Título: Lula pede empenho de empresários para bater China na África
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2007, Especial, p. A16

Ricardo Stuckert/PR O presidente Lula deposita flores no monumento do primeiro presidente de Angola, Antonio Agostinho Neto O presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou ontem guerra à China na disputa pelo mercado africano e pediu mais iniciativa dos empresários brasileiros na disputa com a concorrência chinesa. "Os empresários precisam perceber que eles têm um mercado potencial, sem abdicar do que já foi conquistado", disse, reclamando de que as empresas erram ao concentrar excessivamente os esforços nos mercados da Europa e dos Estados Unidos, onde a concorrência "é muito mais acirrada".

Lula encerrou por Angola a sua visita de quatro dias a quatro países africanos. Ele começou na segunda-feira em Burkina Fasso, noroeste do continente africano, desceu um pouco até a República do Congo, foi ao extremo sul para a reunião de cúpula do Fórum de Diálogo Índia, Brasil e África do Sul (Ibas) e subiu novamente para fechar a viagem em Luanda.

Enquanto nas visitas anteriores a ênfase maior foi na busca de apoio para a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, abrindo novas vagas de membros permanentes, uma delas para o Brasil, e nas negociações comerciais da Rodada Doha, na capital angolana o presidente concentrou os esforços em mostrar aos empresários brasileiros que eles têm, no processo de reconstrução do país, devastado por uma guerra civil de 27 anos (1975-2002), uma grande oportunidade de negócios.

Lula anunciou que a linha de crédito do BNDES para financiar exportações de bens e serviços de empresas brasileiras para Angola está sendo renovada agora com recursos de US$ 1 bilhão. Esse número representa um aumento de 33,3% sobre os US$ 750 milhões aprovados em 2005 e eleva a US$ 2,225 bilhões o valor acumulado da linha, uma vez que em 2005 ela havia sido de US$ 475 bilhões. Segundo Lucienne Ferreira Machado, chefe do Departamento de Comércio Exterior 2 do BNDES, da linha de 2007 já foram contratados US$ 725 milhões. A prioridade para receber os recursos é dada pelo governo angolano.

Ao ser alertado por uma jornalista que a linha de financiamento da China para Angola, com os mesmos objetivos da brasileira, já está em torno de US$ 4,5 bilhões (acumulados), Lula disse que esse número deve "servir de alerta" para os empresários do Brasil. Em 2006, o Brasil foi responsável por 6,2% das importações angolanas, diante de 5% da China. Na disputa pela parceria com os angolanos, Lula entende que o Brasil está mais bem posicionado graças a uma abordagem mais favorável ao parceiro.

Segundo o presidente, a China tem, "muitas vezes", o objetivo principal de desenvolver projetos que resultem no fornecimento de matérias-primas para o seu parque industrial. Já o Brasil, de acordo com Lula, busca gerar desenvolvimento no país onde investe. Em cerimônia de encerramento de um encontro de empresários brasileiros e angolanos, Lula, em tom afável, reclamou dos empresários brasileiros o fato de Angola comprar material de construção de Portugal e plataformas marítimas de petróleo em Cingapura. "É só botar em um isopor (no Brasil) que os produtos chegam aqui."

Lula exortou os empresários brasileiros a, em vez de quererem apenas exportar produtos feitos no Brasil, abrirem fábricas de material de construção ou mesmo estaleiros para produzir plataformas marítimas em Angola. Ele disse que "Angola tem todas as condições para ser a grande potência da África". Afirmou ainda ter recebido informações do governo angolano de que na guerra civil foram destruídas 3.000 das cerca de 4.000 pontes que o o país dispunha, além de rodovias e ferrovias inteiras. "Angola é hoje um canteiro de obras", disse.

"A participação do Brasil poderia ser mais forte", disse Lula que, na sua visita de um dia, viu uma Luanda caótica, com a maioria dos edifícios favelizados, mas também obras de novos prédios, de saneamento e de abertura de vias por todos os lados. A economia angolana, ainda fortemente sustentada pelas produções de petróleo e de diamantes, vem crescendo a taxas próximas a 20% ao ano nos últimos três anos. O país busca desenvolver projetos em outras áreas que não a da produção mineral.

No esforço para ampliar os negócios com Angola e outros países africanos, Lula adotou a política do pragmatismo, fechando os olhos para a densidade democrática em países como a própria Angola, onde José Eduardo Santos mantém-se na presidência desde 1979, e com apenas uma eleição em 1992, Burkina Fasso e República do Congo. Lula disse que se questões ideológicas interferissem nos negócios, o ex-presidente americano Richard Nixon não teria priorizado o comércio com a China no começo dos anos 1970.