Título: Indústria perde espaço, avaliam economistas
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2007, Brasil, p. A5

A produção industrial cresce com força neste ano, mas estudos acadêmicos que analisam o comportamento do setor em prazos mais longos mostram um quadro mais preocupante para o segmento - e para toda a economia. Para um grupo de economistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a queda na participação relativa da indústria no emprego e no valor adicionado da economia a partir dos anos 80 indica que está em curso um processo de desindustrialização, com uma característica bastante negativa: não só há um encolhimento do emprego formal nos setores industriais mais dinâmicos e de maior conteúdo tecnológico como os segmentos de serviços que mais criam vagas são os de baixa tecnologia e produtividade, como o comércio varejista e a administração pública. Um estudo de Laura Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por sua vez, mostra uma indústria que passa por uma especialização prematura a partir do começo dos anos 90.

Os dois trabalhos foram apresentados ontem em Recife, no 35º Encontro Nacional de Economia da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec). O professor Márcio Cruz, da UFPR, reconhece que o termo desindustrialização é polêmico, mas acredita que ele é adequado para definir a perda de importância da indústria no PIB e no emprego que vem ocorrendo a partir dos anos 80.

O principal foco de interesse dos economistas da UFPR é analisar a evolução do emprego industrial, usando números do Relatório Anual de Informações Sociais (Rais) de 1985 a 2005. A indústria de transformação, que respondia por quase 30% do estoque do emprego formal na metade dos anos 80, viu sua participação encolher para pouco menos de 20% em 2005. O que é mais preocupante, segundo Cruz, é que há uma perda de terreno nos segmentos de média e alta tecnologia.

A fatia dos empregos nos setores de média tecnologia caiu de 26% do total da indústria de transformação no fim dos anos 80 para a casa de 22% em 2005. Quem mais cresceu no período foram os setores baseados em recursos naturais, como commodities, de 28% para 32%. Para tornar o quadro mais delicado, no setor de serviços os segmentos que mais crescem são aqueles que têm baixa tecnologia e produtividade. De 1985 a 2005, foram criados 2,934 milhões de empregos no comércio varejista, e sua participação no total do setor de serviços aumentou de 16,2% para 21% no período.

O trabalho de Laura, quem tem o professor da UFRJ David Kupfer como co-autor, analisa a transição da indústria brasileira da diversificação para a especialização. Na comparação com outros países, o estudo indica que o Brasil entrou prematuramente no processo de especialização de sua estrutura industrial, no qual um número menor de setores ganha mais peso. Laura analisou o valor de transformação industrial (VTI) do país de 1966 a 2003, para 17 setores.

O modelo usado por ela indica que a indústria brasileira começou uma fase de maior especialização no começo dos anos 90, num momento em que a renda per capita do país era de US$ 4 mil (medidos em dólares de 1990). Em outros países analisados, essa transição ocorreu quando a renda per capita já era mais elevada: no caso da Coréia do Sul, com uma renda de US$ 8 mil; no de Taiwan, com US$ 12 mil; a Austrália, com US$ 18 mil.

Os estudos, é bom frisar, mostram a situação da indústria com alguma defasagem. O de Cruz usa números até 2005 e o de Laura, até 2003. Os dois acreditam que ainda é cedo para dizer que o forte crescimento da indústria neste ano indica que está em curso uma mudança nesse cenário pouco animador desenhado pelos trabalhos.

A partir de 2005, a indústria vem aumentando a sua produtividade com crescimento simultâneo do emprego industrial. Isso rompe com o padrão anterior, em que a produtividade crescia, mas com a indústria reduzindo o número de vagas. No primeiro semestre deste ano, por exemplo, a produtividade aumentou 3,5% em relação ao mesmo período do ano passado. Houve expansão de 4,8% no emprego de janeiro a junho - as horas pagas aos trabalhadores tiveram alta de 1,3% no período.