Título: Erros de 2007 sugerem prudência em 2008
Autor: Gaffen , David
Fonte: Valor Econômico, 28/01/2008, Finanças, p. C2

Se o segundo semestre de 2007 é prova de algo, é de que Wall Street não fez um trabalho muito bom de planejamento para desastres este ano - se é que fez algum.

Afirmações de que o desaquecimento no mercado imobiliário americano e de que os problemas nas hipotecas de alto risco, ou subprime, estavam contidas acabaram se provando incorretas. Os mercados globais foram atingidos pelo pior aperto de crédito desde a desvalorização russa de 1998. As estimativas de lucro das empresas americanas se provaram excessivamente otimistas.

Muita coisa pode dar certo em 2008. Os consumidores americanos podem continuar gastando e manter a economia firme. Os bancos podem superar seus problemas com créditos imobiliários. A inflação pode se acalmar. Mas considerando o que ocorreu em 2007, vale a pena ficar atento aos riscos. Aqui, alguns pontos a observar:

Recessão - O maior risco para os mercados financeiros seria uma recessão nos Estados Unidos. Isso teria impacto nos lucros das empresas, que já estão na descendente, dificultaria muito mais para os bancos limpar seus balanços e poderia fazer com que um problema americano se transformasse em mundial.

Os dados mais recentes não apontam nessa direção. Pelo menos não por ora. O consumo das famílias americanas em novembro, segundo dados divulgados na sexta-feira, foi de fato surpreendentemente forte. Mas novos declínios no valor dos imóveis residenciais, ou uma desaceleração no crescimento da oferta de emprego, podem custar aos consumidores.

Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve, e Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro dos EUA, advertiram para o risco de recessão. Num levantamento de novembro do WSJ.com, economistas consideraram que há 38% de chances de recessão em 2008.

O que é especialmente preocupante é que o Fed pode não estar em boa posição para lidar com uma recessão. A inflação está em alta. Por isso, o Fed não está nas melhores condições de cortar os juros caso a economia se retraia.

Bolhas aqui e ali - Os investidores entraram na onda do investimento global. De acordo com o Investment Company Institute, a associação americana de fundos, os fundos de ações não-americanas captaram quase US$ 273 bilhões líquidos do começo de 2006 a outubro de 2007. Os fundos americanos tiveram saída líquida de US$ 9,77 bilhões nesse período.

Os índices MSCI Barra de Índia e China subiram 59,5% e 54,3%, respectivamente, neste ano, até 18 de dezembro. Nos últimos cinco anos, os retornos anuais de ambos os países ficaram na faixa dos 40%.

De acordo com a firma americana de análise Bespoke Investment Group, o fundo negociado em bolsa que procura acompanhar o principal índice da China, o composto de Xangai, tem uma relação entre cotação e lucro de 46,4, enquanto o que acompanha o índice Sensex da Índia está em 26,4. Isso faz deles o primeiro e o terceiro mais caros entre 22 grandes mercados acionários mundiais acompanhados pela Bespoke.

"Quando vejo o mercado acionário da China, ou o da Índia, fazendo o que está fazendo, vejo que tem todas as características de uma bolha", diz Jason Trennert, estrategista-chefe de investimento da Strategas Research Partners. "Isso não significa que não possa subir mais do que qualquer um pense, mas para mim não vale o risco."

Investir em ações em queda - Quando um setor do mercado acionário é surrado, é tentador comprar ações baratas. Mas as ações podem oscilar em torno de um nível baixo por muito tempo, ou continuar em queda. Isso aconteceu depois da bolha de tecnologia de 2001 e 2002. Pode ser o caso com o setor financeiro em 2008.

Richard Bernstein, estrategista-chefe de investimento da Merrill Lynch, observa que os investidores tentaram adivinhar o piso para os bancos em 1989 e 1990, depois da crise americana da poupança, mas foram frustrados porque mais instituições continuaram a anunciar baixas contábeis.

Veja o que aconteceu com alguns investidores que tentaram se aproveitar cedo das quedas. O Bank of America investiu US$ 2 bilhões, a US$ 18 por ação, na firma de financiamento imobiliário Countrywide Financial. A ação da Countrywide está agora abaixo de US$ 9. A firma de "private equity" Warburg Pincus injetou US$ 1 bilhão na seguradora de títulos de renda fixa MBIA cerca de duas semanas atrás e viu as ações desta cair mais de 40%.

"O que queremos ver são investimentos minimamente relacionados à bolha de crédito", diz Bernstein. "Isso envolve empresas com grandes valores de mercado, áreas (...) como assistência médica e itens de consumo básico, investimentos em títulos de renda fixa de alta qualidade e áreas desenvolvidas, como a Europa."

"Agflação" - A maioria das principais commodities do mundo recuou depois de ter chegado às alturas. Mas não o trigo, o milho e a soja.

Secas causaram um salto nos preços de milho e trigo, e o constante aumento na renda e no desenvolvimento das economias mundiais vai aumentar a demanda de carne. Isso tudo é exacerbado pelo maior interesse em álcool combustível.

Isso é bom para os investidores de commodities, mas não para os consumidores e as empresas que compram milho e trigo para fabricar seus produtos. Os preços ao consumidor de alimentos subiram 4,8% nos EUA nos 12 meses até novembro, o maior aumento desde 1990. Isso não torna a tarefa do Fed de evitar uma recessão nem um pouco mais fácil, e pode prejudicar as bolsas de valores.

Volatilidade - Entre 2003 e o primeiro semestre de 2007, os investidores foram animados pela previsibilidade em várias áreas. O crescimento dos lucros das empresas ficou em média acima de 10%, em relação a um ano antes, por 14 trimestres consecutivos, até o primeiro trimestre de 2007, segundo a Thomson Financial. A economia americana cresceu pelo menos 1% anualizados por 16 trimestres consecutivos entre 2003 e 2006, o quarto mais longo período com tal expansão desde que o Escritório de Estatísticas Econômicas do governo americano começou a registrar esses dados, em 1948.

O mercado acionário se beneficiou disso, mas agora a festa acabou. Desde 1º de julho de 2007, a Média Industrial Dow Jones teve 48 dias com variação de pelo menos 100 pontos, em comparação com apenas 21 dias no primeiro semestre.

Quando o mercado está atribulado, os investidores ficam mais inclinados a demandar um prêmio de risco mais alto. Talvez os investidores estejam exagerando na reação agora. Mas há boas chances de que você precise estar com os cintos afivelados em 2008.