Título: Bolsa Família ajuda pouco o crescimento, aponta estudo
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 05/12/2007, Brasil, p. A6

Rafael Jacinto/Valor Carlos Roberto Azzoni, da FEA/USP: quem mais perde é a administração pública De 2003 a 2006, o Bolsa Família contribuiu para reduzir as desigualdades de renda entre as regiões do país e entre os indivíduos, mas teve um pequeno efeito negativo sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) - considerando que os recursos para o programa vieram da redução de outras despesas correntes da União. O impacto negativo sobre o PIB brasileiro foi de 0,48 ponto percentual em quatro anos, o equivalente a 0,12 ponto percentual ao ano, segundo o professor Carlos Roberto Azzoni, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). No caso do Nordeste, porém, a expansão da economia foi beneficiada em 4,6 pontos percentuais de 2003 a 2006, uma média anual de 1,1 ponto. As regiões Sudeste e Centro-Oeste é que jogaram o resultado nacional para o terreno negativo.

Os números fazem parte de um estudo apresentado ontem por Azzoni no 35º Encontro Nacional de Economia da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec), em Recife. De 2003 a 2006, o Bolsa Família injetou R$ 24,172 bilhões na economia, uma média de 0,45% do PIB por ano. O estudo mostra o impacto dessas transferências nas cinco regiões do país, estimando o efeito sobre 21 setores da economia.

Duas simulações foram feitas. A primeira, considerando que os R$ 24,172 bilhões foram um aumento absoluto nos gastos do governo. Nesse caso, o resultado mostra um aumento de 2,96% do PIB de 2003 a 2006, ou 0,74% por ano. A questão, porém, é que essa simulação é irrealista, segundo os autores, por partir do princípio de que há uma elevação dos gastos correntes para bancar o Bolsa Família. A outra simulação considera que a despesa total do governo é constante, e os pagamentos extras para as famílias são subtraídos dos outros gastos correntes. A distribuição prévia das despesas correntes foi usada para distribuir o montante compensado entre setores e regiões.

É nesse cenário - mais realista, segundo Azzoni -, que o impacto do programa sobre o PIB brasileiro aparece como ligeiramente negativo e aponta um PIB 0,48 ponto percentual menor do que se as despesas correntes do governo não incluíssem o Bolsa Família. "Isso ocorre porque os efeitos multiplicadores dos setores da economia negativamente afetados são maiores do que os que são positivamente afetados ", defende o estudo.

Quem mais perde é a administração pública, mas também há efeitos negativos relevantes em serviços para empresas, serviços para famílias, serviços não mercantis e comunicações. O impacto adverso para a administração pública ajuda a entender os números surpreendentemente negativos para o Centro-Oeste, com efeito negativo de 9,51% em quatro anos. "Isso decorre da presença do governo em Brasília", avalia Azzoni.

Como esperado, o Nordeste é o que mais se beneficia do Bolsa Família, com uma alta adicional de 4,6% do PIB de 2003 a 2006. Os resultados mais positivos aparecem nos segmentos de agricultura, alimentos industrializados, transportes e aluguéis, que se mostraram mais sensíveis ao aumento de renda dos mais pobres.

O efeito do programa sobre a desigualdade de renda foi favorável. O índice de Gini (um dos indicadores mais importantes de desigualdade) do Brasil caiu de 0,528 para 0,5259, segundo cálculos dos pesquisadores. Quanto mais próximo de zero, menor a desigualdade. O Bolsa Família também tem ajudado a reduzir as diferenças entre as regiões do país. O Nordeste, que abocanhava 12,9% do PIB brasileiro em 2002, apareceu com 13,56% em 2006. A região Norte teve um avanço modesto, mas viu sua fatia ir de 4,76% para 4,83%.

Também assinam o estudo "Social policies, personal and regional income inequality in Brazil: Analysis of the Bolsa Familia Program", os professores da USP Joaquim Guilhoto e Eduardo Haddad, os alunos da USP Marco Laes e Guilherme Moreira, e Geoffrey Hewings, da Universidade de Illinois.