Título: Disputa pela Câmara incha PMDB e fortalece grupo de Garotinho
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 03/02/2005, Política, p. A9

Começou o período de autofagia partidária no Congresso Nacional - em que os partidos assediam fortemente os parlamentares a mudar de legenda - e o PMDB oposicionista não está medindo esforços para controlar o partido na Câmara. O mentor da estratégia é o ex-governador e secretário de Governo do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho. O pemedebista desembarcou ontem em Brasília para articular, junto com o presidente da legenda, Michel Temer, a filiação de aproximadamente 12 deputados. Sete já confirmaram a filiação ontem, o que forma uma bancada de 84 integrantes, seis a menos que a do PT, maior partido na Câmara. Hoje, prometem assinar a ficha de filiação mais alguns, entre eles, o deputado Inocêncio Oliveira (PE), que passou quase duas décadas no PFL. A filiação será oficializada num evento em Recife, com participação do governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos. Segundo Temer, a migração de parlamentares fortalece o PMDB. O inchaço pemedebista coloca o partido muito próximo ao PT, que hoje tem 90 parlamentares. Ao ser questionado se a maior parte desses parlamentares fará oposição ao governo, o presidente do PMDB argumentou que esse tema só será discutido após a eleição das presidências na Câmara e no Senado, mas sinalizou que é "um caminho que começa mais forte", ou seja, que é provável o fortalecimento da corrente oposicionista no PMDB. O crescimento do grupo de Garotinho ameaça o atual líder da bancada, José Borba (PR). Os oposicionistas vão lançar como líder Saraiva Felipe (MG). O período de troca-troca partidário é estimulado pela inexistência de regras que exigem a filiação partidária e por questões internas: a data-referência para que as bancadas escolham, conforme seus tamanhos, as presidências das comissões temáticas é meia-noite de 14 de fevereiro. Até lá, vale tudo para aumentar a bancada e, consequentemente, o poder político na Câmara, já que os maiores partidos têm prioridade na escolha das comissões. O presidente da Câmara, João Paulo Cunha, criticou ontem o troca-troca. Por pressão dos líderes, a presidência da Câmara concordou com a data limite de zero hora do dia 15 de fevereiro para considerar a distribuição de cargos nas comissões. "O troca-troca de partidos nunca é bom. O eleitor vota num determinado candidato, num determinado partido, e gostaria de ver aquele parlamentar encerrar o mandato naquele partido", disse João Paulo. O PT, após a eleição das Mesas Diretoras, acha possível aumentar a bancada. No governo, a avaliação é de que o inchaço no PMDB não muda a correlação de forças da base aliada. "O Garotinho e o Temer não querem mudar a correlação de forças no governo, mas no PMDB", afirmou um integrante do governo. Segundo a fonte, estratégias como essa liderada por Garotinho são polêmicas e podem culminar em escândalos. Membros do governo, informados da articulação no PMDB, relembraram o episódio do "PSDólar", no início da década de 90, em que foi tornada explícita a compra de parlamentares para que mudassem de legendas. Parlmentares envolvidos renunciaram, outros perderam o mandato e houve até quem confessou. Há hoje, inclusive, uma denúncia sendo analisada pela Corregedoria da Câmara, que ainda não abriu sindicância. A denúncia foi feita pelo deputado Wilson Santiago (PMDB-PB). O presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), não aposta numa debandada no partido. Ele lamentou ontem a saída de Inocêncio Oliveira, um dos fundadores do partido, e mobilizou o senador Marco Maciel (PFL-PE) para tentar demover o deputado da idéia de deixar a legenda. Inocêncio disse que pretende se candidatar ao governo de Pernambuco, e não teria espaço no PFL. "O PFL nunca me deu essa chance de disputar um cargo majoritário em Pernambuco", afirmou o vice-presidente da Câmara. "O problema de Pernambuco é que os quadros do PFL são todos muito bons, e o partido tem vários nomes, como do senador José Jorge, do deputado Roberto Magalhães e do vice-governador", alegou Bornhausen. Outros pefelistas ameaçam deixar a legenda. Um deles é Pauderney Avelino (AM). "Eu ainda estou no PFL, mas não descarto a possibilidade de sair. A única coisa que quero é que o partido me abra espaço para trabalhar", disse. Avelino reivindicava a liderança da minoria, mas não deve ser indicado. Nos outros partidos, o clima é de temor. O líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE), foi um dos únicos que criticou a data de referência para a escolha das comissões. "A partir de agora está aberta a temporada de caça. É uma autofagia entre partidos", lamentou.