Título: Cientista político propõe reforma alternativa
Autor: Felício , César
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2007, Especial, p. A16

Desviar o foco da questão eleitoral na discussão da reforma política é o principal objetivo do cientista político Wanderley Guilherme dos Santos ao apresentar nesta entrevista seis propostas de mudança constitucional. As sugestões de Wanderley Guilherme tratam o funcionamento institucional e o relacionamento entre os Poderes, em detrimento das mudanças de regras eleitorais, como o voto distrital ou em lista, a fidelidade partidária e o estatuto da reeleição.

"O debate sobre a reforma política nos lançou uma armadilha. Quem não tem grandes desconfortos com as regras eleitorais, como eu, fica apenas contraditando, o que dá a impressão de que há total satisfação com o sistema institucional vigente", diz Wanderley Guilherme.

A ênfase na questão eleitoral é dada não apenas pelos defensores da reforma entre partidos oposicionistas, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que prega o voto distrital, como pelo governo. Nos próximos dias, Lula deverá começar a negociar com sua base uma proposta que envolve a lista fechada, a fidelidade partidária e o financiamento público.

Recentemente nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o conselho curador da futura TV pública, Wanderley Guilherme é filósofo e cientista político, com doutorado na Universidade de Stanford, Estados Unidos. Aposentou-se como professor de teoria política na UFRJ e dirige o Laboratório de Estudos Experimentais da Universidade Cândido Mendes, no Rio.

Para Wanderley Guilherme , seu papel no Conselho Curador da TV pública concebida por Lula será semelhante a de um jurado. "Aceitei o convite para participar do conselho curador porque sei que posso ter opinões construtivas diante de uma grade de programação e diante da execução", justificou. Para Wanderley, o fato de o Conselho reunir personalidades díspares como o ex-governador paulista Claudio Lembo (DEM) e o cantor de rap MV Bill o neutralizam do ponto de vista político. "O ecletismo do grupo desestimula dogmatismos de preferências e facciocismos de perspectiva", afirmou.

São seis as propostas. Duas estão na esfera eleitoral, alterando as regras de financiamento das campanhas e acabando com a figura do suplente de senador. Outras quatro tratam de questões institucionais, reforçando o poder Executivo.

Wanderley Guilherme sugere a possibilidade de se votar uma licença compulsória do presidente atingido por alguma denúncia. Pode ser uma arma para facilitar um processo de impeachment, mas pode também ser um instrumento para o presidente limitar o uso de denúncias por parte da oposição: se a licença compulsória não for aprovada pelo Congresso, o assunto não poderia mais ser tratado no Legislativo. Dentro desta mesma linha, Wanderley Guilherme propõe criar a possibilidade de impedimento de ministros, desde que por dois terços dos votos e mediante a elaboração de uma lista tríplice de possíveis sucessores. O cientista político sugere ainda que se preveja o impeachment de ministros do STF ou STJ, seguindo as mesmas regras do impeachment presidencial.

Wanderley Guilherme propõe ainda uma regulamentação para a realização de plebiscitos e referendos: precisariam de quórum qualificado de dois terços do eleitorado para serem validados. O professor é contra o uso da consulta popular para questões institucionais. Neste caso, sugere que a mudança seja feita pelo Congresso, em pelo menos duas votações em legislaturas diferentes.

A proposta de financiamento eleitoral feita pelo cientista político é de caráter misto. Até um determinado limite de candidatos haveria um financiamento público, a ser concedido na proporção inversa do resultado eleitoral obtido pelo partido: quanto menos votos na eleição passada, mais a sigla receberia em termos proporcionais. Caso não obtenha um bom resultado novamente, a legenda ficaria obrigada a devolver os valores. O financiamento privado continuaria existindo para os partidos que desejem lançar um número de candidatos acima da cota financiada com recursos oficiais.