Título: Troca com troco vira arma no consignado
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Fonte: Valor Econômico, 23/11/2007, Finanças, p. C12

O Paraná Banco montou sua linha de frente para combater o que internamente é chamado de "movimento de guerrilha", em que concorrentes se oferecem para quitar empréstimos de clientes e, assim, conseguir novo contrato. A instituição criou uma mesa de retenção em que, sempre que ações de quitação de dívidas são detectadas, uma equipe formada por vinte pessoas parte para a oferta de refinanciamento das operações originais, para evitar a transferência.

Para contra-atacar, outra mesa, com mais vinte pessoas, tem a missão de atrair novas operações por meio do pagamento de débitos em outros bancos e oferta de novo empréstimo. O diretor comercial do Paraná Banco, André Malucelli, disse que as instituições têm ficado cada vez mais agressivas na compra de dívidas. "Passamos a perceber movimentos de quitação superiores aos números históricos", contou. "Seguimos a tendência e nos obrigamos a criar estratégias de defesa." Segundo ele, a mesa de retenção foi montada há seis meses, e a da compra, há três.

Essa prática já é conhecida como "troca com troco", em alusão ao modelo adotado no financiamento de veículos, em que o cliente refinancia o bem e, em alguns casos, ainda retira um volume de recursos, o troco. Para o vice-presidente do BMG, Márcio Alaor Araújo, essa quitação antecipada é uma prática "normal". "Todos os bancos tentam tomar clientes seja na conta corrente, seja no cheque especial e no consignado não seria diferente".

A portabilidade de contratos de crédito consignado não foi formalmente regulamentada, mas na prática a portabilidade já existe. "O mais importante para o cliente é a taxa mais baixa e isso ele consegue até mesmo dentro do próprio banco. Quando o cliente atinge um terço do prazo da dívida, oferecemos um refinanciamento com juros menores", explica o executivo do BMG.

O vice-presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), Renato Oliva explica que a concorrência é saudável. A idéia de que a prática é benéfica, no entanto, não é unânime.

"Muitos bancos estão usando táticas extremamente agressivas que não é tão bom para o mercado", diz o superintendente nacional da Caixa Econômica Federal, Mário Ferreira Neto. "Nem sempre essa troca é mais barata para o cliente. Às vezes, o cliente é atraído pelo "troco" e nem percebe que a taxa é maior", diz o executivo da Caixa.

Para o presidente do Bonsucesso, Paulo Henrique Pentagna Guimarães, num cenário de queda de juros, é uma "tendência natural" o ataque dos bancos concorrentes a sua base de clientes. "Trabalhamos para defender a nossa base", afirma.

Segundo Guimarães, o banco concorrente chega até um servidor público ou aposentado que já tem contrato com o Bonsucesso por meio de um correspondente bancário. O que significa que o banco terá de pagar comissão nesse contrato. "Nós, pelo contrário, não temos de pagar comissão para oferecer uma proposta de refinanciamento com taxas melhores para nosso próprio cliente", explica o presidente do Bonsucesso. "Sempre que um cliente procura para fazer a quitação antecipada de um contrato, a orientação é para reter o cliente oferecendo proposta melhor que a do concorrente."

Os números do Bonsucesso dão mostra do quão agressivo anda esse mercado, entre 35% e 40% da produção mensal do banco mineiro refere-se, na verdade, ao refinanciamento de dívidas na própria base. De acordo com o presidente, a estratégia do seu banco para crescer carteira não é atacar a base dos concorrentes e sim focar na ampliação dos convênios com órgãos públicos.

O Banco Fibra, que recentemente iniciou operação de varejo, também realiza esse tipo de operação. "O foco de nosso atendimento é o cliente, seja para atendimento inicial ou em refinanciamentos", disse o vice-presidente de Negócios de Varejo do Fibra, Márcio Ronconi. Ele explica, no entanto, que esse não é o foco do banco, ou seja, não estimula nem induz o cliente a encerrar o financiamento em outro banco para abrir outro.

De fato, essa é uma prática bastante usual, explica o assessor econômico da Serasa, Carlos Henrique de Almeida. Ele lembra que tanto no crédito imobiliário quanto no financiamento de veículos isso é bastante comum.

Segundo ele, no entanto, isso faz mais sentido para dívidas mais longas. "Muitos clientes endividados trocam de carro para quitar os débitos e ficar com juros menores, na chamada troca com troco", explica Almeida.

O executivo do Paraná Banco acrescentou que o movimento é maior entre os pequenos e médios bancos e as ações partem principalmente de correspondentes bancários. Muitas vezes, disse ele, o concorrente se antecipa ao cliente final, que depois recebe proposta para mudar de banco. As instituições sabem das operações de credito consignado por meio dos holerites de pagamentos. "Conseguimos reter cerca de 80% das transferências", afirma Malucelli. Na operação contrária, "pegamos quatro vezes mais clientes do que perdemos".

Essa disputa pelos mesmos clientes se justifica à medida que a concessão de empréstimos com desconto em folha parece atingir o limite. Mais de oito milhões de aposentados e pensionistas já recorreram ao empréstimo com desconto em folha (mais de 30% do total) e o mercado de empréstimos para funcionários de empresas privadas ainda não é muito explorado devido ao maior risco.

Na opinião de Malucelli, ainda há muito espaço para crescimento e esse movimento de transferência, embora exija atenção, não chega a preocupar. Além do ataque dos pequenos e médios, o banco passou a enfrentar a concorrência com os grandes. Mas, nesse caso, o executivo acredita que a maior oferta ajudou a criar mercado para todos, pela maior publicidade para a modalidade.

O executivo da Caixa concorda que a abertura do mercado de consignando foi "fantástica" e possibilitou que o saldo pulasse de R$ 17 bilhões, em 2004, para os atuais R$ 61 bilhões, em setembro. Ele pondera, no entanto, que é preciso uma "depuração" devido às praticas agressivas.