Título: Sigla surgiu como frente parlamentar
Autor: César Felício e Jamil Nakad Junior
Fonte: Valor Econômico, 24/01/2005, Especial, p. A10

O PFL surgiu de um movimento tático: o grupo de dissidentes do PDS, o partido do regime militar, que se reuniu em julho de 1984 pensava em criar um bloco parlamentar, e não um partido. Decididos a não apoiarem a candidatura presidencial de Paulo Maluf, favorito para ganhar a convenção partidária que ocorreria no mês seguintes, os dissidentes sabiam que deixariam que se desligar do PDS para votarem em outro candidato no Colégio Eleitoral. Nas regras de 1984, a fidelidade partidária era implacável: quem pertencia a um partido e apoiava a candidatura de outro estava sujeito até mesmo a perder o mandato. E o grupo que formou a "Frente Liberal" articulava o apoio no Colégio Eleitoral à candidatura do governador mineiro Tancredo Neves, do PMDB. Cumprido o objetivo, a volta ao PDS não fazia mais sentido. Apenas nove dias depois da vitória de Tancredo , os dissidentes constituiram o PFL, em 24 de janeiro de 1985. Foi um partido que já nasceu no poder. "A Frente Liberal só veio para dar sustentação ao presidente Tancredo", disse o primeiro presidente da comissão provisória, o ex-vice-presidente e hoje senador Marco Maciel (PFL-PE). E ao contrário do processo de criação do PT, registrado após um ano e meio de debates ideológicos , teve um nascimento marcado pelo improviso. Até mesmo o nome " Frente Liberal", que batizava o bloco, foi uma denominação criada pela imprensa, e não de um estudado planejamento político, segundo disse Maciel. "A Frente Liberal quando criada não tinha um conteúdo ideológico ou de doutrina. O PFL é produto do voluntarismo brasileiro, espontaneísmo puro", lembra Lembo, hoje vice-governador de de São Paulo e organizador do partido no Estado. O partido nasceu formado por caciques. Na linha de frente dos fundadores, além de Maciel e Lembo, estavam Guilherme Palmeira, senador alagoano que terminou a carreira no TCU, o atual presidente da sigla, senador Jorge Bornhausen (SC) e o então vice-presidente Aureliano Chaves. Maciel e Aureliano eram dois dos pré-candidatos do PDS que tentavam suceder o presidente João Figueiredo, último do regime militar. Ainda disputavam a indicação o ministro do Interior, Mário Andreazza, o preferido dos governadores graças às verbas que distribuía e o ex-governador de São Paulo e na época deputado Paulo Maluf. Figueiredo dizia não ter candidato. A falta de intervenção do presidente levava à vitória de Maluf na convenção da sigla. Com o crescimento da candidatura malufista, Figueiredo resolve fazer uma reunião com os quatro pré-candidatos do PDS, e propõe um pacto que beneficiava o candidato paulista: que todos se unissem para apoiar o vencedor da convenção. A solução acertada com o presidente foi uma prévia interna , que seria articulada pelo presidente do PDS, José Sarney, já aliado dos dissidentes. Era uma fórmula que anulava todo o esforço malufista em cabalar votos dos convencionais. Maluf percebeu a armadilha e se recusou a participar. Convencido pelo paulista Figueiredo voltou atrás e retirou seu apoio às prévias . Sarney rompeu com o governo e renunciou à presidência do PDS. Foi sucedido por Bornhausen, o vice, que alguns dias depois fez a mesma coisa. Maciel e Aureliano retiraram suas candidaturas e se articularam para formar a frente, junto com Bornhausen e Sarney. Andreazza foi até o fim e perdeu para Maluf na convenção. No Palácio do Jaburu, sede da vice-presidência, uma reunião entre lideranças do PMDB e da Frente Liberal marca a formação do que veio a se chamar de Aliança Democrática. Com o documento "Compromisso com a Nação", de 7 de agosto de 1984, foi selado o compromisso de pacto entre o PMDB e a Frente Liberal. e formalizada a chapa de Tancredo para presidente e Sarney para vice. A escolha de Sarney para vice foi um outro produto das circunstâncias. O maranhense tornou-se a opção final por exclusão das demais hipóteses. Aureliano era inelegível por já ser vice. Maciel era tido como o nome natural. O pernambucano, contudo, resistia à escolha e seu nome poderia oferecer problemas legais. A fidelidade partidária impedia chapas mistas. O representante da Frente Liberal teria, portanto, que se filiar ao PMDB. "O Tribunal Superior Eleitoral havia decidido que só aqueles que tinham sido eleitos pela Arena poderiam se inscrever em outro partido. Sem perda de mandato, o mesmo não era permitido aos eleitos em 1982 pelo PDS", relatou Bornhausen em um depoimento ao historiador Arsênio Eduardo Correa. Maciel foi eleito senador pelo PDS naquele ano. Como Sarney tinha sido eleito senador pela Arena, em 1978, estava livre para concorrer. O PFL ganhou um rosto mais próximo do atual no ano seguinte ao da vitória no Colégio Eleitoral, com o ingresso na sigla do senador Antonio Carlos Magalhães e de todo o seu grupo, em janeiro de 1986. Três anos depois, com uma chapa formada por Aureliano para presidente e Lembo para vice, teve uma melancólica participação na única eleição presidencial que concorreu diretamente: recebeu 600 mil votos, ou 0,83% do total. Praticamente a totalidade do partido aderiu, ainda no primeiro turno, à candidatura de Fernando Collor. Na fase intermediária do governo collorido, o PFL tornou-se o sustentáculo do presidente. Bornhausen era o coordenador político, Maciel o líder no Senado e ACM indicou dois aliados para o ministério. No governo Itamar, o partido se dividiu: apenas a ala ligada a Sarney esteve representada no ministério. A sigla fechou a aliança com Fernando Henrique em 1994 dois meses antes do lançamento do Plano Real. Manteve-se no governo até março de 2002, mas não conseguiu se articular como alternativa eleitoral para o poder.(CF e JNJ)