Título: Chávez enfrenta votação crucial para levar o socialismo à Venezuela
Autor: Souza , Marcos de Moura
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2007, Internacional, p. A13

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, enfrenta neste domingo aquela que é provavelmente a votação mais difícil de seus oito anos de governo. E, para muitos, a mais importante.

Os eleitores vão às urnas para dizer "sim" ou "não" a um projeto que altera 69 dos 350 artigos da Constituição. O novo texto, entre outras coisas, permite ao presidente se reeleger um número ilimitado de vezes, enfraquece direitos sobre a propriedade privada, amplia benefícios da Previdência, reduz a jornada de trabalho e dá ao presidente poderes para, em situações especiais, censurar a imprensa.

Este é o maior conjunto de mudanças econômicas, político-administrativas e institucionais proposto por Chávez para levar o país ao que ele chama de "socialismo do século XXI".

Nas últimas semanas, pesquisas de intenção de voto indicaram um avanço do "não", e uma sondagem chegou a apontar empate técnico. Talvez por temer que as pesquisas continuassem a mostrar um declínio do "sim", o governo proibiu a divulgação de resultados de sondagens eleitorais na última semana antes do referendo.

"Esse é sem dúvida o pleito mais apertado para Chávez", disse ontem ao Valor Miguel Santos, economista e professor da Universidad Católica. Chávez já ganhou dez votações nacionais, incluindo duas eleições presidenciais e vários referendos. Até agora, a menor vantagem que teve foi em 1998, quando venceu sua primeira eleição para a Presidência por 54% a 46% dos votos, lembra Santos.

Agora, é possível que a margem seja menor. Mas, mesmo entre os críticos de Chávez, poucos crêem na sua derrota. E isso apesar dos protestos de uma parcela dos estudantes - que ontem reuniram centenas de milhares de jovens na capital -, de queixas da Igreja e de críticas de ex-aliados.

Até mesmo muitos eleitores de Chávez torcem o nariz para alguns dos pontos da reforma, como a possibilidade de reeleição ilimitada. "A reeleição talvez não passasse se fosse a voto sozinha. Mas, como está com um pacote social que tem apoio popular, é como se fosse uma pílula amarga que se precisa engolir", diz outro acadêmico venezuelano, o professor de Análise Política da Universidad Simón Bolívar. Segundo ele, pontos como a proposta de redução da jornada de trabalho e a extensão da cobertura previdenciária fisgam uma fatia majoritária do eleitorado.

A oposição, por seu lado, acrescenta Herrera, não conseguiu montar um discurso suficientemente forte e coeso. "A oposição está muito dividida. São cerca de dez os líderes mais importantes. Uns defendem a abstenção, outros o voto no "não" e outros ainda o voto de consciência", observa Herrera, que considera nula a chance de um derrota de Chávez. "Não será a eleição mais difícil para ele, mas será a mais importante por significar um avanço de seu programa".

Para os críticos, este programa afugentará ainda mais investimentos, inchará ainda mais o Estado e abrirá uma porta para o autoritarismo. Para simpatizantes, a centralização de poder fortalece o país e mudanças de viés social ajudarão a reduzir a desigualdade.

Mas até que ponto a massa de eleitores está ciente do conteúdo sobre o qual decidirá domingo? "Todas as pesquisas mostram que há um grande desconhecimento", diz Santos. Muitos dos que vão dizer "não" o farão por estarem descontentes com a escassez de produtos básicos. E muitos dos que dirão "sim" o farão por fidelidade a Chávez que - reeleito no fim do ano passado com mais de 60% dos votos - continua popular no país. A pergunta é se a a eventual reforma o manterá como ídolo popular ou se arruinará não apenas seu capital político, mas também o país.