Título: Relatório da Iata aponta falhas na segurança do transporte aéreo do país
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2007, Brasil, p. A2

A Associação Internacional de Companhias Aéreas (Iata) aponta a persistência de "deficiências e lacunas importantes" na segurança operacional do transporte aéreo no Brasil, às vésperas de maior fluxo de passageiros, com as festas de fim de ano.

Giovanni Bisignani, presidente da entidade, disse ao Valor que "o controle aéreo deve ser completamente remanejado" no país, insistindo que "isso é prioridade número um, pois não se brinca com a vida humana".

A entidade colocou o Brasil, Indonésia e países da África na lista prioritária para melhorar a segurança aérea ao verificar que nesses locais as taxas de acidentes se encontram acima da média mundial.

Representante da indústria global do transporte aéreo, a Iata transmitiu ao Ministério da Defesa o relatório de recente missão técnica que enviou o Brasil, com recomendações para superar a crise do setor.

No documento, de 32 páginas, ao qual o Valor teve acesso, seus técnicos constatam que o sistema de controle e quatro aeroportos inspecionados - Guarulhos, Viracopos, Galeão e o de Brasília - preenchem as "exigências mínimas" para vôos domésticos e internacionais. Ou seja, não estão mais adequados à expansão do tráfego aéreo no país e isso se reflete nas deficiências e lacunas, com impacto negativo em termos de "confiabilidade e eficiência".

Para os inspetores da Iata, as instalações do controle aéreo até parecem operar de maneira profissional e os equipamentos em boas condições. Mas o número de incidentes reportados pelas empresas aéreas confirma a percepção de controle instável, ineficiente e que compromete a segurança dos vôos.

A entidade aponta problemas na comunicação entre pilotos e controladores de vôo, porque não se entendem em inglês. Estima que o Brasil será incapaz de cumprir em março do próximo ano a exigência da Organização Internacional da Aviação Civil (Icao) sobre o nível de proficiência em inglês dos controladores. Apóia-se no alto número de "stand-by" (espera) ou "não respostas" dos controladores, quando os pilotos consultam o controle de tráfego.

A Iata recomenda ao Departamento de Controle Aéreo e à Infraero que acelerem com urgência o treinamento dos controladores na língua inglesa, diante da crescente preocupação com a segurança aérea no país.

Outro problema é a utilização de "clearance limit" (limites de autorização), que definem os pontos até onde a aeronave é autorizada a prosseguir na rota. Para a Iata, a maneira como o Brasil utiliza o mecanismo não está em conformidade com as regras da Icao e pode causar mais confusão e desentendimento entre controladores e pilotos, que seriam obrigados às vezes a refazer planos de vôos rapidamente. Isso afeta sobretudo os vôos que têm como destino a América do Norte e os vizinhos da América do Sul.

O relatório aponta também problemas nos instrumentos eletrônicos de auxílio de navegação, alguns fora de serviço "há anos". Igualmente, sistemas de aproximação de precisão por satélite, que aumentam a segurança e eficiência para tripulação e controladores, até agora não foram certificados pelo país.

A Iata aconselha o governo a desenvolver rotas mais eficientes e curtas, inclusive por razões ecológicas e redução de custos, exemplificando com algumas rotas que retardam a aterrisagem. Conclama o governo a reagir também a interferências de comunicação causados por rádios piratas e sistemas de telefones que atrapalham os contatos entre aeronaves e a torre de controle, nas proximidades dos aeroportos de Guarulhos e do Recife, principalmente.

O fluxo de gestão do tráfego aéreo recebe críticas. Aponta falta de informação sobre atrasos de vôos no país. Controladores não atualizam o momento da partida para os pilotos. Mas seus inspetores constataram que há muitos balcões para atendimento na migração, controle de passageiros etc, mas freqüentemente falta gente atendendo, causando enormes filas.

Segundo o documento, a falta de capacidade nos aeroportos será um problema crescente, com o aumento do número de passageiros. O relatório sugere uma série de medidas técnicas para os aeroportos, como reforma ou ampliação de pistas de pouso. O aeroporto de Guarulhos é o que se sai melhor na avaliação dos inspetores.

"Tudo o que a Iata fala é que estamos no limite", interpreta Ronaldo Jenkis, diretor-técnico do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea). "O governo gastou dinheiro em terminais suntuosos e esqueceu da parte operacional."