Título: Consenso, artigo raro na Esplanada
Autor: Pariz,Tiago; Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 28/01/2011, Política, p. 2

Divergência entre Mantega e Gilberto Carvalho sobre a atualização da tabela do Imposto de Renda acirra ânimos entre Executivo e centrais sindicais e é novo exemplo de que os discursos no primeiro escalão estão longe da afinação ideal

O governo está tendo dificuldade em encontrar um discurso afinado nas discussões sobre os reajustes do salário mínimo e da tabela do Imposto de Renda. Ainda que a presidente Dilma Rousseff tenha enfatizado na primeira reunião de seu mandato a importância de unificar declarações na Esplanada, o mais comum tem sido ver ministros com opiniões divergentes, detalhes de negociações confirmados por uns e descartados por outros e vaivém nas posições.

Depois de voltar de um período de 10 dias de férias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, negou que esteja em estudo a correção das faixas salariais da tabela do IR. Assim, desautorizou o ministro da Secretaria-Geral, Gilberto Carvalho, que disse haver uma tendência pelo reajuste de 4,5% ¿ o mesmo aplicado nos últimos quatro anos. Ao ser indagado sobre a possibilidade da correção da tabela, o ministro disse: ¿Isso não está sendo estudado¿. Apesar da negativa, o tema foi discutido na reunião de quarta-feira entre o governo e seis centrais sindicais. Mantega foi representado no encontro pelo secretário executivo do ministério, Nelson Barbosa.

Durante o encontro, os dirigentes sindicalistas, que pregam a correção em 6,46%, defenderam a Gilberto Carvalho a necessidade de fazer um acordo para os próximos quatro anos. ¿O Mantega estava em férias e desatualizado. Todo mundo sabe que essa negociação está pautada¿, afirmou o presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Antonio Neto. ¿O Mantega está chutando o balde. Essa negociação existe sim e o governo está fazendo os cálculos¿, acrescentou.

A crítica ecoou em outros dirigentes. ¿O Mantega não participou da reunião e está fazendo comentários diferentes do resto do governo. Está colocando uma situação ultrapassada. Ficou claro que vamos conseguir a correção¿, disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores, Ricardo Patah.

Desconfiança Nessa confusão, sobrou também para Gilberto Carvalho. O diretor da Força Sindical, Lucas Nery, disse que o ministro demonstra insegurança na condução das conversas. ¿Ele parece não ter as coisas bem definidas. Não estamos sentindo confiança nele nem muita tranquilidade¿, afirmou o dirigente.

As críticas dos sindicalistas ocorrem num momento em que o governo não demonstra intenção de flexibilizar a proposta. A ordem da presidente Dilma Rousseff é manter o mínimo em R$ 545 e dar a correção da tabela nos mesmos percentuais dados desde 2007. Vendo a firmeza dos negociadores do Planalto, os sindicalistas viram-se obrigados a diminuir as expectativas.

As centrais começaram a negociação reivindicando o mínimo de R$ 580, passaram a R$ 560 e ontem disseram que se chegar a R$ 550 estaria mais do que bom. O mesmo ocorreu na tabela do IR. ¿Se o acordo for para os próximos quatro anos, fechamos em 4,5%. Se for só para este ano, a proposta é 6,46%¿, afirmou Neto, da CGTB. Na Força Sindical, o recuo é por uma proposta que varia de 5% a 5,5%. ¿Não pode simplesmente largar uma porcentagem por ano. Precisamos de um acordo até 2015¿, disse Nery.

Apesar de as negociações terem começado oficialmente na quarta, o Planalto e a equipe econômica não deram sinal de que pretendem aumentar o valor do mínimo, mesmo com as centrais dizendo que aceitariam R$ 550. O argumento é que o acordo precisa ser mantido sob pena de complicar o texto do ano que vem.

Para sensibilizar os sindicalistas, o governo promete editar uma medida provisória que preveja a regra da correção do mínimo até 2015 e lembra que, no ano que vem, o aumento ficará ao redor de 14%: cerca de R$ 620.

IMPACTO DA CORREÇÃO De acordo com a Receita Federal, o impacto da correção da tabela depende do texto aprovado. Como se trata de uma alteração que vai beneficiar o contribuinte, reduzindo o valor que ele terá descontado na folha de pagamento, a medida pode ser editada com efeito retroativo a janeiro. Os sindicalistas argumentam haver uma desatualização de 71,5% na tabela do IR, levando-se em conta o período de janeiro de 1995 a dezembro de 2010.

Sintonia em baixa

As declarações conflitantes de Mantega e Gilberto Carvalho mostram, mais uma vez, que o padrão de discurso que Dilma Rousseff cobrou dos ministros não se aplica à vida prática. A novela do salário mínimo é outro sintoma disso.

Guido Mantega, ministro da Fazenda, em 4 de janeiro ¿É temerário aumentar o mínimo além de R$ 540. Se vier coisa diferente, vamos vetar. Um reajuste acima desse patamar pressiona os gastos da Previdência, causa deterioração das contas públicas e dificulta o resultado fiscal que pretendemos¿

Carlos Lupi, ministro do Trabalho, em 11 de janeiro ¿O Congresso é soberano. O que o Congresso definir nós todos teremos que aceitar, porque é o Congresso que decide¿

Miriam Belchior, ministra do Planejamento, em 26 de janeiro ¿Os R$ 545 são reflexo do que foi discutido com eles (centrais sindicais) em 2005 e que a gente vem aplicando todos os anos. Nos parece que não é o caso de mudar¿

Novos limites

O governo admite corrigir em 4,5% as faixas de cobrança do imposto, elevando em pouco mais de R$ 67 reais o limite de isenção, para R$ 1.566,61. Veja como é atualmente e como ficará a tabela, caso a proposta do governo seja mantida.

Tabela atual

Faixas salariais - Alíquota Até R$ 1.499,15 - Isento De R$ 1.499,16 até R$ 2.246,75 - 7,5 % De R$ 2.246,76 até R$ 2.995,70 - 15,0% De R$ 2.995,71 até R$ 3.743,19 - 22,5% Acima de R$ 3.743,19 - 27,5% Corrigida em 4,5%

Faixas salariais - Alíquota Até R$ 1.566,61 - Isento De R$ 1.566,62 até R$ 2.347,85 - 7,5% De R$ 2.347,86 até R$ 3.130,50 - 15% De R$ 3.130,51 até R$ 3.911,63 - 22,5% Acima de R$ 3.911,63 - 27,5%