Título: Pefelistas apostam em fim de estigma
Autor: César Felício e Jamil Nakad Junior
Fonte: Valor Econômico, 24/01/2005, Especial, p. A10

O PFL completa 20 anos hoje com sua cúpula apostando no fim de um estigma: a de que a sigla, de algum modo, é um produto do regime militar. Em que pese o fato de a sigla ter nascido de uma dissidência do partido oficial que tornou viável a ascensão da oposição ao poder em 1985, os dirigentes acreditam que a percepção do eleitor nunca foi esta e, que o fato, colaborou para que os pefelistas tenham tido muita dificuldade para articular uma candidatura viável à Presidência. O estigma começou a ser superado no governo Fernando Henrique, cuja sucessão o partido não disputou em função de dois revezes: a morte do deputado Luís Eduardo Magalhães em 1998 e o naufrágio, logo no começo da travessia, da candidatura de Roseana Sarney, ao não responder de maneira politicamente eficaz ao escândalo do caso Lunus. Hoje, o partido tem como principal estrela eleitoral o prefeito do Rio, Cesar Maia, sem relação alguma com o regime autoritário. "Esta coisa está acabando. Faz parte do passado", diz, com alívio, o ex-vice-presidente e hoje senador Marco Maciel (PE), o primeiro presidente que o partido teve. "O PFL apesar de ser uma dissidência, vinha do interior do sistema militar. Creio que isso tenha marcado muito o andar do partido. Agora estão surgindo as lideranças novas. O tempo e a morte levam os preconceitos. Está chegando o fim da geração", afirma outro fundador da sigla, o vice-governador de São Paulo, Claudio Lembo. A iminente saída da senadora Roseana Sarney do partido para assumir um ministério deve fazer com que a direção do partido aumente sua hegemonia interna. E a derrota do senador Antonio Carlos Magalhães (BA) na eleição municipal em Salvador no ano passado, paradoxalmente, impediu a implosão imediata do partido. Se ACM ganhasse, estaria fortalecido para contestar a liderança de Bornhausen e, no limite, sair do PFL e ingressar na base governista. Como não ganhou, a relação entre o carlismo e o governo federal esfriou e a ruptura do tecido pefelista foi mais uma vez adiada. No jogo de tensões do partido, o grupo de Marco Maciel e o prefeito do Rio de Janeiro esperam ser um ponto de união entre ACM e Bornhausen. O baiano não tem como tomar o controle do partido, mas a sua defecção seria um golpe duro, sobretudo na esfera parlamentar: o carlismo representa cerca de um terço da bancada. Com sua relação com o governador da Bahia, Paulo Souto, e o ex-prefeito de Salvador, Antonio Imbassahy, passando por um momento de turbulência, do ponto de vista regional a ACM também não interessa romper. A posição eleitoral de cada um dos caciques do partido expressa os impasses vividos pelo PFL: ACM detém a hegemonia eleitoral na Bahia, mas em trajetória descendente de votos nas duas últimas eleições. Maciel e Bornhausen há muitas eleições não comandam mais a política local em seus Estados. O PFL paulista era uma linha auxiliar do malufismo e hoje o é dos tucanos: é vice de Geraldo Alckmin no governo do Estado e vice de José Serra na prefeitura da capital. Em resumo, quem comanda o partido não tem força eleitoral própria. Só Cesar Maia apareceu como um vencedor nas últimas eleições, ao reeleger-se com maioria absoluta no primeiro turno. A fragilidade regional é um dos maiores problemas caso a candidatura presidencial própria chegue até o fim. O partido é débil eleitoralmente em Estados cruciais como Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Até maio, a cúpula do PFL pretende promover o que se chama de refundação, que passará pela reformulação do programa partidário e pela busca de uma definição ideológica clara. Será a nova tentativa do governo de ganhar densidade eleitoral nacional. "Nossa doutrina é de conservação de valores. Se eu dissesse que o PFL é revolucionário seria ingênuo. O povo brasileiro é conservador, a favor do bom senso e contra bravatas" disse Lembo. Para o vice-governador, "o voto conservador é um voto de preservação, que sabe escolher na hora certa aquele candidato que irá representar a tradição, o equilíbrio e o bom senso", diz. Para os pefelistas, a definição conservadora do partido pode ser identificada pelo eleitor como uma questão de coerência. Em um debate com o PT, cobrado pela mudança de posições ao chegar ao poder, o partido poderia lucrar com esta imagem. A mudança do nome do partido, que chegou a ser defendida por Cesar Maia, é uma inovação praticamente descartada. Não apenas atraiu a antipatia de Antonio Carlos Magalhães, o maior opositor de Bornhausen dentro do PFL, como tornou-se combatida pelo grupo de Marco Maciel, o que lhe foi fatal. "PFL é um nome já consolidado", afirmou o ex-vice-presidente. Seu amigo Cláudio Lembo foi mais contundente. "Os partidos quando têm tradição e tem respeito por si próprio preservam seus símbolos. Só aqueles que tem má vida mudam o nome, ninguém com a vida reta", disse. Face a isto, Bornhausen já comunicou que colocará a proposta em discussão, sem se comprometer com a sua defesa. Com a imagem reciclada e um presidenciável escolhido, o partido vai começar uma pré-campanha que provavelmente vai desaguar no apoio pefelista ao candidato do PSDB à Presidência. A candidatura presidencial de Cesar Maia só existirá a partir de um patamar mínimo de intenção de voto, que o coloque melhor situado que os tucanos. "O processo é na direção da candidatura própria, mas isto não quer dizer que necessariamente teremos candidato a presidente", afirmou Maciel. "Não jogaria minhas fichas na inexistência de união entre PSDB e PFL. Essa questão está em aberto", afirmou Lembo.