Título: Indústrias perseguem um modelo mais eficaz
Autor: Filho, Lauro Veiga
Fonte: Valor Econômico, 03/12/2007, Especial, p. F2

Davilym Dourado/valor Roberto Schaeffer, da Coppe/UFRJ: "Eficiência não é ainda uma prioridade para as empresas, à exceção provavelmente dos consumidores de grande porte" Pressionada por exigências ambientais e pela previsão de custos crescentes no setor elétrico, as empresas de geração e a indústria em geral terão que perseguir, inevitavelmente, formas mais eficientes de uso e consumo da energia disponível. "Não há outros caminhos", decreta Adjarma Azevedo, vice-presidente da Associação Brasileira do Alumínio (Abal). Responsável por 47% do consumo brasileiro de energia, o setor industrial vem sendo estimulado pelas próprias geradoras a racionalizar o consumo. "Parece paradoxal incentivar nosso cliente a consumir menos energia, mas esta é uma estratégia que abre outras possibilidades para geradoras e distribuidoras de energia", acrescenta Hugo de Souza, diretor da área de estratégia de geração da Energias do Brasil, holding controlada pela Energias de Portugal (EDP), com capacidade instalada para 1.043 megawatts no país.

Na visão das geradoras, de acordo com Souza, a racionalização do consumo permite adequar a conta da energia ao orçamento da clientela, reduzindo, de um lado, os riscos de inadimplência - o que se traduz em reforço para o caixa - e, de outro, diminuindo a necessidade de investimento em redes de distribuição. Adicionalmente, a maior eficiência resulta em folga proporcional na disponibilidade de energia, o que significa possibilidade de atender a novos usuários, favorecendo a ampliação da base de clientes.

Segundo Roberto Schaeffer, professor de planejamento energético da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), o setor industrial tem potencial técnico para gerar uma economia equivalente a 30% da energia que consome, dado referendado pela Eletrobrás - que aposta na possibilidade de ganhos ainda maiores com a racionalização do consumo entre indústrias.

"Faria sentido econômico para a indústria, no entanto, alcançar uma redução entre 10% e 15%", avalia Schaeffer, diante dos custos que seriam exigidos para se chegar à economia preconizada pelos técnicos do setor. Como a indústria responde por 47% do consumo doméstico, Schaeffer acredita que o país poderia ganhar pelo menos um ano de folga no abastecimento de energia, se a indústria como um todo conseguisse operar uma ampliação de sua eficiência dentro daqueles limites, sem afetar sua capacidade de produção.

"O problema é que a eficiência, devido aos custos atualmente não onerosos da energia, não é ainda uma prioridade para as empresas, à exceção provavelmente dos consumidores de grande porte", aponta Schaeffer. O diagnóstico final sobre o potencial de racionalização do uso da energia na indústria deverá ser concluído até a primeira quinzena de dezembro, num trabalho contratado pela Eletrobrás à Ecoluz, da Bahia, e à Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, e desenvolvido no âmbito do Programa de Eficiência Energética (PEE) - que, por sua vez, é financiado por doações do Global Environment Facility (GEF), com apoio do Banco Mundial e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O cenário atual, marcado por tímidos investimentos em eficiência energética, na avaliação de Schaeffer, poderá ser alterado, daqui para frente, diante da perspectiva de encarecimento dos custos da energia, com possível risco de desabastecimento. E ainda do avanço das discussões de questões ambientais, relacionadas ao aquecimento global, e da necessidade de assegurar fontes de suprimento.

Com ativos novíssimos, como a usina de Peixe Angical, no Tocantins, com capacidade nominal para 452 MW, gerados em parceria com Furnas Centrais Elétricas, e outros com quase quatro décadas, a Energias do Brasil investe na repotenciação dos empreendimentos hidrelétricos mais antigos. "Nossa estratégia pressupõe aproveitar a água da melhor forma possível, aumentando a eficiência da conversão da energia hidráulica em mecânica", afirma Souza. As usinas mais recentes, que incorporam tecnologia mais avançada, conseguem atingir uma taxa de conversão ao redor de 93% a 94%, de acordo com executivo, em comparação com 80% a 85% no caso das mais antigas.

A Energias do Brasil contratou a repotenciação de três usinas no Espírito Santo, num investimento de R$ 102 milhões. As usinas hidrelétricas de Mascarenhas e Suíça, com capacidade respectivamente de 180,5 e 31,59 MW, terão sua geração ampliada para 198 e 34 MW, com ganhos, pela ordem, entre 10% e 8%. Rio Bonito, uma pequena central hidrelétrica (PCH), com capacidade atualmente para 16,8 MW, receberá novas turbinas com poder para gerar 22 MW, um avanço de 31%.

Embora relativos a uma amostra reduzida, os números parecem confirmar os resultados obtidos pelo Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE/USP), num levantamento encomendado pelo WWF Brasil. O trabalho relaciona 67 usinas instaladas há mais de 20 anos, com potência instalada ao redor de 35 mil MW. A modernização dessas usinas poderia agregar ao sistema integrado 8,093 mil MW. "Em grandes números, isso representaria expansão de 8% na capacidade total instalada", calcula Souza.

Furnas tem investido R$ 3 milhões por ano em programas de racionalização do consumo, atuando em parceria com instituições públicas e empresas privadas principalmente na área educacional. Entre os quase 800 municípios atendidos pela estatal, aponta Gilson Machado Bastos, gerente para a área de conservação de energia da geradora, 328 já foram beneficiados com projetos de racionalização em nove Estados. A estatal promove cursos e atua na formação de multiplicadores, responsáveis pela transmissão de conceitos conservacionistas às comunidades atendidas.

Furnas oferece a empresas privadas, prefeituras, escolas e hospitais serviços de consultoria, com diagnósticos que indicam caminhos para ampliação da eficiência no consumo. "Com troca de luminárias e motores a redução do desperdício pode chegar a 40%."

Para empresas eletrointensivas, ignorar políticas de eficiência energética não é exatamente a estratégia mais racional. Na indústria de alumínio, a conta de energia responde por 37% do custo de produção, o que por si justifica "atenção muito grande" à conservação, declara Adjarma Azevedo. "Toda empresa do setor mantém pessoal especializado para pensar políticas de redução de desperdícios e para pesquisar fontes de suprimento mais baratas."

Na última década, o consumo de energia por unidade produzida no setor recuou de 15,2 para 14,9 MWh por tonelada de alumínio processado. Estudos em curso especialmente nos EUA, diz Azevedo, perseguem uma redução na faixa dos 30% no consumo de energia por tonelada do mineral, para algo entre 10,5 a 11,7 MWh por tonelada.

Ao mesmo tempo em que aposta em tecnologias mais eficientes, a indústria retoma investimentos em auto-geração. No ano passado, para uma potência demandada de 2.740 MW, só 27% (740 MW) foram atendidos por geração própria. "Há 14 projetos hidrelétricos sendo trabalhados com a participação de indústrias de alumínio, somando capacidade de 3.940 MW. As empresas tenderão a expandir sua produção ou venderão a energia excedente no mercado", diz Azevedo.