Título: O STF e o controle de constitucionalidade
Autor: Paola , Leonardo Sperb
Fonte: Valor Econômico, 13/12/2007, Legislação & Tributos, p. E2

Em entrevista ao Valor em 18 de outubro, o ministro Gilmar Mendes enalteceu os avanços e as melhorias no controle da constitucionalidade das leis pelo Supremo Tribunal Federal (STF), entre os quais a modulação temporal dos efeitos das declarações de inconstitucionalidade, a súmula vinculante e a repercussão geral. De fato, estas novidades contribuíram para modernizar o sistema de controle, mas não se revelaram suficientes para resolver satisfatoriamente dois problemas fundamentais: a demora e a instabilidade das decisões. E é disto que queremos tratar neste espaço.

Quanto à demora, o tempo médio entre o surgimento de uma questão de inconstitucionalidade e a sua resolução pelo Supremo deve, provavelmente, superar os cinco anos. Dizemos provavelmente porque ainda não existem estatísticas disponíveis a este respeito. Mas basta considerar que são várias as ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) aguardando julgamento há mais de dez anos. Diversas são as razões para esta tardança: as múltiplas competências do Supremo, especialmente em matéria criminal; o regime difuso de controle da constitucionalidade; e as sucessivas suspensões de julgamentos durante seu curso. Com isto, passam-se vários anos até a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade de uma norma, e surge a questão: o que fazer com as situações pretéritas? A modulação de efeitos é um mero paliativo. Melhor seria evitar a demora.

Já no tocante à instabilidade das decisões e à insegurança que isto provoca nos jurisdicionados, consideramos que suas principais causas são as decisões colegiadas tomadas por maiorias eventuais e depois revertidas por outras maiorias eventuais; as decisões provisórias concedidas em liminares; e a desconcentração do controle de constitucionalidade propiciada pelo sistema de controle difuso, ou seja, a questão constitucional pode ser apreciada em qualquer instância.

Para cada um destes males, há soluções práticas e bastante conhecidas. Em primeiríssimo lugar, sejamos claros, é impossível resolver o problema da lentidão enquanto o Supremo mantiver o atual leque de competências. É preciso transformá-lo em uma corte constitucional, seguindo o modelo europeu, com a exclusiva atribuição de controle da constitucionalidade das leis, transferindo todas as demais ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) - que, para tanto, deveria ter ampliado seu quadro de ministros.

Além disso, há que se alterar o mecanismo de controle difuso de constitucionalidade. Hoje, antes de chegar ao Supremo, via recurso extraordinário, uma questão constitucional é apreciada em até três instâncias. O que se propõe no lugar deste longo trajeto é o mecanismo de envio direto da questão constitucional ao Supremo da seguinte maneira: no momento em que tiver que ser enfrentada uma questão desta natureza (prejudicial de inconstitucionalidade), o processo será suspenso e a matéria será remetida ao Supremo. Julgada a questão na corte, o processo será retomado e o julgador deverá obrigatoriamente aplicar o entendimento em todos os processos, e não apenas naquele originário. Enfim, retira-se das demais instâncias a competência para apreciar questões constitucionais e cria-se uma linha direta com o Supremo. As vantagens: unifica-se nele o controle da constitucionalidade, evitando decisões díspares nas diversas instâncias acerca da matéria e abrevia-se a chegada da questão ao Supremo. Notemos que o atual regime de repercussão geral é um passo tímido nessa direção.

Ainda no que tange ao problema temporal, resta tratar da duração do julgamento no próprio Supremo. Aqui, o principal fator de atraso, após iniciado o julgamento, consiste nas sucessivas e prolongadas interrupções em razão de pedidos de vista feitos por ministros, da seguinte forma: o relator apresenta seu voto, em seguida um dos demais ministros pede vista, ficando suspenso o julgamento, o ministro que pediu vista devolve o processo com seu voto e um segundo ministro pede vista - e assim sucessivamente. Com isto, e há vários exemplos, um único julgamento prolonga-se por três, quatro, cinco ou mais anos. Para acabar com esta prática, basta prever que o julgamento poderá ser suspenso uma única vez e somente até a sessão subseqüente, quando forçosamente será retomado até seu fim.

Por fim, no tocante à instabilidade jurisprudencial e à insegurança jurídica dela decorrente, sugerimos que as questões constitucionais só possam ser apreciadas pelo pleno do Supremo; que o reconhecimento da inconstitucionalidade de uma norma demande uma maioria qualificada de dois terços dos ministros - ou seja, sete ministros, desprezando-se a fração; e que a reapreciação de questão já julgada anteriormente exija o mesmo quórum deliberativo. Isto valeria também para a apreciação de liminares - por sinal, concedida uma liminar, o julgamento definitivo da matéria deveria ocorrer em um prazo não superior a 30 dias. Com estas mudanças, seria possível estabelecer um prazo máximo para o julgamento das questões constitucionais não superior a um ano, findo o qual haveria o trancamento da pauta do Supremo, ou seja, nada mais poderia ser julgado enquanto o processo em questão não fosse encerrado. São as idéias que submetemos a debate.

Leonardo Sperb de Paola é advogado, sócio do escritório Rivera & De Paola Advogados e professor de direito da FAE Business School

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