Título: Sinal de alerta
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Fonte: Correio Braziliense, 25/01/2011, Opinião, p. 18

A tomada do Complexo do Alemão recebeu merecida atenção da imprensa nacional e estrangeira. Depois de décadas de abandono pelo poder público, a população de uma das mais violentas favelas do Rio de Janeiro pôde sonhar com a presença do Estado no local. A operação, com o apoio decisivo das Forças Armadas, desalojou traficantes que submetiam adultos e crianças aos interesses ilícitos que transformavam o estado em paraíso da bandidagem.

Mitos caíram. Descobriu-se, com a fuga atribulada dos até então poderosos mandatários, que o crime não era tão organizado quanto se pensava, embora possuísse arsenal muito mais moderno que o posto à disposição da polícia. A realidade era outra: a infestação da violência nas áreas mais pobres da ex-capital brasileira se deu por expressa omissão dos antigos governantes ¿ muitos coniventes ou sócios da marginalidade. Provou-se ser fantasiosa a ideia de que era incontrolável a ação da delinquência nos antros.

Passado mais de um mês da ação cinematográfica, equipe do Correio Braziliense visitou o Complexo do Alemão e a Vila Cruzeiro. Reportagens publicadas ontem e no domingo demonstram que o tráfico voltou a atuar nos morros. Os moradores, antes confiantes na prometida virada estrutural, estão assustados. Temem não só os bandidos mas também os mocinhos. Homens e mulheres que formalizaram denúncias de abusos policiais por ocasião da tomada do Alemão continuam sem resposta. O medo, outra vez, os imobiliza e lhes cala as queixas.

Aos cidadãos de bem ¿ esmagadora maioria dos habitantes das favelas e do asfalto ¿ não interessa o retrocesso. Tampouco interessa aos brasileiros. Cartão-postal do Brasil, o Rio simboliza o país. O horror de que foi palco nas últimas décadas trouxe prejuízos à imagem e à economia da cidade. Afastou turistas que mudaram o roteiro por temor a assaltos, sequestros, arrastões ou balas perdidas. Quebrou restaurantes e casas noturnas. Limitou a ocupação de hotéis, bares e áreas de lazer.

Os estragos não se restringem ao território carioca. Vão além. O Rio, caixa de ressonância nacional, contaminou o noticiário dos cinco continentes. Qualquer ato de violência ali cometido respinga na imagem do país. Daí a importância de manter os morros sob controle. O Estado tem de avançar em dois sentidos. De um lado, na repressão severa às tentativas de retorno da situação anterior. O tráfico precisa ser banido definitivamente. De outro, na oferta de serviços públicos de qualidade. Escolas, hospitais, transporte e opções de lazer devem avançar com rapidez. A paz sustentada atrairá atividades econômicas que ampliarão a oferta de empregos na área. Em bom português: não é hora de vacilar.