Título: Deputados criticam abrangência de emenda da fidelidade do Senado
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2007, Politica, p. A6

A aprovação, pelo Senado Federal, de uma rígida proposta de emenda à Constituição sobre a fidelidade partidária recebeu poucos elogios e muitas críticas na Câmara dos Deputados, onde o texto passará a tramitar a partir da próxima semana. Os deputados não devem manter toda a severidade do texto de autoria do senador Marco Maciel (DEM-PE).

A PEC determina que o membro dos Poderes Legislativo e Executivo que se desfiliar do partido pelo qual tenha sido eleito perderá automaticamente o mandato, exceto no caso de extinção, incorporação ou fusão do partido (e são essas as três únicas possibilidades de mudança de partido).

O líder do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), fez duras críticas ao texto. "Tenho absoluta convicção de que a proposta vai sofrer modificações aqui", disse o deputado. "Do jeito que as coisas estão, nunca alguém vai poder sair do partido, em ocasião nenhuma", completou. Para o pernambucano, o texto de Maciel é autoritário. "É um texto que faz inveja aos militares. Nem durante o regime militar houve tanta criatividade."

O deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), ex-juiz federal, elogiou a agilidade do Senado ao tratar do tema. "É bom. Assim a Câmara se movimenta e enfrenta o assunto com mais firmeza", disse. Mas o parlamentar criticou o conteúdo da proposta. "O texto não está em sintonia com as decisões do TSE e do STF. Os ministros determinaram que os parlamentares teriam direito de defesa na Justiça Eleitoral antes de ser decretada a perda de mandato", afirma Dino.

Nas últimas semanas, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), respondendo a consultas e mandados de segurança dos partidos, decidiram que mudança de legenda configura ofensa aos eleitores e conseqüente perda de mandato, garantido direito de defesa.

O texto de Maciel determina que, depois da mudança de legenda do parlamentar, a Mesa Diretora da respectiva Casa é obrigada a decretar sua cassação em até três sessões do plenário. Dino também critica a dureza do texto.

"É uma fidelidade absoluta. É preciso determinar um período no qual é possível haver uma mudança. O sistema político é dinâmico. A vida política não é uma fotografia, é um filme em transição", comparou o deputado. Para ele, se um partido político ofende suas próprias bandeiras ou as altera, o parlamentar deve ter o direito de deixar a sigla.

Se Dino acredita que o texto de Maciel contraria as decisões do STF e do TSE, o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ), vê similaridade entre as duas iniciativas. "A proposta do senador Marco Maciel vai na linha do STF, que determinou a fidelidade partidária de forma muito forte", disse Maia.

O deputado elogiou a decisão dos senadores. "A votação no Senado mostra que aquela Casa pensa de forma diferente da Câmara sobre a fidelidade partidária. Além disso, mostrou para os deputados que não pretende dar anistia", disse Maia, ao fazer referência ao projeto de lei sobre o tema aprovado pelos deputados. O texto concedia anistia a todos os deputados que trocaram de partido até setembro.

O relator da reforma política na Câmara, deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), diz que, se o financiamento público de campanha e o voto em lista tivessem sido aprovados pela Câmara, não seria necessário aprovar um texto de fidelidade: "Como esse sistema que aí está, teremos sempre de fazer um projeto de fidelidade. Quando atacamos a fidelidade, é como atacar o sintoma e não curar a doença, que é o sistema falido que temos".

Para Caiado, o projeto é um tanto rigoroso. "Mas será sempre assim. Ou será rigoroso demais, ou rigoroso de menos. Do jeito que está o sistema hoje, o projeto tem que ser esse mesmo do senador Maciel", completou. Caiado, que pesquisou os diferentes sistemas eleitorais e políticos no mundo para procurar idéias para incluir na reforma política, afirma que não existe nenhuma legislação de fidelidade em outros países. "O troca-troca é residual, ideológico. Não há necessidade de punição."