Título: Avanços na pesca ainda são tímidos
Autor: Cibelle Bouças
Fonte: Valor Econômico, 09/02/2005, Agronegócios, p. B8

Considerado prioritário pelo governo federal, o setor de pesca e aqüicultura enfrenta os mesmos problemas que levaram à criação da Secretaria Especial (Seap) no início da gestão Lula: produção abaixo do potencial, falta de recursos, desrespeito à legislação ambiental e políticas públicas fragmentadas. Houve avanços nos dois últimos anos, mas o próprio governo e representantes do setor reconhecem que eles foram tímidos. Em 2004, o volume pescado no mar e em água doce recuou 1% ante 2003, para 986,5 mil toneladas, segundo a Seap. A aqüicultura - produção em cativeiro de peixes e crustáceos - cresceu 12,4%, para 320,7 mil toneladas. Um estudo da FAO, braço das Nações Unidas para agricultura e alimentação, estima que a pesca no país pode chegar a 10 milhões de toneladas/ano, se houver investimentos na atividade. Para a Seap, além de atum, sardinha, lagosta e camarão (os principais geradores de receita), o país tem potencial para expandir o cultivo e a pesca de peixes nativos, como pintado, tambaqui e tilápia. A distância entre o potencial de expansão e a produção uniu a Seap e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) para a definição de novas políticas de apoio à atividade. O Ibama instalou em janeiro o Comitê de Gestão do Uso Sustentável de Sardinha Verdadeira, para ajudar a definir regras de desenvolvimento sustentável da sardinha verdadeira e outras espécies do gênero, como maromba e boca-torta. A meta do comitê - que reúne Seap, as pastas de Meio Ambiente, Trabalho e Desenvolvimento, Marinha e seis entidades do setor privado - é aumentar a captura anual de sardinha para 120 mil toneladas. Na década de 1970, a captura era de 220 mil toneladas/ano, mas recuou com a queda dos estoques naturais do peixe. Em 2004, a pesca saltou de 30 mil para 50 mil toneladas com a fixação de dois defesos (proibição da pesca) com duração total de seis meses no ano. "Isso mostra que a redefinição das regras está no caminho certo", diz Hiran Lopes Pereira, coordenador de estudos e pesquisas do Ibama. Na pesca oceânica, o projeto da Seap de ampliar a frota está parado. O Pró-Frota Pesqueira, criado em março de 2004 com R$ 1,5 bilhão para construção de 250 embarcações não saiu do papel por falta de consenso entre governo e BNDES sobre a equalização de juros. Hoje o Brasil tem 80 barcos de pesca oceânica, sendo 60 de bandeira estrangeira arrendados. José Fritsch, ministro da Seap, diz estar definindo regras com o banco e que o recurso deve sair neste ano. Na aqüicultura, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, instituiu em janeiro o grupo de trabalho do camarão, que tem participação da Seap, Ministérios da Agricultura e Planejamento, Ibama e setor privado. Segundo Ângelo Ramalho, técnico em aqüicultura do Ibama, a prioridade é indicar alternativas para erradicar o cultivo ilegal. O camarão responde por 50% das exportações de pescados. Em 2004, os embarques caíram 10,4%, para US$ 219,35 milhões, devido à à demora dos EUA para definir a taxa antidumping, que passou de 36,91% para 7,05%. Para a Associação Brasileira dos Criadores de Camarão (ABCC), as exportações devem crescer 24% neste ano. João Scorvo Filho, diretor de desenvolvimento da aqüicultura da Seap, afirma que a demora na liberação de licenças ambientais é também o principal entrave à expansão da produção em cativeiro de peixes. "Não existe piscicultura regularizada em águas da União", afirma Scorvo. A Seap autorizou o uso de águas da União para a aqüicultura em maio de 2004, mas os piscicultores não conseguem licença ambiental para atuar. Em São Paulo (segundo maior Estado em piscicultura), há 2,2 mil tanques-rede operando ilegalmente, segundo a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta). A falta de licenciamento dificulta, por exemplo, a expansão da tilápia, cujas exportações dobraram em 2004, para US$ 460 mil. Euclides Belotti Júnior, diretor da cooperativa Aquamar, disse que o produtor precisa investir R$ 8 mil em plantio de árvores e outras exigências para ter a licença. A cooperativa produz 200 toneladas/mês de tilápia e exporta 90% do volume. Para acelerar a liberação das licenças, a Seap e o MMA fecharam acordo - ainda não publicado no Diário Oficial - para que a licença ambiental seja dada pelos Estados, e não mais via Brasília. Fritsch diz que, aos poucos, cresce a sinergia com o Meio Ambiente. "Mas ainda falta definir o melhor ordenamento das atividades", afirma. Para o ministro, houve avanços desde a criação da Seap, mas a falta de recursos e estrutura dificulta os trabalhos. A Secretaria tem 280 funcionários, e o Ministério do Planejamento estuda proposta para ampliar esse quadro. Fritsch não descarta a possibilidade de que a Seap se torne ministério. Para 2005, a Secretaria tem orçamento de R$ 111,395 milhões e emendas em debate de R$ 15 milhões. Em 2004, os recursos foram de R$ 87 milhões ante R$ 4 milhões em 2003. Do total, foram aplicados R$ 65 milhões. Fritsch diz que o gasto foi abaixo do orçado em função do contingenciamento e do atraso na aprovação de projetos. Para este ano, a Seap tem como principais metas aprovar a criação de parques aqüícolas em oito barragens de hidrelétricas, financiar a criação de cinco laboratórios (dois para reprodução do bijupirá, um do pirarucu, um da tilápia e um do camarão) e concluir obras em 12 terminais pesqueiros, com recurso de R$ 29,8 milhões. Na pesca artesanal, irá aplicar R$ 5 milhões na instalação de recifes artificiais e R$ 6 milhões em subsídio ao diesel.