Título: G-20 quer dar reviravolta em questão de subsídios
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2005, Internacional, p. A7

O Brasil e os outros países do G-20 deram uma reviravolta na negociação agrícola na Organização Mundial de Comércio (OMC), sinalizando que consideram insuficiente e querem mudar um compromisso acertado em julho do ano passado que havia desbloqueado a Rodada Doha. Pelo acordo, os principais usuários de subsídios agrícolas domésticos - EUA, União Européia, Japão e outros - fariam cortes de 20% já no primeiro dia de implementação do futuro acordo agrícola. Mas ontem, um dia depois de o governo Bush anunciar a intenção de reduzir 5% dos subsídios internos aos produtores americanos, o Brasil e o G-20 deram a mensagem: querem uma fórmula que assegure corte real bem maior nessas subvenções desde o primeiro dia, no que é chamado de "downpayment", no jargão da OMC. Para o Brasil, os 20% estão longe de satisfazer, porque na verdade são "água". Ou seja, só reduz o limite máximo atual permitido para os ricos darem subsídio, sem refletir o volume de dinheiro realmente dado aos agricultores, que é menor. Assim, cortam um teto hipotético e mantêm na prática o mesmo volume de subvenções. Em contrapartida o Brasil se declara pronto a negociar uma fórmula que corte também não só a partir da tarifa consolidada (o máximo que o país pode impor, que é em média de 35%), para levar em conta também a tarifa realmente aplicada (que é em média 12%). O Canadá foi mais específico. Defendeu uma fórmula com quatro bandas de corte de subsídios internos. A primeira , que reduz mais, é para a União Européia. Segundo os canadenses, a UE é responsável globalmente por 41% do apoio doméstico distorcivo. A segunda banda é para o Japão (19%) e os Estados Unidos (18%); a terceira para países emergentes, que não dão mais do que 5% dos subsídios distorcivos ao comércio; e, em quarto, vêm outros países em desenvolvimento. Por sua vez, o Grupo de Cairns, reunindo 17 países exportadores agrícolas incluindo os do Mercosul e liderado pela Austrália, vai protestar hoje contra volta de subsídios à exportação que a União Européia (UE) já tinha eliminado anteriormente. O grupo divulgará comunicado reclamando que os europeus estão dando de novo, desde o começo do mês, subsídios para exportar trigo, pela primeira vez desde junho de 2003, jogando novas duvidas sobre a real intenção européia de assumir compromissos nessa área nas negociações da OMC. No acordo de julho do ano passado, justamente o principal avanço na negociação agrícola foi o compromisso de se eliminar os subsídios a exportação. A questão desde então passou a ser sobre o tempo que se tomará para a abolição dessas subvenções, se cinco, sete ou dez anos, como querem diferentes grupos de países. Mas Bruxelas deu marcha a ré no caso do trigo sob a alegação de que precisa proteger seus produtores contra efeitos da flutuação no mercado de cambio. Esta semana, os 148 países-membros da OMC estão fazendo uma nova sessão especial de negociação agrícola, onde o principal tema é como chegar a um fórmula para cortar os subsídios domésticos distorcivos. E, como não poderia deixar de ser, todo mundo está examinando o projeto anunciado pela administração Bush de cortar 5% dos subsídios domésticos por razões internas. Para boa parte dos negociadores na OMC, os EUA vão na direção certa. Mas a questão é de até que ponto isso será suficiente para fazer diferença no comércio global agrícola. De um lado, se o Orçamento de Bush for aprovado no Congresso, afetará a capacidade dos grandes produtores americanos receberem subsídios por mais de uma fazenda, como ocorre no caso de produtores de arroz e algodão. De outro lado, porém, certos negociadores vêem "pura propaganda" no gesto de Bush, por saber da resistência no Congresso. O secretário de agricultura americano, Mike Johanns, já ressalvou que certos cortes vão ser "compensados" por assistência em programas de alimentação. Há expectativa sobre a disputa no Congresso entre o lobby da agricultura, de um lado, e o lobby dos armamentos, de outro. A interpretação de alguns é de que parte do dinheiro que sairá da agricultura irá para a defesa.