Título: Diretor da AIEA visita instalações e elogia programa nuclear brasileiro
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2007, Brasil, p. A2

O egípcio Mohamed ElBaradei, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), deu aval irrestrito ao programa nuclear brasileiro ao visitar ontem as instalações da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), em Resende, região sul do do Rio de Janeiro. "É natural que o Brasil procure alternativas ao petróleo e o gás. Desde que seja com segurança e para fins pacíficos, a energia nuclear é um bom negócio", afirmou, ao responder a uma pergunta sobre como via o projeto brasileiro de construir de quatro a oito usinas nucleares até 2030.

Segundo o presidente da INB, Alfredo Tranjan Filho, na conferência interna que fez com a participação dos principais dirigentes do setor nuclear brasileiro, ElBaradei disse que o projeto do Brasil era até modesto, na medida em que prevê que a energia nuclear corresponderá a 5,7% da matriz energética em 2030.

"Ele disse que o Brasil pode almejar uma quantidade maior, porque tem tecnologia e matéria-prima (urânio)", afirmou Tranjan. Pela programação brasileira, além das duas usinas nucleares hoje existentes no país (Angra 1 e 2), será construída até 2014 a usina Angra 3 e mais quatro outras de 1.000 megawatts, se a economia crescer a 4,1% ao ano, ou mais oito, se o crescimento for superior a 5% ao ano.

ElBaradei foi o primeiro estrangeiro a ver integralmente a fábrica de enriquecimento de urânio, ainda em fase piloto, que faz parte do complexo da INB em Resende. A unidade foi objeto de muita controvérsia entre o Brasil e a AIEA, apoiada pelo governo americano, entre o começo de 2004 e 2006, quando a fábrica entrou em produção. A controvérsia tinha como ponto central justamente a falta de acesso às instalações. O Brasil alegava segredo tecnológico e a AIEA reclamava de falta de transparência.

Apesar de insistir em não mostrar as máquinas de enriquecimento - feito com tecnologia de centrifugação - aos inspetores da AIEA, que visitam até três vezes por ano suas instalações, a INB conseguiu convencê-los de que não há possibilidade de retirar combustível ao longo do processo de enriquecimento para outros fins que não a geração de energia elétrica

A AIEA monitora com câmeras a entrada e a saída do urânio das chamadas cascatas de centrífugas, onde é feito o enriquecimento. As máquinas são construídas pela Marinha do Brasil em Aramar, no Estado de São Paulo. O projeto da INB é ter, até meados de 2008, centrífugas em número suficiente para iniciar a produção comercial de urânio enriquecido. Em 2010, segundo o cronograma, o enriquecimento corresponderá a 60% das necessidades de Angra 1 e 2, e em 2014, a 100%.

"Ele pode (ver as máquinas) porque é um embaixador", disse Tranjan para explicar a iniciativa de mostrar as centrífugas a ElBaradei. "A vinda dele aqui é simbólica. Vendo nossa tecnologia, torna claro o quanto é transparente o nosso programa", disse o presidente da INB. Quando o enriquecimento entrar em operação comercial, a fábrica da INB, à margem da rodovia Presidente Dutra (Rio-São Paulo), só não fará uma das fases de preparação do combustível nuclear, a gaseificação prévia ao enriquecimento, por não ser considerada uma etapa comercialmente viável. Ela é feita no Canadá, enquanto o enriquecimento é hoje feito pelo consórcio Urenco, composto por Alemanha, Holanda e Reino Unido. Após o enriquecimento, o urânio é transformado em pastilhas que, colocadas em varetas, alimentam os reatores de Angra 1 e 2. Juntas, elas geram cerca de 2 mil megawatts, pouco mais de 2% da matriz energética do país.

A visita do diretor-geral da AIEA à INB durou pouco mais de duas horas. Na saída, em rápida entrevista, ele elogiou o programa nuclear brasileiro e disse que não podia fazer uma avaliação quanto à segurança da fábrica de enriquecimento por não ser técnico, mas ressaltou que os inspetores da agência estão sempre visitando as instalações e que não há restrições à unidade.

ElBaradei disse que há no mundo inteiro um movimento de expansão do uso da geração elétrica de origem nuclear, especialmente agora, sob pressão do aquecimento global. Ele ressaltou que a energia nuclear é um fator de independência sob vários aspectos e destacou que o Brasil "chegou a um nível avançado" e que vem usando a energia atômica para vários fins pacíficos, da indústria à agricultura. Destacou que o país precisa aumentar seu consumo de energia elétrica, que é de 2.600 kilowatts por hora anuais, contra 8.600 kilowatts dos países ricos.