Título: Bancos buscam vida no mercado de dívida
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Fonte: Valor Econômico, 22/10/2007, Finanças, p. C7

Pode um grupo de bancos ter êxito onde autoridades monetárias fracassaram? A despeito dos melhores esforços empenhados pelos bancos centrais para lidar com o aperto de crédito que se estabeleceu durante o verão, alguns mercados de dívida continuam disfuncionais. Os compradores continuam em greve numa importante parte do mercado de "commercial paper" (papéis de dívida corporativa de curto prazo): o pedaço no qual os chamados instrumentos de investimento estruturado (SIV, na sigla em inglês), que se disseminaram rapidamente nos anos recentes, tomam emprestado para investir em ativos com maior rendimento. Agora muitos desses instrumentos enfrentam dificuldades para rolar as suas dívidas e os bancos, que têm mais a perder com sua morte, estão correndo atrás de soluções.

No dia 15 de outubro, três dos maiores bancos lançaram a primeira grande tentativa do setor privado de mitigar a crise. Citigroup, JP Morgan Chase e Bank of America revelaram a existência de um acordo em princípio para a criação de um fundo que deverá conter até US$ 100 bilhões, que comprará ativos com alta classificação dos SIV em apuros. Outras instituições financeiras estariam considerando se associar à iniciativa. Apesar de não haver dinheiro do governo, o Tesouro dos EUA teve atuação importante nas conversações que levaram à criação do fundo. As autoridades temem que mercados "desordenados" possam atolar a economia.

Os SIV sofrem do mesmo descasamento entre ativos e passivos que aflige bancos regulados; tomam emprestado no curto prazo e investem no longo prazo. Isso funcionou bem quando os mercados estavam tinindo. Agora, porém, as pilhas de títulos lastreados em hipotecas e outros ativos que os instrumentos detêm de repente se tornaram terrivelmente ilíquidos e seu valor de mercado - na medida em que podia ser apurado - despencou. Alguns SIVs precisaram vender ativos a preços de queima para pagar investidores, muitos dos quais relutaram em rolar dívida. Considerando-se que os SIV detêm cerca de US$ 325 bilhões em ativos, vendas forçadas adicionais poderiam ter um efeito depressor sobre os preços de títulos lastreados em ativos no mercado como um todo. Os bancos estão preocupados com a possibilidade de serem obrigados a levar os ativos dos SIVs, que ajudaram a estabelecer, para os seus próprios balanços patrimoniais. A medida colocaria enorme pressão sobre seus coeficientes de capitalização.

O novo fundo, toscamente rotulado "Master Liquidity Enhancement Conduit (canal-mestre para fortalecimento da liquidez)", ou M-LEC, comprará "commercial paper" emitido por SIVs e em seguida emitirá seu próprio papel de dívida de curto prazo, que será apoiado pelos bancos fundadores. Ele comprará ativos a um "preço de mercado", mas há um truque. SIVs que vendem títulos com deságio ao canal compartilharão os ganhos, se o valor do papel subir. O objetivo é superar a relutância dos SIVs em se desfazer de ativos que consideram depreciados.

Apesar das comparações feitas com o socorro prestado em 1998 ao Long-Term Capital Management, um "hedge fund", existe uma diferença notável. Naquela época, o Federal Reserve (ou Fed, o banco central dos EUA) uniu os bancos para ajudar um congênere debilitado. Agora, existe um elemento de auto-resgate. A afirmação certamente se aplica ao Citigroup, que criou mais SIV que qualquer outra instituição; ele está vulnerável a cerca de US$ 100 bilhões em ativos mantidos por esses instrumentos. Os dois outros bancos não possuem SIVs próprios e teriam sido atraídos pela remuneração que poderão ganhar.

É cedo para saber se o plano funciona. Ele se parece mais com a "Resolution Trust Corporation", criada para liquidar as instituições de poupança e de crédito falidas dos EUA na década de 1980, assinala Brad Hintz, da firma de análises Sanford Bernstein. Mesmo os apoiadores do fundo admitem que ele é, na melhor das hipóteses, uma solução temporária. Nas palavras de um banqueiro, ele foi criado para ganhar tempo, para que os problemas reais enfrentados pelos mercados de dívida possam ser equacionados. (Tradução de Robert Banvolgyi).