de Chagas, malária e o uso de biotecnologia avançada para para fabricar no país princípios ativos, como interferon, insulina, heritropetina (para anemia grave) e coagulantes para hemofílicos. "Estes são os alvos do Funtec, que hoje tem uma carteira de R$ 60 milhões e é engordada todo ano com parte do lucro do banco", contou Palmeira.

Para ele, a essência do sucesso do Profarma será garantido pela associação entre o Ministério da Saúde e o BNDES. "O ministério entra exercendo seu poder de compra e o banco apoiando o desenvolvimento de medicamentos amplos com conteúdo tecnológico e estratégico do ponto de vista da saúde do brasileiro." O executivo do banco destacou que a estratégia não exclui os laboratórios privados. "O escopo maior do Profarma é fortalecer a indústria privada nacional, tornando-a competitiva no mercado global." O novo orçamento do Profarma, estendido até 2012, soma R$ 3 bilhões.